QUINTA-FEIRA, 5 DE JUNHO DE 2003 D11
Casa do Palácio Imperial - Fotografia de Rui Gonçalves

No sábado [31 de Maio de 2003] desesperei. Estive muito próximo de me desfazer em lágrimas por causa de nada. Acho que estava no limite dos meus nervos e acho que a minha vinda para Sapporo, ao contrário do que inicialmente pensei, só melhorou a minha estada no Japão. O ambiente em Kamoi é desesperante, além de que estava a dar apoio a duas equipas que trabalhavam em turnos durante 24 horas. Agora compreendo melhor o estado de cansaço do Victor, quando se foi embora na quarta [29 de Maio de 2003].

O ambiente aqui em Sapporo é muito mais relaxado. O escritório aqui é muito melhor. Muito à americana, com cozinha, frigorífico e café à borla. Aqui não há toques, apesar de haver uma voz que fala umas coisas e até há música na casa de banho e cozinha, aliás onde já ouvi Madredeus. (Fui perguntar, e) Às 15:00 uma gravação explica-nos a fazer exercícios de relaxamento e alongamento. Que mais quer uma pessoa? Aulas destas no trabalho não é para qualquer um.

À hora do almoço sai-se e vai-se almoçar ao centro comercial da estação de Sapporo que é uma coisa descomunal, com uma torre com alguns 35 andares. O centro comercial tem imensas lojas e restaurantes. Desde que aqui estou que ainda não repeti duas vezes o mesmo. Na segunda fui a uma Izakaya, terça comi Tempura, ontem Sushi e hoje foi Tonkatsu. Tonkatsu, segundo o Yoshida-san quer dizer porco (Ton) frito (katsu), mas eu comi vaca e camarão... Mas pronto! Ah! Haviam de me ver comer amêijoas com pauzinhos... Aliás todos os japoneses ficam surpreendidos por eu usar pauzinhos tão bem e lá lhes tenho que explicar que quando estive na Califórnia só tinha dinheiro para comer em Tailandeses.

À volta da estação existem dois grandes armazéns tipo El Corte Inglês, onde se vende de tudo, mas onde ainda não tive muito tempo de entrar. Só fui à secção Loft de um deles, mas não comprei nada.

E já vos falei de Susukino, onde a vida nocturna de Sapporo acontece e por onde passei na segunda [2 de Junho de 2003], mas que ainda não tive a oportunidade de re-visitar e/ou gozar convenientemente. Talvez na sexta ou no Sábado.

Para além disso Sapporo é uma cidade relativamente nova (150 anos) e foi pensada e arquitectada por estrangeiros. É tipicamente uma cidade americana com ruas perpendiculares e com diferentes sentidos, o que torna a orientação muito fácil. Aliás os endereços aqui são do género N3W2 ou S1E3, que quer dizer, respectivamente North 3 West 2 e South 1 e East 3, que indicam qual é o quarteirão onde está a casa. O Norte/Sul é medido em relação ao Odori Park que atravessa a cidade na horizontal e o Este/Leste é medido em relação ao rio Sosei, que é um canal artificial construído no início da cidade para regar os campos, que atravessa a cidade na vertical.

Não tem mesmo nada a ver com Yokohama ou Tokyo, que visitei, com o Amine, no domingo [1 de Junho de 2003] antes de vir para aqui.

Tokyo, acho que é daquelas cidades que todos um dia sonhámos conhecer. Mas visitar Tokyo em poucas horas não dá uma ideia de como é a cidade, aliás, porque pouco mais vi que o exterior do Palácio Imperial, a torre de Tokyo e um templo.

Para começar os jardins orientais do Palácio Imperial estavam fechados, ao contrário de tudo o que li na Internet e em guias turísticos. Parece-me que ando com azar e só apanho as coisas que quero ver fechadas. Mas, pronto dei a volta à parte sul da muralha, em volta do fosso, vi umas casas, a ponte Nijubashi, uns guardas imperiais e melhor de tudo, um treino da polícia, segundo nos pareceu. Vocês acreditam que eles repetiram o mesmo gesto, de como se estivessem a apunhalar no estômago, batendo com alguma força e gritando alto, durante cerca de meia-hora. Foi o tempo de nós andarmos quase a fachada frontal do fosso do palácio, que deve ter cerca de meio quilómetro, pois nós já os ouvíamos à distância.

Como os jardins do palácio estavam fechados e o francês queria ver a torre de Tokyo, que supostamente é uma reprodução da Torre Eiffel, lá fomos nós até lá. Pelo caminho ainda atravessámos um jardim onde ofereciam flores (não me perguntem porquê) e onde havia música. Parámos para apreciar a vida da cidade e ouvir um duo que tocava tambor e gaita de foles, pelos vistos instrumentos tradicionais de Tokyo... Acho que a seguir entrava um com uma Balalaika japonesa ou um berimbau nipónico.

