28 de Outubro de 2004 O Vespertino de Reading CRÓNICA 41
Radcliffe Square (Oxford) - Fotografia de Rui Gonçalves

Só mesmo no Reino Unido

Há coisas que eu ainda não entendo neste país sem relevo geográfico e comandado por uma mulher sem poderes. Um país onde o sol é tão pouco e a chuva uma constante que nem sequer conseguem produzir vinho (na verdade não chove muito, mas chove muitas vezes). Coisas tão simples como:

Porque é que se tem que passar sempre por duas portas para se chegar ao quarto-de-banho? Mesmo que as portas dos quartos-de-banho de mulher e homens sejam independentes o acesso aos lavabos dos homens é sempre feito abrindo uma porta para um compartimento onde apenas existe outra porta, que aí sim dá acesso aos desejados urinóis. Imaginem a confusão se estão apertados e alguém vem a sair.

Porque é que as torneiras nos quartos-de-banho deitam sempre água a ferver? Agora já sei que é assim, mas no início cheguei a apanhar alguns escaldões, porque estes senhores têm um problema qualquer com lavar as mãos com água fria.

Porque é que o quarto-de-banho se chama Loo? Bem em Portugal há quem lhe chame casa-de-banho ou casinha em memória dos tempos em que essa imprescindível assoalhada era fora da casa, no fundo do Jardim. Uma casinha à parte. Mas porquê Loo? Alguém sabe? E sabem que o urinol ou o acto de urinar é "number one" e a sanita ou o acto de defecar é "number two"? E se vomitar é o "number three" e a flatulência é o "number four", por ordem de comparação, e se estes são os actos mais realizados no quarto-de-banho, então suponho que copular, aqui no país do devasso, será o "number five".

Mas se há quartos-de-banho porque é que todos os cantos, na rua, são bons para urinar ou vomitar, quando se sai bêbado do pub, às 11h da noite? Eu vivo no centro da cidade e acreditem que já vi mais jantares desperdiçados, desde que estou cá, do que em 7 anos de Universidade. Aqui em Reading, em frente à Câmara Municipal, até há um urinol que durante o dia está debaixo do solo e à noite eleva-se para prevenir as necessidades fisiológicas dos homens (embora acredite que haja mulheres a usá-lo) que saem dos pubs, depois de tocar o sino.

Como se pode ter cartões de débito sem se ter um PIN? Como é que demoraram tanto tempo a introduzir a obrigação de digitar o código do cartão multibanco nos pagamentos automáticos nas lojas? Acho que é uma questão de confiança, mas até há pouco tempo a confirmação da identidade do portador do cartão era apenas confirmada através da assinatura na factura e que tinha que condizer com a assinatura no cartão. Aliás, nós como portugueses nem sequer tínhamos assinatura no cartão e devem imaginar a cara da empregada do supermercado quando a Cláudia lhe saca o cartão das mãos, assina e diz "Pronto já está assinado!". A mulher deve ter achado que a Cláudia tinha roubado o cartão.

Porque é que Reading se lê "réding", Slough lê-se "sláu" e Greenwich lê-se "grénitch"? E porque é que Edinburgh se diz "édimbor"? Deve ser pela mesma razão que nós, portugueses, dizemos "muinto" e se escreve "muito". Mas porquê?

E porque é que os estabelecimentos comerciais autorizados a vender bebidas alcoólicas se chamam "Off-License"? Será porque temos licença para as levar (off) da loja? Se calhar...

Mas como é que só há duas auto-estradas com portagens? Na verdade as auto-estradas estão de tal modo congestionadas que se me obrigassem a pagar portagem ainda ficava mais escandalizado, mas o nosso governo deveria de olhar para os exemplos dos seus parceiros europeus quando fala em introduzir portagens em todas as auto-estradas em Portugal. Como é que se pode pagar na IP5 se na sua construção foram usados troços de todas as alternativas a ela? Como é que Espanha constrói uma auto-estrada do outro lado da fronteira, mantendo a estrada original e nós fazemos uma estrada má e ainda queremos que se pague portagem. E em França, pagam-se portagens, bem caras por sinal, mas há sempre alternativas. Mas depois aqui perto de Reading até se paga portagem para atravessar uma ponte em Whitchurch-on-thames, mas são 10p (15 cêntimos) e é uma medida limitadora da quantidade de tráfego e para preservação de uma ponte que é monumento.

Porque é que custa tanto ir a Londres e voltar como ir a Londres e ficar? Um bilhete de comboio de ida-e-volta para Londres custa £11.40 e só de ida custa £11.30. Ir e voltar de carro custa menos de £10.00 de gasolina. Eu até preferia ir de comboio, porque não tenho que me chatear com o trânsito (bem complicado) e estacionar (que até é fácil), mas se for e voltar em dias diferentes, eu e a Cláudia, gastamos cerca de £64.00 em comboios e metro e se for de carro gastamos £22.80 em gasolina e metro. São só 12 contos de diferença em dois dias. Por isso as auto-estradas estão congestionadas. E se vocês vissem alguns comboios...

Porque se diz que os Ingleses são pontuais se nenhum comboio anda a horas? E porque é que existem mostradores electrónicos com os horários dos autocarros nas paragens se estes nunca andam a horas? E como é que os ingleses podem ser pontuais quando andam de comboio atrasado, autocarro que não tem horário ou de carro, parado nas auto- estradas?

É um país esquisito este onde o Caril é prato nacional e onde não se pode beber depois das 23h. Um país onde um transexual madeirense ganha o Big Brother não pode ser de confiança. Não pode ser cristão, um país onde os jornais desportivos mostram na capa os atributos das mulheres dos jogadores e nunca os jogadores.

Isto não é um país! São muitos juntos...



Índice: Capa
Próxima Crónica: Crónica 42