Arranjei o meu palmtop PC. Acho que posso começar
a escrever de novo. Não sei até que ponto isto vai
continuar, mas o tempo o dirá... Acho que depende de vocês
também.
Comecei a escrever isto em Vila Real, pois a semana
passada fui tio pela terceira vez e fui ajudar a minha cunhadinha
a tomar conta da minha querida sobrinha Carolina, enquanto a recém-nascida
Margarida ainda dá muito que fazer. Bem, se esta for como
a Carolina, então o trabalho vai ser ainda maior quando
crescer.
Mas voltando à semana passada. Na sexta [28
de Fevereiro de 2003] quando saí do trabalho e nos preparávamos
para ir para o Porto para assistir ao concerto dos islandeses Sigur
Rós, a Cláudia recebeu um telefonema da Di que acordava
da anestesia do parto. Tínhamos sido tios. Foi uma emoção
difícil de explicar, mas é sempre bom saber que temos
mais alguém neste mundo em quem podemos depositar o nosso
carinho e amor.
Partimos na mesma para o Porto e dirigimo-nos ao
Coliseu. Quando entrámos a sala ainda estava meia composta
e estava a tocar o projecto The Album Leaf que fez a primeira parte.
Ainda assistimos a dois ou três temas, o último dos
quais tocado com a ajuda de dois membros dos Sigur Rós,
um na bateria e outro nas teclas. O som assemelhava-se em tudo à música
dos islandeses, apesar do jovem me ter parecido ter vindo de San
Diego, um local bem mais quente que a Islândia, país
onde a música dos Sigur Rós parecia encaixar perfeitamente.
Não que eu conheça a Islândia (ainda) mas a
música deles tem algo próprio dos países frios
do norte.
É bom voltar aos concertos. Acho que último
que assisti, sem contar com os gratuitos e de bandas portuguesas,
foi o do Moby ainda em São Francisco, há quase dois
anos e meio. É bom voltar a sentir a emoção
de ver a banda que gostamos e queremos ver e ouvir, a entrar em
palco e presentear-nos com toda a sua força. Já não
me lembrava como um bom concerto pode influenciar o modo como daí para
a frente passamos a ouvir os discos daquela banda. Ou como um mau
concerto pode significar o fim de uma banda no meu imaginário.
Que digam os Smashing Pumpkins, que nunca mais tocaram nos meus
leitores depois de um desastroso concerto no Porto que me custa
a esquecer.
Mas voltemos aos Sigur Rós. É difícil
explicar (está tudo muito difícil hoje em dia) a
música destes islandeses que resolveram misturar a sua língua
materna com o inglês e criar uma nova língua que usam
e cantam nas suas canções. Sim, são canções, é um
nome que eu não gosto de chamar à s músicas
que oiço, porque acho que canções é um
termo um pouco " pimba", simplista talvez. Mas no fundo "canção" é algo
muito simples e isso que são as músicas dos Sigur
Rós. Começam regra geral em tons muito suaves crescendo
em loop até um clímax e acabam com a voz do vocalista
cantando em falsete uma letra que em tudo se assemelha ao cantar
de uma criança que não sabe a letra. Lembram-se quando
tentavam acompanhar uma música e não sabiam a letra
e tentavam dizer os mesmos sons que aquele vocalista naquela música
que tanto gostavam e que cantava numa língua que não
conheciam? Bem, é mais ou menos isso, mas ao contrário...
O concerto foi bom. Não diria muito bom,
porque esperava mais calor da banda que acabou o concerto com duas
vindas ao palco para com um grande Takk ("obrigado")
a agradecer a prestação do público. Nunca
dirigiram a palavra ao público, mas se calhar na Islândia é assim...
Se for como na Finlândia! Mas surpreenderam-me, principalmente
em alguns temas em que a bateria teve um papel muito importante
e deu bastante energia que não esperava ver (ou ouvir).
Além disso há que falar nos efeitos visuais, com
imagens projectadas num ecrã por detrás da banda,
com as suas sombras e canhões de luzes.
No final, lembrei-me de como já me tinha
esquecido como era sair de um concerto, a cheirar a tabaco e sob
uma série de empurrões. Uma bela maneira de comemorar
o nascimento da Margarida e o voltar aos concertos. No entretanto
já comprei os bilhetes para ver a Beth Gibbons dos Portishead
com o Rustin'man.
No sábado [1 de Março de 2003] acordámos
cedo e fomos até Vila Real ver as nossas queridas sobrinhas.
Por vezes é difícil (outra vez) de acreditar que
a natureza é assim tão generosa... A Margarida é um
ser tão pequenino e tão bonita. Custa-me (mais uma
vez) falar de um ser que ainda é tão pequeno e tão
indefeso. Em breve será tão grande como a Carolina
e será o terror dos pais.
Já saímos tarde de Vila Real. Ainda
queríamos chegar a horas de ter luz à chegada às
Médulas e conseguimos apesar de nos termos perdido em Ponferrada.
Mas chegámos mesmo no pôr-do-sol…
O espectáculo não podia ser melhor.
