Eu sei que alguns de vocês já andavam
desesperados por eu não escrever. E, outros aliviados! Mas,
para aqueles que achavam que as crónicas tinham acabado...
Cá estou eu de volta com mais umas aventuras
no sul da Califórnia.
Terça-feira, 8 de Agosto de 2000
Eventualmente já não se lembram mas
eu e a Cláudia tínhamos andado às voltas por
Los Angeles e acabámos por ir dormir a um parque de campismo,
próximo do Lago Elsinor (uma tradução foleira
de El Siñor, que os americanos não conseguiram compreender).
Mas, dormir não foi propriamente o que eu
fiz. Imaginem um parque de campismo num parque florestal (Cleveland
Silverado National Forest) às portas da grande Los Angeles.
Para quem já viu aquelas séries e filmes passados
em LA em que há serial killers e afins e se encontra sozinho
num parque no meio do nada... Nem o facto do quartel dos bombeiros
e dos rangers ser ali mesmo ao lado me descansava. Aliás
pelo contrário, porque quando não pensava que iria
aparecer alguém que nos ia importunar ou um animal que eu
desconhecia que existia e que atacava seres humanos em tendas num
parque isolado, acordava com o barulho do rádio dos bombeiros.
Parecia um rádio-taxi, sempre a dar sinal e a ouvir-se uma
voz. Isto do outro lado da estrada a cerca de 50 metros do parque...
Imaginem como eles deveriam ser surdos!
Depois, pela manhã, começou o trânsito
infernal, naquela estrada que julgávamos que não
ia dar a lado nenhum e que não passava em nenhures. Eram
camiões, atrás de camiões, que como é normal,
começavam a circular de madrugada. E, atrás de cada
camião, ouvia-se uma série de carros, que o prosseguiam,
pois a estrada era estreita, cheia de curvas e na maioria dos sítios,
com proibição de ultrapassagem. E, ao contrário
dos portugueses os americanos cumprem as regras... Bem, pelo menos
ali, porque quando chegarmos a San Diego a coisa muda um bocado. É o
cheiro do México!
Mas, se eu não dormi, a Cláudia também
não o fez muito. Aparentemente o animal que ataca pessoas
em tendas em parques desertos, também a esteve quase a atacar,
na forma de um pássaro. Acordou a meio da noite quando sonhava
que um pássaro a atacava. Aparentemente o pássaro
queria-lhe bater na cabeça.
Porém, o facto de não termos dormido
muito não nos afectou muito. Já que estávamos
em férias, havia que rir com a cena e partir para outra
paragem. Desmontámos a tenda, enquanto um grupo de mexicanos
da companhia de electricidade andava ali pelas imediações
a tentar arranjar alguma anomalia nos postes de electricidade.
Ou seria dos telefones? E, nem sei se eram mexicanos, mas falavam
espanhol e naquela zona a população é maioritariamente
proveniente do México. Pelo menos a que faz os trabalhos
mais exigentes fisicamente, porque os americanos, por ali, são
todos actores ou ligados à indústria cinematográfica.
Se não são, queriam ser!
Saímos do parque sem ver os tais animais
que atacam as pessoas em tendas em parques desertos. Aparentemente
foi só nossa imaginação... Mas, eles andam
por aí! Tenham atenção!
Decidimos ver se na próxima curva da estrada
já se via o Lago Elsinor e o deserto. Isto porque os tipos
do quartel dos bombeiros e dos rangers, apesar de terem o rádio
de emergência ligado aos berros, não estavam lá.
O centro de recepção estava fechado e não
conseguimos colher nenhuma informação a não
ser nos placares no exterior. E, aparentemente o deserto era mesmo
ali ao lado e nós queríamos ver o que nos esperava
nos próximos dias, antes de rumarmos a San Diego e à civilização,
mais uma vez.
Qual foi a nossa surpresa quando a cem metros do
parque havia um miradouro e lá em baixo estava um lago envolto
em casas. Mas, o melhor era o tasco que estava no miradouro e que
se chamava Lookout! Devem imaginar porquê!
Sim! Estávamos com fome... Mas, não
só. O café/tasco/miradouro era mesmo típico.
Fazia lembrar aqueles bares que se vê nos filmes de camionistas,
que estão isolados no meio do nada e que servem uns Brunchs
maravilha. Para quem não sabe o que é um brunch eu
já explico, mas a tasca merece cinco minutos de fama.
