1 de Novembro de 2004 O Vespertino de Reading CRÓNICA 43
Miguel e Edgar - Fotografia de Cláudia Fernandes Paulo - Fotografia de Cláudia Fernandes

Feijoada à Brasileira

Resolvi deixar de beber café. Mas já vacilei, porque bebi um Expressochoc (café com chocolate) logo de manhã, para minimizar o efeito da falta de cafeína. Depois da sandes de almoço apenas dei um golo de café pela mesma razão. Não se pode cortar com as drogas muito de repente. Aqui até é difícil deixar de beber café, porque no escritório não há café de jeito. E lá fora o café custa no mínimo £1.00 (€1,50) o que torna as coisas mais fáceis ainda se olharmos ao lado monetário do problema. Também já é tarde para olhar para esse lado, porque estou quase a ir embora.

A hora mudou, já está quase de noite às 4 da tarde. Ainda bem que me vou embora. Não que em Portugal seja muito diferente, mas começa a ser deprimente estar aqui no escritório e olhar lá para fora e estar de noite. Sair do escritório e estar de noite.

Mas no fim-de-semana esteve um sol fantástico. Um sol quase tão bom como o português. Mas nós nem sabíamos que a hora mudava e de repente, no domingo [31 de Outubro de 2004] de manhã, fomos ao Tesco em Brixton e quando lá chegámos estava uma fila enorme à porta e o supermercado já devia ter aberto há uma hora. Só percebemos que a hora tinha andado para trás quando o supermercado abriu ao meio-dia, que eram 11h, a hora de abertura.

E por falar em filas, já vos falei dos Ingleses e das filas? Havia aqui um alemão no escritório que dizia que um inglês sozinho é um inglês triste, porque não pode estar numa fila. E quanto mais tempo aqui estou mais me apercebo que assim é. Acho que pior que os ingleses, só mesmo os japoneses, mas estes servidores da Rainha ficam felizes por fazerem uma fila. Vocês não imaginam as filas para os Multibancos, quando mais abaixo existem outros vazios. Ou as famosas filas de trânsito... Ou as filas à espera de mesa num restaurante. Só há uma fila que ninguém respeita, que é a fila na paragem dos autocarros.

Mas voltemos a domingo. Foi um dia muito especial. Um dia passado com um pessoal muito especial. Portugueses e brasileiros em Londres à volta de uma mesa a comer uma feijoada à brasileira, com vinho português e a ver um vídeo de uma performance artística da brasileira da casa. Pessoas que mal conhecíamos e que nos receberam como se estivéssemos a partilhar os mesmos momentos. E estávamos! Foi muito bom! Obrigado Amanda, Tózé, Rita, Sil, Paulo (que quase só dormiu), Edgar e Miguel.

Passo a explicar. Pelos vistos o Tózé (português de Vila do Conde) é amigo do Miguel (português de Vila do Conde) e por afinidade do Paulo (português de Lisboa) e Edgar (português de Aveiro). Namora com a Amanda (brasileira) e vivem ambos com a Rita (portuguesa de Lisboa). Que, acho, faz capoeira com o Paulo, Edgar e Sil (brasileira). E todos eles têm fascínio enorme pelo Brasil. A estes juntaram-se mais dois portugueses (eu e a Cláudia) para almoçar e uma outra portuguesa (que não consegui reter o nome) para cear.

Tudo numa casa inglesa na zona 4 de Londres numa bela tarde de sol. E, até jogámos à bola no quintal em manga-curta, mas não durante muito tempo. Não digam que o tempo aqui é mau. Embora o vídeo da Instalação Artística da Amanda desse a entender que ela passou um bocado de frio, pois ela andou pelas ruas de Londres, de noite, apenas enrolada em fita isoladora preta. É engraçado como as pessoas reagem a uma coisa destas... Barbies enroladas em fita isoladora preta podem suscitar muitas interpretações e foi isso que vimos no vídeo.

E é engraçado como, se no dia anterior falei com um velho colega, jardineiro licenciado em Física, neste falei com um ex-estudante (ou licenciado) em Psicologia que optou por trabalhar com crianças e num restaurante. Cada um procura a felicidade à sua maneira e nem sempre aquilo que julgamos ser o melhor para nós, numa dada altura, vem a demonstrar ser, mais tarde, que não nos leva a essa almejada felicidade. A vida é um caminho complicado...

A feijoada estava boa e os bolinhos de bacalhau (que o Paulo insistiu serem Pataniscas) estavam óptimos, mas tínhamos que ir embora. Ainda estávamos moídos pelo Bikram do dia anterior. Uma experiência comparável à uma ida de carro do Choupal ao Clube de Rugby de Coimbra, num dia de calor de Verão, quente como só Coimbra consegue ser, no carro do Ponces (amigo do Rodrigo), com a sofagem no máximo e ele a repetir "Vocês até frio vão ter quando de aqui sairem". Mas esta com posturas de Yoga, como se estivéssemos numa sauna. O Anésio ia adorar, mas a nós deixou-nos muito moídos. Embora seja uma experiência a repetir, naquele momento só nos apetecia ver cama e ainda faltava uma hora e tal até Reading.



Índice: Capa
Próxima Crónica: Crónica 44