Nunca esperei ver uma paisagem semelhante no velho continente e
ainda por cima com a luz do pôr-do-sol. Pena é que
esteja um bocado abandonado, com pouca ou má sinalização
e cheia de lama. Mas também não se paga…
Eu vou explicar o que são Las Médulas.
Imaginem que os romanos há cerca de 20 séculos lembraram-se
de arranjar uns 8000 escravos para escavar umas galerias numa montanha
barrenta e que depois desviavam um rio e faziam a água circular
pelos túneis desfazendo as paredes e fazendo desmoronar
a montanha. Tudo isto para sacar ouro. E sacaram muito, consta
que algumas 5 ou 6 toneladas deles. Acontece que quando a montanha
deixou de dar ouro aos romanos, estes abandonaram a obra e os desmoronamentos
continuaram, porque algumas galerias ficaram e hoje existe uma
enorme cratera rodeada de paredes de barro castanho e galerias
como nomes sugestivos como La Cuevona e La Encatada que têm
alguns três andares de altura e que a UNESCO resolveu classificar
como património da Humanidade. Tudo isto, logo do outro
lado da fronteira de Bragança, ali nos montes de León.
Vão lá...
Infelizmente fomos descobrindo os caminhos por entre
os desfiladeiros e canyons artificiais, quase sem ajuda de mapas
(apenas tínhamos um que sacámos de um site qualquer).
E quando chegámos às paisagens mais deslumbrantes
já o sol se tinha posto e frio apertava, mas mesmo assim
ficámos com uma boa ideia do local e prometemos voltar no
Verão e/ou no Outono, porque a zona está lotada de
castanheiros e estes o Outono ficam com umas cores espectaculares.
Enlameamo-nos até aos joelhos, mas os problemas
de trabalho já estavam longe e agora só pensávamos
em chegar a Boñar para podermos comer calmamente antes de
ir dormir. Foram muitas emoções juntas e condensadas
no mesmo dia. Mas nos esperava no dia seguinte em Puerto de San
Isidro onde íamos esquiar, eu pela segunda vez, mas para
a Cláudia era uma estreia.
Mas que estreia. No domingo [2 de Março de
2003] de Carnaval nunca se devia pensar em ir esquiar para San
Isidro e muito menos tarde. A verdade é que quando chegámos à estância
de esqui a minha vontade era de voltar para a cama, tal era a quantidade
de gente nos teleféricos, nos cafés, nos autocarros,
a alugar esquis e até a passear. Mas se eu fiquei abananado
a Cláudia ficou possessa, porque pouco tinha dormido.
Demorámos uma a duas horas a decidir o que
fazer. Andámos para trás e diante e subimos no autocarro
até à parte alta da estância, onde a enchente
era ainda maior e onde a vontade de andar de esqui ainda se foi
mais embora. Custava-nos a acreditar que houvesse gente tão
desesperada em andar de esqui que suportasse estar naquelas filas
intermináveis, para apanhar um teleférico, para depois
descerem uma pista superlotada de gente, e que com um bocado de
sorte até conseguiam descer sem baterem em ninguém,
para depois voltarem para a fila.
Desistimos! Mas afinal tínhamos ido ali para
andar de esqui e desistíamos? Não! Fomos alugar os
esquis… Grande azar, já só haviam esquis para
pessoas com mais de 1,80m… Ainda estou em crescimento mas
ainda não cheguei a tal ponto, e para quem está a
começar, esquis grandes não ajudam muito. Fomos beber
uma cerveja.
Os bares e cafés da estância estão à altura
da mesma. Um nojo que até custa a compreender que não
estamos em Portugal. Estou a brincar, porque até acredito
que se cá nevasse fazia-se cá esqui em melhores condições…
A vantagem de estar num país diferente é o
facto de não o conhecermos tão bem como o nosso e
podermos sempre passear e conhecer coisas novas. E assim fomos
para os Picos da Europa, que é mesmo ali ao lado. Ainda
bem que não haviam esquis, porque na certa não tínhamos
passeado e ficava sem saber da magnitude do que são os Picos
da Europa. E o deslumbre das suas paisagens.
Não vou descrever aqui os Picos. Vão
lá… É mesmo ali ao lado! Só vos digo
que vale a pena… Se gostarem de natureza com montanhas, desfiladeiros,
lagos e albufeiras, neve e muita água.
Aliás água sob todas as formas foi
o que não faltou no passeio. Desde neve nas bermas com mais
de um metro de altura, a chuva e a neve que começou a cair
quando passámos o Puerto antes da descida para Riaño,
onde parámos para ver uns ninhos de cegonha no meio da albufeira...
Ah! Para acabar o dia fomos jantar a um pueblo que
se chama Valdehuesa e que tem um Mesón chamado La Forqueta
e que tem uma sopa de truta que é de chorar por mais. E,
no fim servem um chopétin que se quiserem podem acompanhar
com um cafétin. Aconselho vivamente...
