Vou aproveitar aqui uma pausazita no trabalho
e vou-vos pôr a par das novidades.
Estes japoneses são mesmo malucos. Acho
que ainda não houve um dia que não trabalhasse
menos de 12 horas e que tenha dormido mais que 5. Uma maravilha!
Estou numa sala com cerca de 70 pessoas e com o ar condicionado
a 28 graus, o que torna o ambiente muito agradável,
uma vez que todas as pessoas aqui respiram, melhorando ainda
mais as condições de trabalho. Além de
respirarem, andam todos descalços e falam uns com os
outros tão alto que qual semelhança entre isto
e uma repartição das finanças em Portugal é pura
coincidência.
Mas, mesmo assim, conseguem ser mais limpos
que os franceses. Acho que o Thomas finalmente mudou de camisa,
hoje. Vou contar quantas vezes ele a vai usar e depois digo-vos!
Mas, voltando ao local de trabalho, este sítio é apenas
uma salita de cerca de 300 m2, onde respiram uma quantidade
enorme de gente, disposta em filas de seis secretárias
e de frente para mais seis, isto formando, portanto, seis filas
duplas de secretárias. Depois há uma fila perpendicular
a esta composição onde estão os chefes
de fila. A hierarquia aqui é uma coisa muito importante.
Como normalmente entro por volta das 11h da
manhã, não sei o que se passa antes, mas por
volta das 12h começa a tocar uma música e vão
todos almoçar à cantina ou comprar comida ao
supermercado do complexo fabril da NEC. Eu não chamava
isto uma fábrica, mas um aglomerado de escritórios,
oficinas e afins de diferentes sub-empresas da NEC. Já cá vi
desde desenvolvimento de software para o espaço
até integração de RACs de comunicações
para centrais telefónicas, mas acho que ainda não
vi nada. As luzes apagam-se à hora do almoço
e há quem deite a cabeça em cima da secretária,
sobre uma almofada (carinhosamente guardada numa gaveta quando
não está a ser usada) e dormem.
Aliás dormir é um ritual por estes
lados, uma vez que eles passam tantas horas na empresa é-lhes
difícil dormir em casa, pelo que dormem no comboio,
na rua enquanto esperam pelo transporte, nos bares e no trabalho.
Por sinal, por volta das 18h, volta a tocar uma música
e muitos deles tiram a bela da almofada e vai de dormir um
bocado em cima da secretária. O Victor contou-me que
no outro dia foram a um bar por volta das 2h/3h da manhã e
os clientes estavam todos a dormir. Acho que para a próxima
vamos dispensar o hotel, uma vez que podemos dormir em bares.
Há vários sinais musicais durante
a tarde. Um para lanchar, por volta das 17h quando o supermercado
abre por um quarto de hora, um ou dois para espreguiçar e
mexer as pernas (quem passa tantas horas a trabalhar precisa,
não é?) ou dormir, mas o melhor de todos é um
que há um bocado mais tarde, acho que cerca das 20h,
quando uma tipa com uma voz muito meiga diz no seu belo japonês
algo como: "A partir deste momento a empresa não
vos está a pagar as horas extras que estão a
fazer na empresa, pelo que não se devem sentir forçados
a ficar." Lindo!!!
Há cerca de 2000 empregados neste complexo
(embora já me disseram que são 8000, mas eu tenho
dificuldade em acreditar), devem imaginar como é a cantina.
Até se vendem sapatos, carteiras ou apartamentos à porta,
dependendo do dia da semana.
Isto parece uma prisão labiríntica
com máquinas de bebidas em cada esquina e num ambiente
tipo Robocop/Mad Max. Para chegar da entrada até aqui
esta sala tenho que andar cerca de 400m, por baixo de um edifício,
atravessar um pátio, seguindo um corredor que atravessa
outro edifício, passar na zona de carga e descarga e
finalmente atravessar uma rua. Só ao fim de quatro dias é que
me comecei a orientar e agora acho que já tenho uma
ideia mais ou menos formada da localização deste
edifício no complexo. Ah! À saída, depois
das 22h, o caminho tem de ser outro, porque alguns dos edifícios
estão já fechados.
Noutra crónica falo-vos das pessoas que
me rodeiam e das com quem trabalham, todas de olhos em bico
e com nomes ainda mais difíceis de prenunciar que Arestides
Gumerzino. Só hoje já conheci um Tsotomu Yoshida,
fora os Shionoyas e Kanayamas e companhia.
Aliás, os nomes nesta terra são
algo do outro mundo. Aliás este país é um
outro mundo... Um país onde se compra roupa numa loja
chamada Konaka e anda-se num carro chamado Laputa, não é normal.
Já vi um bar chamado "Alabian Nights" (não é gralha)
e no meu hotel toma-se o "Monining Breakfast".
Lindo!
Olha! Está a tocar a música para
lanchar... Tenho que ir, pois tenho uma reunião às
18h.
Depois mando umas fotos aqui da prisão
onde em todas as esquinas existem capacetes e bandeiras amarelas,
para serem usadas em caso de acidente grave, tipo terramoto,
e onde existe na porta um sinal onde estão marcados
os dias que já passaram desde o último acidente
acontecido no complexo (eu perguntei ontem ao Barin, pois nós
dizíamos que eram o número de mortos).
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