DOMINGO, 6 DE FEVEREIRO DE 2000 C21
Prédio Pirâmide - Fotografia de Rui Gonçalves

Quinta-feira, 3 de Fevereiro de 2000

Não dormi muito pois deitei-me já depois da uma para acordar pouco depois das sete. Mas apesar da idade já pesar nestas coisas, há que não ser atado e mostrar que nada se passa. Apanhei o autocarro em Sansome directo para Manzanita, Tamalpais Valley, Mill Valley. Depois de uma meia hora de viagem cheguei ao escritório.

O dia passou-se como de costume. Não vos vou falar dos meus progressos profissionais, porque se não morreriam de tédio. Mas começo a perceber mais de polígonos, formas, geometrias, nós e coisas do género.

A meio da tarde deram-me as saudades, depois de ter falado com a Cláudia ao telefone, pelo que decidi sair um bocado para espairecer. Agarrei na Vaynessa e fui ali ao centro comercial (mall) de Tamalpais Valley, tentar revelar o rolo de fotografia que me persegue há quase uma semana. Não encontrei nada que não demorasse pelo menos um dia e custasse o mesmo que revelar em uma hora em SF.

A saída do Supermercado um tipo com ar de bêbado, mirava-me a bicicleta... coisa que eu não gosto. Quando me aproximei, disse-me que estava a apreciar os travões estranhos que eu tinha. Disse-lhe que eram hidráulicos, ao que o tipo ficou surpreendido e disse que finalmente estão a aplicar a tecnologia dos automóveis às bicicletas. E as motos? Não entram aí? O tipo disse que há uns dez anos costumava descer o Mt. Tamalpais, que para quem não sabe foi onde nasceu o BTT (quantas vezes é que eu já disse isto?) e que não conseguia fazer lá umas curvas por causa da bolina e com aqueles travões se calhar conseguia. Não sei se queria andar na bicicleta, mas ele tinha ar de quem não ia muito longe... não me pareceu estar bêbado naquela altura, mas se calhar é porque estava a acordar...

Voltei para o trabalho. Descobri a Radio Comercial via Internet (chamem-me nomes, aqueles que julgam que sabem tudo) e estive a ouvir o programa do António Sérgio - A Hora do Lobo. Já não ouvia o António Sérgio de dia desde os tempos da saudosa XFM e quando estava a trabalhar no Porto. Trouxe-me boas recordações de tempos difíceis, em que me deslocava entre dois empregos e estava separado da minha namorada na altura e agora minha esposa, a Claudia, que estava em Aveiro a trabalhar.

As saudades aumentaram, mas o vento fresco na cara e a viagem de volta de bicicleta até casa melhoraram o espirito. Isto também era o sono.

Cheguei a casa e liguei-me ao ICQ e ouvi a Comercial, enquanto estive à conversa com o meu colega de casa indiano. Dava um filme de porrada do Chuck Norris.

Tirei a roupa da mala, onde estava desde que cheguei e arrumei o quarto, mais ou menos... e fui dormir.

Sexta-feira, 4 de Fevereiro de 2000

Levantei-me e estive à conversa com a Claudia no ICQ até às 9h...

Fui para o escritório na Vaynessa. É sempre bom começar o dia com 7 km de bicicleta. Vou ver se quando começar a ficar bom tempo, começo a pedir a chave do balneário e vou andar pelos caminhos antes de chegar ao escritório... isso é que deve ser uma maneira fantástica de começar um dia de trabalho. Deve não é, porque já o fiz ai... a energia é outra.

Uma coisa porreira no escritório é que podemos sair a meio do trabalho e ir dar uma volta de bicicleta para desanuviar, e ninguém nos diz nada. Ninguém tem nada a ver com isso, desde que façamos o nosso trabalho. A dada altura saiu do escritório uma tipa com um Kayak e foi remar ali para a baia. Deve ser fantástico... tenho que lhe pedir para dar uma volta naquilo.

Quando ela estava a colocar o kayak na agua passou uma hidroavioneta e aterrou aqui mesmo em frente. Parecia um daqueles documentários em que se vê o avião a aterrar na agua e os patos todos a levantar voo. Lindo! Não há nada como um dia mais bonito para mudar o modo como se vê o ambiente à nossa volta.

Quando chegaram as 4h da tarde era hora do lanche. Achei estranho que ninguém disse-se nada, mas como eu tinha saído por um bocado podia ter havido algum desencontro. Decidi tomar a iniciativa de ir até lá... Assim, que cheguei, o Jesse, o Office Manager, que é como quem diz o secretário responsável pelo atendimento, compras e manutenção do escritório, logo me perguntou se não me tinha enviado um mail a avisar do lanche. Eu com toda a minha simpatia agradeci-lhe a gentileza de não me ter incluído. Eu e o Jesse temos uma relação algo conflituosa, no bom sentido.

Esta semana tínhamos um lanche francês, depois da versão nipo-australiana da semana passada, esta comiam-se uns Bries esquisitos, com ervas e cogumelos e bebia-se um novo Cabernet Sauvignon, agora de Sonoma 1997. Não era mau, mas era pouco e eu tive que compensar com uma cerveja Boddington porque a outra escolha, para além das normais sodas (estes tipos chamam sodas a tudo o que é sem álcool) era uma cerveja de Sonoma também, cuja cervejaria honrosamente se gloriava de ter sido criada em 1997, uma verdadeira marca de credibilidade.