Ao contrário das normais construções
americanas que ficam em zonas com paisagens bonitas, este tasco
nem tinha janelas muito grandes. Era todo em madeira e no exterior
tinha um daqueles depósitos de água, à americana,
que parece um bidão de água em cima de uns ferros,
onde se lia Lookout escrito com caracteres semelhantes aos dos
Saloons dos Cowboys. O melhor da tasca, não era a sua construção,
nem a comida, mas o dono. O tipo era uma fonte de energia incompreensível
para quem mal tinha dormido. A música alto, a tocar o último
sucesso do Santana com o Dave Mathew e o tipo cantava em uníssono,
e ainda melhor que o original, enquanto fazia o nosso brunch. Por
todo o lado haviam sinais que avisavam para a potencial presença
de vespas e que quem se aventurasse pelo terraço que o fazia
segundo a sua responsabilidade. Claro, que nós tínhamos
que ir ver as vistas ao terraço mas não quisemos
comer lá por causa do possível ataque de vespas.
Elas existiam, ainda vimos uma ou duas!
Depois veio o brunch. Pronto, para quem não
sabe, um brunch é aquilo que nós chamamos de lanche-ajantarado,
mas da parte da manhã. O nome não é mais que
a aglutinação das palavras breakfast e lunch. Pois
bem, não é mais que aqueles almoços mais leves
que o pessoal faz e come nas manhãs a seguir a uma noite
mais poderosa.
Uns ovos estreados, com batatas em gomos fritas, com bacon e salsinhas
e uma cervejinha para abrir as hostilidades. Isto enquanto falávamos
com o dono.
Ele vivia lá em baixo em Lago Elsinor. Era
de fora, mas tinha-se casado e ficado por ali. Adorava estar ali
no Lookout e de conviver com as pessoas que passavam pela tasca.
Gostava de motas, pelo que não era de admirar a quantidade
de revistas sobre o assunto que estavam por ali, na sala de leitura.
Pois, já me esquecia de vos contar que a tasca tinha uma
salinha com livros, uma mesa e cadeiras onde se podia ler.
No entretanto, uma senhora que passava, entrou e
perguntou pela casa de banho. Uma daquelas casas-de-banho de festival
rock no exterior. Pouco depois outro cliente, este com cara de
poucos amigos, entrou e perguntou se alguém tinha perdido
a carteira de um telemóvel. E, como ninguém se acusou
ele ficou com ela e foi-se. Uma meia-hora depois a primeira cliente
entrou à procura da carteira. Azar!
Nós seguimos caminho, para trás em
direcção ao mar. Tivemos oportunidade de ver o que
não vimos na noite anterior. Mas, o nevoeiro de LA também
não ajudou.
Chegámos a San Juan Capristano e fomos visitar
a missão. Bem, mais uma missão tipicamente espanhola.
Depois da missão de Santa Bárbara, todas as outras
parecem muito pequenas. Esta aliás estava em obras de recuperação.
Ao lado ficava uma linha de comboio, onde pelos vistos já não
passavam comboios. Havia um museu dos comboios, mas não
era isso que me apetecia ver.
Apetecia-me beber um belo de um café. E,
mesmo ali ao lado estava um café magnífico. Eu achava
que nós é que sabíamos estar num café,
mas a verdade é que os nosso cafés não servem
para mais nada a não ser... Tomar café, umas cervejas
e pouco mais. Ali, tínhamos um café onde se podia
estar sentado em belas poltronas e ler algumas revistas (actuais)
enquanto se bebia um café ou um refrescante.
Depois do café, seguimos para sul. San Diego
esperava-nos... E, Tijuana, se chegássemos cedo.
Já estava a ficar farto de civilização
e da confusão das praias. Em agosto qualquer praia é confusa,
especialmente nas famosas praias do sul da Califórnia, um
género de Algarve, mas mais frio, apesar de ter aspecto
de mais tropical.
A Cláudia decidiu que queria ir a um centro
de informação turístico. Bem, eu tentei persuadi-la
a não o fazer, porque era perda de tempo, mas em San Clemente
não tive hipótese e tive que ir. Os centros de informação,
regra geral são uma porcaria e só mostram aquilo
que todos os turistas devem visitar, mas ali ainda eram piores.
