30 CRÓNICA O Vespertino de Reading 1 de Outubro de 2004

Bits and Pieces

Não poderia deixar passar a inauguração da edição electrónica d'Vespertino de Reading sem que a tornasse desactualizada. Acho que não tem lógica inaugurar algo que seja actual, porque isso não é típico português. Portanto para que o site fique desde já por actualizar, segue a presente crónica.

Banco em Hampstead Heath - Fotografia de Rui Gonçalves

Hoje [sexta-feira, 1 de Outubro de 2004] pelo menos quatro funcionários deixam a empresa, aqui no escritório. E como é costume neste país, o superior directo faz um discurso agradecendo a prestação do dito trabalhador em prol do bem da empresa e este recebe uma prenda e um cartão assinado por todos aqueles que o desejaram assinar. Na baía aqui ao lado estavam dois deles, um chinês e um alemão. Este último mereceu uma boleia minha para o centro de Reading há umas semanas e na conversa fiquei a perceber que é casado com uma iraniana e vive em Londres. Demorava todos os dias cerca de duas horas a chegar ao local de trabalho e mais duas horas para voltar.

Aliás, commuters são imensos aqui na Inglaterra. Há quem faça mais de 100 quilómetros todos os dias para vir trabalhar. O Simon M. mora em Southampton e demora cerca de 1h de comboio desde lá até aqui a Reading. E o Alon L. Mora ainda mais longe. Este último tem gozado da minha boleia para o centro de Reading todos os dias. É israelita e judeu não praticante. Temos tido umas conversas interessantes sobre o que é válido e não válido na religião judaica, tudo porque no outro dia na televisão estava a dar um programa sobre a comida kosher.

Para quem não sabe a comida kosher é aquela comida (e bebida) que tem o aval dos rabis. É comida que é produzida segundo as regras das sagradas escrituras e que dita coisas como se deve matar um boi, ou que não se pode misturar carne de cabra com queijo de cabra e não se pode comer sangue. Assim, um boi é morto com uma faca bem afiada e sem falhas e da carne só se aproveita a parte inferior porque é a parte de onde se podem tirar as veias, porque não se pode comer sangue. E as regras são imensas e como diz o meu colega tinham razão de ser há mil anos quando foram escritas por questões de higiene, mas algumas delas hoje não têm sentido.

Interessante foi também a conversa, ontem [quinta-feira, 31 de Setembro de 2004] ao jantar. Imaginem quatro portugueses, dois deles a viverem no estrangeiro há oito anos, a jantarem com um argelino, que cresceu em França e vive no Reino Unido e um japonês, que no último ano viveu mais tempo na China que no seu país natal. A conversa a dada altura também acabou por ir parar a questões religiosas, principalmente quando o argelino, com um copo de cerveja na mão, se confessou muçulmano e em época de ramadão. O japonês vem de uma família budista mas não sabe quem é Buda.

Aliás, o jantar resultou de uma série de felizes coincidências que provam que o mundo é pequeno e que é possível tropeçarmos no nosso passado todos os dias. Assim, na quarta-feira [30 de Outubro de 2004] combinámos ir beber um copo com o David G. e a Sairung a um pub no centro de Reading. Depois da aula de Iyengar Yoga lá fomos ao Coopers Arms e bebemos uma pint com eles. O pub até é agradável e dá a sensação de voltarmos atrás no tempo, não fosse ser Quiz Night e o homem berrar ao microfone e nós termos uma coluna de som mesmo em cima de nós. Mas isso não é importante! O importante é que quando viemos para casa, depois do bar fechar às 23:30, deparámos com um tipo já um pouco bêbado que dançava ao mesmo tempo que se dirigia no sentido contrário do nosso. Quando nos cruzámos não quis acreditar, mas era o Amine, um argelino que trabalhava na NEC em França e que tinha estado comigo no Japão, na altura da minha primeira visita. Foi com ele que andei à procura do Grande Buda em Kamakura.

O Amine tinha sido despedido da empresa num processo complicado em, que me parece, ele foi o bode expiatório de uma má relação entre a NEC e a empresa prestadora de serviços em que ele trabalhava (outsourcing). E agora trabalha na Sharp aqui perto de Reading. Ou seja, há cerca de um ano perdi o contacto dele e ele o meu, e agora, depois deste tempo todo, encontramo-nos numa rua no Reino Unido. Um argelino-francês que eu conheci no Japão.

Na mesma altura que conheci o Amine, conheci o Nakayama que era o responsável por nos pressionar para arranjar os problemas de software quando lá estávamos. Fora do escritório era um tipo porreiro, mas dentro da fábrica de Kamoi era um bocado chato. Por essa e por outras razões ganhou a alcunha do Cara-de-peixe-bafo-de-onça. E vai estar em Reading nos próximos 3 meses, sensivelmente o mesmo que eu. O Nakayama é fã de futebol e era um daqueles japoneses que disse que ia a Portugal na altura do Euro, mas com o lançamento do telemóvel em Hong Kong teve que lá passar uns 10 meses.

E por falar em futebol, parece que o Mourinho conseguiu mostrar que consegue ganhar ao campeão europeu de clubes. E o Rooney conseguiu levar as casas de apostas (que aqui se multiplicam) à falência ao marcar 3 golos de uma assentada na sua estreia no MANU (Manchester United). Parece que houve quem apostasse 40.000 libras no hat-trick, que tinha uma razão de 1 para 30, o que implica que há uma casa de apostas que tem que pagar ao apostador ganhador 1,2 milhões de libras. Se calhar um dos perdedores foi o senhorio do Miguel B., mas esse é mais apostas em golf (como é possível?).

Andámos a ver se vamos jogar golf. Parece que há aí uns sítios para bater umas bolas por apenas 3 libras. Isto para não dizerem que é só Yoga. Sim, porque continuamos a ir a aulas de Yoga às quartas e sextas. E este fim-de-semana temos um curso de 7h no domingo [3 de Outubro de 2004] em Londres, o que nos vai obrigar a acordar cedo, apesar de no sábado [2 de Outubro de 2004] termos um barbeque. A nossa agenda está a ficar muito completa.

Ah! Esqueci-me de falar que a semana passada na aula de Yoga da Mary Niker [quarta-feira, 23 de Setembro de 2004] estava uma tipa vítima da Talidomida, um medicamento proscrito nos anos 50 para a dor de cabeça e que provocava a paragem de crescimento do feto, numa grávida. Ela tinha as mãos nos ombros, ou seja, não tinha braços. Mas fez a aula toda e a maioria de vocês não saiu do sofá!

O sofá, foi precisamente o sítio de onde não devia ter saído na segunda-feira [20 de Setembro de 2004] dessa semana, quando fui ao cinema ver O Terminal do Steven Spielberg. Talvez o pior filme que eu já vi dele. Esperava mais! Não é um mau filme, mas foi uma decepção e preferia ter gastado menos dinheiro no alugar do DVD daqui a uns meses. Mas o resto do dinheiro do bilhete deve ter sido para pagar a quase meia hora de anúncios que passa antes de começar o filme. Não vale a pena chegar a tempo, porque se o filme está marcado para as 20h só começa às 20:30. Nem nos Estados Unidos vi tal coisa.

Como diriam uns brasileiros que estavam ao nosso (meu e da Cláudia) lado num Internet Café em Dublin, no dia em que um padre irlandês empurrou o maratonista brasileiro nos Jogos Olímpicos de Atenas, "Putaquipáriu".



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