Acabado o lanche, com o grão na asa, peguei na Vaynessa, fui a casa pousa-la, apanhei a mochila e o saco-cama e fui para SF no autocarro da Golden Gate Transit. A ideia de levar a Vaynessa para casa era de que no domingo poderia dar uma voltita de bicicleta se voltasse a tempo, mas agora o importante era ir para SF ver se havia o barbecue em casa do Rodney (lembram-se da história da exposição de pintura? Ver crónica parte 9).

Cheguei a casa do Diogo às 19h e fomos os dois a casa do Rodney, mas ninguém nos atendeu... A solução agora era ir comprar alguma coisa para comer e beber, pois quando chegámos a casa delas soubemos que vinha toda a gente (quase) do contacto na zona.

E assim foi, o Tiago, a Joana e o Nuno, as Helenas, o Carlos e um amigo da Costa Rica, vinham jantar a SF e depois de jantar a São, a Ana e o André foram lá ter. A mulher do Mário, chegava nesse dia e para além de o voo chegar três horas atrasado, a diferença horária devia de lhe fazer alguma confusão.

Depois de alguma cerveja, muita cuba livre e pouca vodka, decidimos dar um salto até à noite de SF. Rumámos a Folsom ao 1015, a cantar o 10:15 Saturday Night dos Cure. Ah! Os Cure estão em SF dia 17, mas a entrada é limitada a 1000 pessoas e os bilhetes devem esgotar assim que chegarem às bilheteiras, como o concerto dos Smashing Pumpkins este fim de semana em Palo Alto que era para 100 pessoas. Acho que foi uma enchente, a sala estava cheia... pudera!!!

Depois de duas voltas ao quarteirão para encontrar sítio para estacionar, deparamos com uma fila para entrar na tal discoteca que dava a volta à esquina. Os seguranças eram pelo menos 7, desde a esquina até à porta, e as pessoas passavam por um verdadeira secessão de apalpanço para entrar na discoteca... porque é que me calham sempre homens? Os seguranças eram do género frigorífico de duas portas com dispositivo para gelo, mas vestidos com um lindo casaco amarelo impermeável que deve ser a ruína da discoteca. O que se gasta em pano para se vestir aquela gente... Mas lá dentro ainda havia mais seguranças que cá fora.

A entrada foi rápida, mas também foi cara. Depois de entrados, o Juan, o tal amigo da Costa Rica, levou-nos a uma visita turística ao sítio. Entramos numa pista em que tocava música dos anos 70, disco e afins, passamos à pista grande onde a onda era mais moderna e de dança, subimos ao primeiro andar e na primeira das salas desse piso, encontramos uma música mais experimentalista, mas de dança, passámos por bar enorme com música hip-hop e soul de dança e descemos à cave onde se ouvia um drum and bass e coisas de dança mais pesadas. Quantas salas é que foram? 5 a dançar.

A população que habitava os diferentes micro climas, eram diferentes como devem imaginar, mas como nós ficámos quase sempre na primeira das salas (somos uns fuleiros) foi essa a que mais deu para apreciar. Mas, lembro-me de ver na cave um ser parecido com o monstro da Guerra das Estrelas que congelou o Harrison Ford, ou seria uma baleia em época de migração? Ainda bem que estava na cave, porque o solo dos outros pisos eram de madeira e não sei se aguentariam o peso da coisa. Mas deviam de haver cerca de 60% de orientais, 20% de negros, 10% de Mexicanos e 10% de ocidentais. Não me lembra de ver índios, embora em alguns sectores parecesse uma cowboiada.

Mas a melhor cena da noite, foi quando uma tipa despindo um vestido de saía que lhe dava sensivelmente um bocadinho abaixo da cintura resolveu dançar com um dos pilares da pista. Tudo bem, não fosse o facto das poses dela suscitarem que o pessoal do sexo masculino e algum do sexo feminino, parasse de dançar para de alguma maneira apreciar aquilo que normalmente se paga para ver numa boite. O jovem negro que a acompanhava, mantinha-se à distância como um animal que defende a cria, mas que a deixa brincar. A dada altura, a tipa decide subir a saia sensivelmente até à altura do umbigo, ou seja cerca de uns dedos acima do que já estava e começa a esfregar-se na parede junto à porta da entrada e aí os seguranças, que não podiam estar a olhar porque estavam a trabalhar, resolveram estragar o espectáculo e mandaram a tipa para outra sala. Tanto quanto sei, a performance continuou, nós é que não vimos.

A noite foi durando até que às 2h deixaram de vender bebidas alcoólicas. E lendo um placar na parede descobri porquê tanto apalpão à entrada... A discoteca gabava-se de ser um sítio Drug Free... Inocentes!

Fui-me deitar às 3h e qualquer coisa, para aproveitar a boleia da Joana, do Tiago e da Ana, e porque tinha deixado a máquina no carro deles. O resto do pessoal chegou três quartos de hora depois.



Índice: Página I1 Col. 1
Próxima Crónica: Página C22 Col. 1