Em San Clemente, ambos as pessoas que estavam a atender falavam
espanhol e falavam-no entre si como se nós não os
entendêssemos. Os americanos não entendem nenhuma
língua a não a ser a sua, e até o inglês
têm dificuldade de entender, isto apesar de julgarem que
sabem falar espanhol, porque sabem dizer meia dúzia de palavras
e acham que o espanhol é como a sua língua materna
e resume-se a esses vocábulos. Por esta razão é fácil
para os mexicanos falarem e não serem entendidos pelos gringos,
mas nós sabíamos mais do que eles pensavam. Mas,
nem disseram nada de mau...
O mais lindo foi quando a Cláudia perguntou
qual era a melhor praia da região e a tipa disse que só conhecia
a praia de San Clemente. Será possível que alguém
que trabalhe num centro de informação turística
conheça apenas uma praia. Ah! E, além disso todos
os panfletos que tinham eram de San Clemente, e poucos eram turísticos,
mas sim comerciais.
Fomos até à praia de San Clemente.
A praia era linda. A envolvente era demais. A típica praia
do sul da Califórnia. Um pontão, o típico
pontão de madeira a entrar pelo mar a dentro, a areia infestada
de gente e... a água gelada do pacífico. Enchia os
olhos, mas não trazia nada de novo a uns turistas habituados
a praias.
Ainda parámos num dos acessos à praia,
para tirar uma fotografia a uma casa em construção.
Pode parecer tolice, mas a verdade é que pouca gente acredita
que as casas na Califórnia são feitas de madeira.
Sim! Nas sua maioria, e mesmo edifícios altos, como o da
RM&P, que tinha 13 andares era feito de madeira, obviamente
com uma estrutura metálica de suporte. Mas, as casas mais
baixas são feitas de madeira, género contraplacado
e construídas em dias com acesso a um "agrafador" de
pregos. É impressionante ver como se constrói e destrói
uma casa em questão de dias. Aliás, na visita que
fizemos ao castelo de Haerst, quando a guia disse que a casa era
feita de cimento, um casal de americanos que estava ao meu lado
afirmou, batendo na parede, "impressionante, de cimento".
E, a Patrícia contou-me uma vez que tinha dificuldade em
explicar aos colegas que a casa onde vivia em Portugal era de cimento.
Atravessámos uma zona militarizada, embora
fosse pouco perceptível. Antes de ir para a Califórnia,
num dos últimos jornais que tive a oportunidade de ler,
saiu uma reportagem sobre um campo militar para onde os pais mandavam
de férias, os filhos problemáticos. Pois foi esse
campo que passámos. O Campo Joseph H. Pendleton onde os
meninos reguilas levavam um puxão de orelhas que os faziam
chegar a perder muitos quilos de peso.
E, voltámos a parar num centro de informações
turísticas em Oceanside. Já nem foi muito pelas informações,
mas sim por causa da casa-de-banho, porque as informações
turísticas baseavam-se no Zoo de San Diego, o parque da
Lego e da Disney e mais uma série de campos de golf e hotéis.
Tudo informação mais comercial que turística,
como seria normal num país que se move em função
do dinheiro.
E, por falar em dinheiro, foi para gastá-lo
que seguimos caminho até Carlsbad, onde almoçamos
e visitamos as outlets locais. Mas, não sei antes termos
uma conversa com um típico californiano de havaina, surfista
sexagenário, sobre o verdadeiro tempo da Califórnia.
Ele, que estava no centro de informação, dizia que
realmente os turistas vêem com a ideia que a Califórnia é,
em termos de tempo, como a Florida. E, segundo ele, para viver
com os níveis de humidade, os insectos e os furacões
da Florida, mais valia ter um bocado de frio, de vez em quando,
e viver na Califórnia. Concordo! Além disso, surf é na
Califórnia... E, isso vê-se claramente em todas as
praias.
Não vos vou contar o que se passou nas outlets,
porque para além desta crónica já ir longa,
não há muito para contar a não ser lojas e,
lojas.
Passemos directos a San Diego.
O que dizer de San Diego. Estávamos no centro
do espírito californiano. O surf e a boa vida marcava a
vida em todas as esquinas. Mas, não pensem que San Diego é uma
cidadezita de beira mar e que vive desse facto. Não, San
Diego é uma cidade. Há quem diga que Los Angeles
se estende até ali, embora eu discorde, pois existem vários
pontos sem o ambiente citadino no entremeio. Aliás há quem
diga que San Diego seja a praia de Los Angeles mais a sul. Mas,
San Diego não é só praia e já cheira
a México.
