Depois da última crónica que vos
escrevi já muita coisa se passou por este lado do mundo.
Depois da maravilhosa experiência do terramoto, fui informado
na sexta [30 de Maio de 2003] que o Japão estava prestes
a ser fustigado por um tufão (Linfa), o mesmo que tinha
passado pelas Filipinas há uns dias e que tinha morto
pelo menos 18 pessoas. Lindo! A seguir deve ser a queda de
um meteorito.
Mas como se não chegasse ainda fui questionado
se me importava de ser deslocado para Sapporo (vão lá ver
o mapa que vos mandei). Que é que uma pessoa pode responder
a um pedido destes? "Não! Estou com gazes e
não posso viajar de avião!". Além
disso, não sei se vos disse, mas a minha estadia foi
estendida por mais 5 dias, porque o voluntário (francês)
que me vem substituir, tem a sua vida e, só vem no dia
9, pelo que eu tenho que abdicar da minha vida por uns dias
por causa disso. Uns são filhos e outros enteados, mas
como diz o David (o meu chefe inglês) eu é que
me "voluntariei".
Pois bem, aqui vos escrevo de Sapporo, uma cidade
mais simpática que Yokohama, mas bem mais fria. Lá fora
está um ventinho que parece que ainda estou em Fevereiro
ou Março. Ontem quando cheguei estava a chover e fazia
frio, mas isso eu conto mais tarde. Sapporo fica sensivelmente à mesma
latitude de La Coruña, mas deve ter uns ventos de norte
mais frios. Ah! Yokohama fica sensivelmente à mesma
latitude de Ceuta (vi ontem no avião).
Mas voltando à minha vida no Japão,
acho que vos tinha deixado no domingo [25 de Maio de 2003]
passado, algures na minha visita à loja de electrónica
(que foi visita habitual em Yokohama tal foram as solicitações
de Portugal) e ao supermercado.
Pois bem, depois de almoçar, eu, o Victor,
o Amine e o Thomas, decidimos ir até Kamakura, depois
de uma breve consulta ao preço do comboio para ir ver
o Monte Fuji (vi-o ontem à saída de Tóquio).
Digamos que a ida ficava em cerca de 37,5 euros e desistimos.
Além de que o monte ainda está com muita neve
e os níveis superiores estão ainda fechados.
Kamakura (http://www.asahi-net.or.jp/~QM9T-KNDU/)
foi em tempos (1192 – 1333) a capital do Japão
(assim como Kyoto o foi antes de Tóquio) e é hoje
em dia uma cidade turística repleta de templos budistas
e shintoístas (a religião mais antiga do Japão).
Chegámos a Kamakura tarde. Muito tarde,
pois a maioria dos templos fecham às 17:00 que foi mais
ou menos a hora que chegámos, graças à lesmice
dos nossos amigos franceses. Além disso, a viagem ainda
demora cerca de uma hora. Também não dava para
ver os templos todos, pois em cada um paga-se entre 200 a 400
yens, e como são mais de meia centena, ainda ficávamos
arruinados.
Arruinados ficámos foi das pernas, mas
apesar da hora tardia, ainda deu para termos uma ideia da coisa.
Seguimos um daqueles caminhos japoneses dos filmes, em terra
batida, coberto por copas de cerejeiras baixas e repletos de
pedras com inscrições até ao santuário
de Tsurugaoka Hachimangu, um templo shintoístas. À entrada
um lago com lótus, como se vêem nos jardins japoneses,
e um pequeno altar rodeado de bandeiras numa pequena península.
As bandeiras julgo que são um sinal de oração
ou pedido dos peregrinos, assim como junto ao altar existem
placas de madeira com caracteres japoneses, que suponho significam
a mesma coisa. Existe também um local onde as pessoas
amarram papéis, julgo que pedindo sorte para a sua vida
(foi o que li).
Seguindo o caminho principal chegámos
a uma praça com um edifício em madeira, tipicamente
japonês, no centro, onde supostamente é realizada
uma dança sagrada. À esquerda uma fonte de água
coberta, onde de um bamboo brota água e onde existem
umas pequenas panelas usadas como colheres para recolher a água
e beber. A água é um bem muito precioso no Japão,
mas também não admira, com a poluição
que eles têm.