Na segunda [3 de Março de 2003] acordámos
mais cedo, pois não queríamos deixar os nossos esquis
por mãos alheias. E conseguimos chegar à estância
a tempo de sermos servidos com botas, esquis e bastões próprios
para a nossa dimensão e começar a esquiar sem ter
que esperar mais pelo teleférico (puxa-rabos) que a descer
a pista mais simples de todas.
Mas foi por pouco tempo. Uma classe de miúdos
na escola de esqui veio e ocupou a pista e o puxa-rabos do pessoal.
De repente descer a pista de 130 metros em linha recta e com uma
inclinação ridícula, passou a demorar menos
de um terço do tempo necessário para passar duas
vezes pelo mesmo ponto. Estava a tornar-se insuportável,
como tínhamos visto no dia anterior.
E se nos aventurássemos nas pistas mais difíceis?
Bem! A verdade é que o salto qualitativo era algo elevado
e mal por mal decidimos experimentar a pista verde (fácil)
da parte superior da estância. Fomos de autocarro e subimos
no teleférico (agora de cadeira e digno do nome de teleférico).
Mas não sem antes a Cláudia resolver abalroar os
vizinhos da frente da fila do teleférico, por não
conseguir travar... Não sei quantos de vocês já esquiaram
mas devem saber o quão fácil é não
conseguir travar nos primeiros tempos e como é fácil
levar alguém pela frente. Foi um fartote de rir! Assim como
foi um fartote de rir a Cláudia a sair da cadeira e cair...
Como é normal!
Mas, se a pista verde lá de baixo estava
superlotada, a lá de cima estava insuportável. Mas
valeu a pena subir no teleférico e apreciar a paisagem,
mesmo que o frio apertasse enquanto se esperava pelo puxa-rabos
para novamente se fazer 140m de uma pista ridícula.
Desistimos das pistas oficiais e partimos à aventura
pela pista que faz a ligação entre as duas partes
da estância. Mas antes ainda encontrámos a Cláudia
e o Eduardo que conhecemos em São Tomé e a Milena
que andou connosco na universidade. E ainda chocámos com
uma larga centena de portugueses que são a maioria, se pensarmos
que os Leoneses e os Asturianos não são espanhóis.
A verdade é que aquela pista não oficial,
mas que consta do panfleto da estância com uma dificuldade
média-alta (não vi aonde) foi o melhor do dia. Garanto
que se voltar a San Isidro só faço aquela pista e
subo de autocarro que regra geral anda mais vazio que os meios
mecânicos.
Foi um fartote de rir! A Cláudia atirava-se
para o chão e eu caía. Ríamo-nos sozinhos
com os disparates e as façanhas de que éramos capazes
encima daqueles esquis endiabrados. Claro que éramos ultrapassados
em todas as rectas, curvas, descidas ou subidas por miúdos
que com menos de metade da nossa idade faziam mais de o dobro do
que nós a andar de esqui ou snowboard. Mas estávamos
felizes...
Ainda tiramos umas fotografias para a posteridade
e fomos entregar o material com quase uma hora de atraso, mas lá como
cá a tolerância é uma qualidade importante.
Foi um alívio tirar aquelas botas de quilos e castradoras
de movimento e voltar a calçar umas botas normais... Os
ossos agradeceram! Até com uma pelada na perna fiquei da
bota!
Voltámos ao nosso hostal em Boñar,
cheios de calor (esteve sol o dia todo), contentes com um dia bem
passado a (tentar) esquiar e confiantes de que aquelas coisas que
se diz de se ficar todo partido era só para quem esquiava
a sério. Pois! Pois! Ainda por cima não havia água
quente. Tinha acabado e era preciso esperar "un rato".
Se esperava mais algum bocado adormecia mesmo antes de jantar porque
afinal estava moído.
Encontrámos um tasco bacano com raciones.
Não me lembro o nome, era bar qualquer-coisa, ficava lá mesmo
no centro de Boñar, julgo que junto à igreja, mas
aquilo estava tudo em obras. A verdade é que não
vi o nome quando entrei e já não conseguia ver quando
saí. O homem pôs uma garrafa de vinho na mesa para
irmos bebendo com as raciones e disse que só pagávamos
o que bebêssemos... Pois adivinharam, bebemo-la toda! Não
era nenhuma maravilha, mas acompanhar uns champiñones, uma
bonita e umas goelas de vaca, que não me lembro o nome,
caiu que nem ginja... Ou que nem vinho!
Foi uma bela noite de Carnaval! Ainda fomos ao café ter
com a Milena e o amigo, mas eles não ficaram muito tempo,
porque esses tinham mesmo adormecido e ainda não tinham
jantado. Nós ainda bebemos um digestivo, que como disse
a empregada "En españa es así" estava
muito bem servido. Tão bem servido que em Portugal pelo
dobro do preço bebia um terço do Whiskie. A verdade é que
antes da meia-noite espanhola já dormia... De luz acesa!!!
No dia de Carnaval [4 de Março de 2003] voltámos
para Portugal. Passámos o Montesinho e parámos em
Bragança, mas não vimos muito, porque queríamos
chegar a Vila Real para ver as nossas sobrinhas de novo. Mas havemos
de voltar e nessa altura eu conto como foi...
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