Para quem não sabe, San Diego fica mesmo
na fronteira com o México e do outro lado fica a famosa
Tijuana. Quem nunca ouviu falar na cidade do divertimento do outro
lado da fronteira?
Mas, a nossa chegada a San Diego ficou marcada pela
surpresa. Se até ali a condução com trânsito,
mesmo em LA, tinha sido relativamente fácil, em San Diego
a coisa piava mais fino. O que vale é que um condutor experimentado,
como eu, com largos anos de experiência em condução
em condições de extrema competição,
em ambientes tão hostis como na Rotunda da Boavista do Porto
ou no Marquês em Lisboa, qualquer coisa como uma auto-estrada
apinhada de carros e tipos a mudarem de faixa a cada dez metros é uma
brincadeira de crianças. Aliás, no dia em que chegámos,
e poucas horas antes disso acontecer, houve um acidente em que
morreram 3 pessoas num carro que saltou a divisória e foi
incendiar-se contra outro, em sentido contrário. Acho que
vinha a cerca de 160-180 km/h e perseguidos pela polícia.
Essa era a razão porque estava tudo parado.
E, tínhamos que atravessar a cidade para
ir para o parque de campismo, que ficava numa terra de seu nome
Bonita. Parecia que não estávamos já em San
Diego. A calma e o à-vontade das pessoas no parque impressionava.
Entrámos pelo parque e demos uma volta. Fomos à recepção
e ninguém. Demos mais uma volta e nada. Era impressionante
mas parecia que ninguém governava o parque. Perguntei a
uns tipos que bebiam umas cervejas à sombra e disseram-me
que montasse a tenda, que logo apareceria o Ranger. Dito e feito!
Assim, que começámos a montar a tenda, apareceu o
Ranger.
Não se chateou muito, mas disse logo que
o lugar que estávamos a usar poderia estar já ocupado
e que fosse à recepção para preencher os papéis.
E, lá fui eu. A pé porque ele foi na sua pickup.
O ranger tinha ar de ser descendente de índios,
aliás a recepção parecia uma exposição
de artefactos índios. Mas, era muito simpático, atendendo
que não chateava muito e falava menos.
Mas, não vos contei ainda o que de melhor
tinha aquele parque. Tinha pequenas cercas para cavalos... Nos
alvéolos. Sim! Por acaso escolhemos um lugar à sombra
num alvéolo sem estábulo, mas na maioria dos alvéolos
havia um sítio para as pessoas terem os cavalos. Verdade!
Aparentemente o parque pertencia a um clube equestre ou coisa parecida
e havia por ali sítios para cavalgar.
Mas, nós estávamos mais interessados
em tomar um banho e rumar para o outro lado da fronteira. Estava
um pôr-do-sol fantástico, quando acabámos de
montar a tenda, o que nos fazia pensar que estaria uma soberba
noite para umas tequillas em Tijuana.
Seguimos as placas na 805 que nos levaria até à fronteira
de San Ysidro. Porém, não podíamos atravessar
a fronteira com o nosso jipaço, pois não tinha seguro
extensível ao território mexicano, porque para isso
teria que pagar uns dólares a mais e não eram poucos.
Não tinha percebido bem porquê, mas em breve iria
saber.
Mas, eu já sabia a lição toda.
Procurámos um dos muitos parques de fronteira para deixar
o jipe e depois do outro lado íamos de táxi para
o centro da cidade. Já se viam as luzes da fronteira e largámos
o jipe no primeiro parque. Pagámos $7 e disseram-nos logo
por onde era a saída para o México e que não
pagasse mais que $5 para chegar à cidade.
Não há palavras que definam a fronteira.
Saímos do parque e estávamos num corredor entre taipais.
Um funcionário fronteiriço mexicano espreguiçava-se
numa cadeira, enquanto dizia algo a uns outros que estavam nuns
contentores ali ao lado. Ninguém me pediu a identificação,
nem ninguém me deu as boas vindas, ninguém ligou
ao facto de eu estar em trânsito entre dois países,
nem ninguém se importou em saber se eu tinha armas ou droga.
Não se passou nada. Parecia que tínhamos andado num
simples corredor numa zona em obras.