Umas escadas levaram-nos ao templo principal,
mas àquela hora estavam já fechadas, assim como
todos os outros pequenos templos que compõem o santuário
de Tsurugaoka Hachimangu.
Estava já a escurecer e resolvemos andar
na direcção do templo seguinte. Bem, não
me perguntem os nomes, mas todos os templos que passámos
estavam fechados. Alguns deles são de uma dimensão
que eu não imaginava, embora sem serem de uma extraordinária
beleza, mas transmitem uma paz como todos os templos. Andámos
alguns 6 ou 7 quilómetros para tentarmos ver o Grande
Buda, mas mesmo esse estava fechado, para grande decepção
do Amine que veio a praguejar o tempo todo contra o Buda.
O Grande Buda é uma estátua com
cerca de 12 metros, mas quando chegámos ao templo tudo
o que vimos foi uma placa a dizer que a área estava
sob a detecção de um sistema de alarme e se houvesse
alguma tentativa de passar o portão, que seriamos processados.
Lindo! É assim que querem divulgar as riquezas da terra?
Bem, mas estes 6 ou 7 quilómetros foram
já feitos de noite, porque no entretanto parámos
numa loja de recordações e o Amine dando uso
ao seu sangue árabe do norte de África, resolveu
pedir um desconto ao vendedor. Devem imaginar um japonês
que não fala uma palavra de inglês e um francês
com o seu belo sotaque, a tentarem enganar-se um ao outro.
Mas tudo acabou com um redondo "No discount!".
Mas a melhor parte da caminhada, antes do Buda,
foi quando decidimos meter-nos por um caminho pedestre, sem
nenhum mapa nem luz e que supostamente nos levava perto do
templo de Kotoku-in, onde estava o Grande Buda. Lindo! O caminho às
escuras e cheio de raízes de árvores, a subir
e descer, junto a declives de cortar a respiração
(víamos as luzes umas dezenas de metros abaixo) tornou-se
o martírio para o Amine que escorregava em todos os
cantos e só dizia mal de quem queria ver o Buda. Mas
lá encontrámos a bela da máquina de bebidas
no fim do caminho, junto a mais um templo. Ah! Nós não
tínhamos sequer um mapa…
Para mim o melhor de tudo, mesmo, foi um pequeno
templo ou santuário, cujo o acesso era feito através
de um túnel cavado na rocha e depois através
de uma estrutura de madeira. Quando saímos do túnel
formado por esta construção, deparámos
com aquilo que nos pareceu uma pequena aldeia, ou conjunto
de casas, e um altar, que era a única coisa iluminada, àquela
hora da noite (19:30). Ao fundo estava uma gruta que suponho
fosse o lugar sagrado, sem luz era difícil de ver e
receámos tomar alguma atitude que pudesse ser ofensiva
para os locais, se entrássemos na gruta. Havia um grande
pote onde ardia incenso.
Acabei de encontrar o nome naquele site que
vos mandei. Era o santuário de Zeniarai Benten. Afinal
a gruta é uma nascente de água sagrada.
Na verdade o sítio transmitia uma paz
imensa e o cheiro a incenso deixava-me mais relaxado, depois
de uma caminhada de dois quilómetros num caminho semeado
de perigos na escuridão completa. Desejava lá voltar,
aliás combinámos fazê-lo, mas com a minha
recolocação aqui em Sapporo vai ser difícil.
Depois de não termos visto o Grande Buda,
voltámos à estação, onde encontrámos
um restaurante Indiano e jantámos. Não queria
acreditar que estava há dois dias no Japão e
só tinha comido chinês e indiano... Ah! E Italiano.
Ao almoço de sábado, fomos a um restaurante Italiano
onde comemos o tradicional prato local, o Hambúrguer.
Lindo!
Ainda encontrámos o YMCA de Kamakura
e voltámos a Shin-Yokohama, onde nos esperava uma bela
de uma soneca.
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