A torre de Tokyo, supostamente é maior que a torre Eiffel em Paris, mas não é mais bonita. Tem cerca de 330 metros de antenas, mas a torre Eiffel é muito mais larga na base. Aliás nem me apetece falar da torre, pois a única coisa de jeito mesmo foi estar ao lado do Templo Zojoji, ou teria dado como perdido o meu tempo.

Entrámos no templo pelo cemitério. Os cemitérios para este lado da Terra são esquisitos. As campas são quadradas, têm no centro uma lápide e por trás placas de madeira com dizeres em japonês. É difícil de explicar, mas já vi cemitérios minúsculos, confinados a terrenos entre dois prédios enormes, onde as campas são imensas. Mas não vi muitos cemitérios, pelo que suponho que cada campa aloje mais que um morto. É difícil compreender o que dizem as placas, mas ou são orações ou o nome das pessoas que foram ali enterrados. Não perguntei.

O templo é grande e estava aberto. Ufa! Aliás um monge budista estava a tocar um tambor e a orar. Gravei o momento na minha câmara digital para poder partilhar com vocês tal era a sua beleza, depois de uma longa caminhada e com a fome que estava. Circundámos o templo, mas pouco ou nada havia para ver, a não ser a beleza da oração do monge.

Ainda vimos um restaurante chamado Porto, mas fomos comer uma porcaria de um hambúrguer ao Wendy’s, pois estava a ficar tarde para eu me despachar para apanhar o avião ao aeroporto de Haneda.

Apanhámos o comboio para Shin-Yokohama (já disse que é Nova Yokohama?) na estação de Shimbashi que é assim uma zona de Tokyo tipo Blade Runner ou Quinta Essência, embora não estivesse a chover. O que vi de Tokyo foi mais ou menos agradável, porque andei por parques ou em redor deles, mas Shimbashi é a verdadeira parte da cidade onde se aproveitou tudo o que é possível para o uso humano. Tipo o que se vê de Nova York, com linhas de comboio, estradas e prédios em todo o lado.

Mas ainda fiquei mais impressionado quando fui, desde o Hotel, de autocarro para o aeroporto de Haneda. Primeiro, ainda bem que eu não posso conduzir no Japão, porque acho que morria. Além de ainda não me ter habituado ao facto destes tipos conduzirem do lado errado da estrada, as tabuletas são ilegíveis, as estradas muito estreitas e há sítios em que há três níveis de estradas entre prédios, tipo estrada do rés-do-chão, estrada do primeiro andar e estrada do segundo andar. E onde é que eu saio?

E as portagens? Lindo!!! Sei lá o que está lá escrito! O que vale é que o motorista do autocarro orientava-se bem e falava fluentemente japonês porque senão tinha perdido o avião. Andar de comboio no Japão é uma experiência interessante, mas de autocarro é alucinante. Eu já tinha tido um cheirinho a andar de taxi, no dia que fui à Izakaya com o Kosuke-san e os seus capangas, mas o autocarro é surpreendente.

E ainda deu para ver Yokohama ao pôr-do-sol, que aliás até a favorece. E, no momento de partida do voo as nuvens limparam-se um pouco e consegui ver o Monte Fuji. Ou aliás vi o contorno inconfundível do Monte Fuji ao pôr-do-sol, enquanto o Boeing 767-300 se fazia à pista do aeroporto de Haneda com destino a Shin Chintose.

Quando cheguei à estação de Sapporo, umas horas depois, deparei-me com a aventura de encontrar o hotel. Pois já tinha sido uma aventura tirar o bilhete do comboio no aeroporto, pois se em Yokohama/Tokyo algumas coisas estão em inglês, aqui na ilha de Hokkaido, no extremo norte do Japão, não existe outra língua para além do japonês. Jantar por vezes é um problema, pois se ao almoço estou com uns japoneses, à noite tenho que me safar sozinho.

Mas, lá tive a sorte de encontrar um casal de japoneses, que mal falavam inglês para além do "come" e "hotel" (eles dizem "hoter", porque aqui não há o som "l") e que me levaram até ao Hotel Aspen. E o melhor é que me ofereceram, do seu jantar, um hamburguer do MacDonalds, porque acharam mal que eu ainda não tivesse jantado às 22h. Ah! E ele perguntou logo pelo "Figo" e "Rui Costa" quando eu disse que era português... Felizmente o meu nome é fácil de dizer para eles!



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