A Cláudia queria um carimbo no passaporte,
e eu nem me importava muito de ter um. Mas, olhámos para
os funcionários fronteiriços e parecia que eles sabia
muito pouco acerca do que era um passaporte. Seguimos para o fim
do corredor, onde nos esperavam os táxis. Mais tarde, o
Tiago explicou-me que a verdadeira fronteira fica a 30kms a sul
dali, Tijuana é terra de ninguém. Lindo!
Chegámos à praça (se se pode
chamar assim) de táxis e fomos abordados por uns três
taxistas todos a oferecerem os seus serviços. Recusámos
e seguimos até ao primeiro da fila, não queria arranjar
confusões. Mas, depressa apercebi-me que afinal não
havia fila nenhuma, nem de táxis e nem de utentes. Era o
verdadeiro salve-se quem puder.
Perguntei ao primeiro taxista quanto teria que pagar
para me levar até ao centro de Tijuana. "Six dolars" respondeu-me...
Pois! "Só pago $5" - disse-lhe ao que ele me respondeu "Então
vamos"... Viva o México!
Há uma música que só ouvi depois de ter estado
em Tijuana, mas que traduz exactamente aquilo que eu penso da cidade.
Chama-se "Welcome to Tijuana" e é do Manu Chao.
Pode ser que ainda vos envie um trecho, mas começa assim:
"Welcome to Tijuana
Tequila, sexo y marihuana
Welcome to Tijuana
Con el coyote no hay aduana"
Que traduz exactamente o que se passou na fronteira "Con
el coyote no hay aduana"...
E, de repente ao aproximarmo-nos da cidade, um mar
de luzes aleatoriamente colocada enchiam o horizonte. No entretanto
já tinha escurecido e só se viam luzes dispersas
monte acima até se perder de vista. Mas, ao contrário
das cidades americanas em que as ruas são perpendiculares
e paralelas e por isso existe uma harmonia na iluminação,
ali parecia que andaram a colocar luzes de natal por uma extensão
de terreno enorme. E, além disso como as habitações
deveriam ser todas térreas e da mesma altura, parecia que
o caos era maior.
Eu fiquei de boca aberta e a Cláudia perguntou
(em espanhol) ao taxista o que era aquilo, ao que simplesmente
ele respondeu "Tijuana".
Pedimos para nos deixar no centro, num restaurante
que servisse bem e barato. E, ele largou-nos à porta de
um bar chamado "Iguanas Ranas", que ficava no primeiro
andar de um edifício. Mas, antes disso conseguimos perceber
porque é que San Diego tem condutores mais "ousados" que
no resto dos Estados Unidos.
De repente, assim que penetrámos, naquela
mancha de luzes fracas mas que se estendiam por uma extensão
enorme, estávamos no verdadeiro caos de Tijuana. Acho que
o taxista não andou mais de dez metros sem mudar de faixa
e ultrapassava por onde dava mais jeito. Os carros eram os mesmos
que os americanos usavam há vinte anos e os autocarros pareciam
saídos de um qualquer filme sobre antiguidades dos transportes
públicos. E, multiplicavam-se os autocarros nas ruas e paravam
onde dava mais jeito. Não se andava muito depressa, é verdade,
porque logo a seguir estava alguém parado, porque alguém
tinha parado para falar com alguém que estava parado. Mas,
sempre sem stresses.
Subimos para o Iguanas Ranas (http://www.sdro.com/iguanas/index.html).
O bar/grill/whatever não existe. Tudo quanto é tipo
de luz e serpentina está colado no tecto, a música
debita um som que ensurdece qualquer um e na varanda, com vista
para a rua, tem uns painéis de acrílico que não
percebi se era para proteger do vento, para proteger de agressões
exteriores ou para prevenir eventuais saltos na atmosfera. Ah!
E bandeirinhas, capas de discos e prendas por tudo quanto era parede.
Sentámo-nos e fomos logo atendidos. Também éramos
quase os únicos no estabelecimento.
"Bienvenida la cena
Sopita de camarón...
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida mi suerte"
Foi exactamente o que pedimos, um cocktail de camarão,
mas que mais parecia uma sopita de camarão. Regado por umas
Tecate, a cervejita mexicana que mais nos fazia pensar que estávamos
em casa.
Lá fora na rua os autocarros repetiam-se
na rua. E, as pessoas...
Desde o início que falámos em espanhol
com o empregado e ele, pensado que éramos americanos, repetia-nos
que podíamos falar em inglês que ele percebia. Até que
a dada altura o rapaz se apercebeu que afinal sabíamos mais
do que cinco palavras em espanhol e começou a conversar
connosco. Chamava-se Ricky, mas não era Martin.
Estivemos na conversa um bom bocado. Só interrompidos
por uns americanos que quiseram beber uma tequilla esquisita. Consistia
em enfiar uma tequilla com sumo de limão pela goela do cliente,
que estava de cabeça para trás, e abanar-lhe a cabeça
enquanto apitava um assobio bem alto. Como ele dizia, uma bebida
que dá nas vistas, mas que não faz nada. Mas, os
americanos gostam.
E, já estávamos na segunda ou terceira
cerveja e decidimos ir a outro bar. O Ricky disse que nos levava
até ao bar ali mais abaixo, porque ali na rua e por ser
terça-feira, e porque não havia muita gente, era
perigoso.
Pois fomos a outro bar. Mais uma vez com seguranças à porta.
E, esqueci-me de contar mas já no Iguanas Ranas tivemos
que mostrar a identificação, porque só se
bebe a partir dos 18 anos.
O bar estava semi vazio, só com um casal
de bêbados que nos olharam de lado e de cima a baixo e um
grupo de americanas que nem se aguentavam de pé. Tinha espelhos
por todo o lado e candeeiros de vidro coloridos. No centro ficava
o bar onde trabalhava o amigo do Ricky.
A Cláudia pediu uma tequilla e o amigo do
Ricky apontou para uma das filas de garrafas no bar, com mais de
vinte garrafas, e perguntou "Qual delas?". Impressionante,
como é que era possível haverem tantos tipos de tequilla?
No entretanto as americanas bêbadas dançavam
e segundo o Ricky aquilo estava muito calmo, porque ao fim de semana,
elas bêbadas chegam-se a despir em cima das mesas. Um amigo
contou-me que há bares onde há letreiros que dizem
que o nu integral é proibido. Na verdade, os americanos
só podem começar a beber aos 21 e quando fazem 18
vão para o México como ritual de iniciação.
E, depois fazem aquelas vergonhas... Segundo o Ricky se as areias
da praia de Tijuana falassem...
"Bienvenida mi amor
De noche a la mañana
Bienvenido a Tijuana..."
Ali ficámos um bom bocado. Mais uma tequilla
e uma de conversa. O amigo do Ricky ficou impressionado por nos
ouvir falar espanhol e ainda ficou mais impressionado quando lhe
disse que falava português, inglês, francês e
ainda percebia algum italiano e alemão. Claro que metade
era treta, mas ele ficou feliz e eu não ia contrariá-lo.
Estava na hora de voltar. O Ricky trocou endereços
connosco e indicou-nos os táxis seguros para nos levarem à fronteira.
Lá fomos.
O taxista pediu-nos $10, mas lá lhe dissemos
que se quisesse fazer por $5 que nos levava. E, levou.
Depois foi atravessar a fronteira, sem problemas
e quase sem nos perguntarem nada. Tínhamos passaporte europeu
e nem olharam para o visto. O problema era mesmo o mexicanos.
Na zona da fronteira, existe uma feira de produtos
tradicionais, mas tão rançosos que nem vale a pena
comprar.
Fomos buscar o jipe e arrancámos para Bonita, para o nosso
parque de cavalos. Muito devagar e com calma, porque já tinha
bebido um bocado e não queria problemas com a polícia.
Mas, nem demorou muito para estar a dormir e a pensar
em Tijuana, a terra do caos.
"Welcome to Tijuana
Tequila, sexo y marihuana
Welcome to Tijuana
Con el coyote no hay aduana
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida mi amor
De noche a la mañana
Bienvenido a Tijuana...
Bienvenida mi suerte
A mi me gusta el verte
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida mi amor
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida tu pena
Bienvenida la cena
Sopita de camarón...
Bienvenida a Tijuana
Bienvenida mi suerte
Bienvenida la muerte
Por la Panamericana
Welcome to Tijuana
Tequila, sexo y marihuana
Welcome to Tijuana
Con el coyote no hay aduana..."
"Welcome
to Tijuana" - Manu Chao: Pequeno Trecho em MP3 (248kb)
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