Terça-feira, 4 de Julho de 2000
Acordei com o Rafael a tocar à campainha.
Ele tinha-me escrito um mail na noite anterior a dizer que aparecia,
assim como o Pedro Neves.
Enquanto eu vestia o fato de banho, ele pôs-se à vontade
e deu uma vista de olhos nas minhas fotografias. Deixei um bilhete
na porta para o Pedro e fomos dar um mergulho.
O Pedro apareceu pouco depois e estivemos na beira
da piscina a conversar sobre o Creoula, a Sagres e o regresso a
casa em Outubro. Mas, a fome começou a apertar e fomos comer
ao mexicano dos burritos lá do centro comercial.
O combinado era ir fazer uma caminhada. Eu nem tinha
olhado para os mapas, mas trilhos no Tamalpais é coisa que
não falta e encontrar uma volta é simples... Mas,
eu não queria nada de muito puxado, pois a tarde do dia
anterior ainda tinha deixado algumas marcas, leves é verdade,
mas presentes. E, optei por um volta pelos Muir Woods, mas a entrar
pela porta do cavalo, ou seja, descer o monte até Muir Woods,
passear por lá e voltar por outro trilho a subir o monte.
Telefonei ao Ben, mas ele estava pior que eu e a
preguiça não o quis deixar acompanhar-nos na difícil
jornada de passear pelos redwoods de Muir Woods. E, fomos só os
três no bólide da Mariana para o Tamalpais.
Deixámos o bólide numa berma da estrada
junto ao parque de estacionamento de Bootjack, onde se pagavam
cinco dólares para deixar o carro. Nós não
pagámos nada, mas tivemos que andar cerca de cinquenta metros
para chegar ao parque, porque, um mexicano que lá estava,
estava a pagar uma multa porque quis fazer a mesma coisa que nós,
mas dentro do parque.
Começámos a descer o Bootjack Trail
em direcção a Muir Woods. O trilho de pé-posto
descia por entre redwoods, ou sequoias da costa, e com uma inclinação
apreciável em algumas zonas. O trilho passava por uns riachos
que naquelas inclinações e com as árvores
caídas, faziam algumas quedas de água, mas que nesta
altura do ano e como têm pouca água, estavam pouco
prenunciadas. Mas a envolvência e o fresco da água
fazia com que o trilho se tornasse muito bonito.
De repente, a meio da descida entre duas redwoods,
aparece um letreiro de madeira, com quase um metro e meio de comprimento,
a dizer "No Dogs 8pm - 7am". Era difícil de acreditar que
aquilo estava ali com a intenção de prevenir as pessoas
de levarem cães à noite para aqueles sítios,
mas a verdade é que estava ali... Nós rimo-nos e
começámos a comentar este tipo de atitudes e os letreiros
que existem para prevenir tudo e que só existem nos Estados
Unidos. Será que quando eu voltar a Portugal vou começar
a meter gatos no microondas só porque nas instruções
não diz nada em contrário?
De repente o número de pessoas no trilho
começou a aumentar e apareceu uma ponte sobre o riacho,
naquilo que parecia já o vale. Estávamos em Muir
Woods. É surpreendente como é que nos cobram dois
dólares para visitar o parque e depois se descemos uns trilhos
e não entramos pela frente, não nos cobram nada.
Também não fui refilar.
Fizemos o parque todo até à porta
por um trilho que segue uns metros acima do riacho e depois voltámos
para trás pelo trilho que segue junto a ele.
O parque é muito bonito e está muito
bem cuidado. Como é normal em quase todos os parques que
vi até agora, está tudo muito bem assinalado e a
informação interpretativa do parque é impecável,
o que permite que as pessoas e, essencialmente, as crianças
se apercebam da necessidade da preservação da natureza.
Mas, por vezes a preservação é levada ao exagero,
como proibir as pessoas de chegarem perto de algumas árvores
porque a erosão provocada pelos passos pode fazer com que
as árvores caiam. Uma árvore com quase trinta metros
de altura e com raízes, que é verdade não
são muito profundas, em proporção ao seu tamanho,
mas, que vão a cerca de cinco metros, podem cair, porque
as pessoas se aproximam delas?
Ainda vimos uma árvore com uma placa dedicada
a um tal senhor doutor que foi um dos pioneiros da fisioterapia
e uma mulher ranger (guarda florestal) a dizer aquelas lenga-lengas
que lhes ensinam e que elas repetem vezes sem conta, sobre a beleza
e os mistérios do lugar onde, os crentes dos turistas ouvintes,
estavam.
Passámos pelo local onde foi assinado o tratado
das Nações Unidas em 1945 e que fica entre quatro
redwoods, numa zona onde já se anda em cima de um estrado
de madeira por causa da erosão dos caminhantes e por causa
da poluição do pavimento usado para prevenir essa
erosão. Aí, estava uma árvore dedicada ao
Roosevolt o mentor das Nações Unidas, segundo os
americanos, os mesmos que votaram contra no referendo para participar
na Sociedade das Nações, alguns anos antes da criação
dessa organização e que foi a sua antecessora. O
Roosevelt não viveu para assinar o tratado.
Pouco depois apanhámos o Ben Johnson Trail,
que nos levaria até ao carro. Não sei quem era o
senhor que deu o nome o trilho, mas não estou a ver o dopado
do canadiano a correr aquele trilho a subir e com aquelas inclinações.
Pelo caminha passámos por várias redwods carcomidas
interiormente por algum fogo e que serviam de casa de banho aos
caminhantes. Não de uma forma oficial, mas de uma forma
necessária.
Quando chegámos ao fim do trilho e à casa
do Ranger, tivemos que seguir a estrada cerca de uns trezentos
metros até onde tínhamos deixado o carro. Mas, ainda
bem que era a descer, porque depois de mais de doze quilómetros
a andar, já merecíamos um descanso.
Agarrámos o bólide e seguimos para
Stinson Beach, para beber uma cerveja merecida na praia e ao pôr-do-sol.
Como de costume comprámos a cerveja no mini-mercado e fomos
para a praia bebê-la, mas,... Com a garrafa dentro de um
saco de papel, para não mostrar que era uma bebida alcoólica,
pois isso é proibido nesta terra de Deus.
O vento na praia levantava a areia fina e não
nos permitiu estar ali muito tempo, mas foi o suficiente para ficar
com areia por todo o lado. Decidimos ir embora e parar em Muir
Beach, pois o Rafael trazia o equipamento todo de fotografia e
ainda não tinha usado nada... Mas, ali com aquela areia
toda não era muito aconselhável.
Parámos em Muir Beach lookup, um ponto rochoso
no ponto mais alto da parte habitacional de Muir Beach, na encosta
norte da praia, como vos disse na última crónica.
Nesse ponto têm-se uma vista sobre quase toda a costa, a
norte até Stinson Beach e a Sul até São Francisco,
isto se o nevoeiro deixar. E, naquele dia deixou.
Este morro rochoso, como outros ao longo desta parte
da costa, foi usado durante a segunda guerra como posto de observação
e de detecção de navios inimigos e ainda lá se
encontram os postos de vigia. Um bocado destruídos, mas
estão lá. Depois existe um trilho, protegido com
um corrimão, até à ponta do rochedo de onde
se pode apreciar a beleza do pacífico e das falésias
da costa... Além disso, as cores começavam a aralanjar,
pois aproximavamo-nos do pôr-do-sol.
Estava na hora de ir embora, pois ainda queríamos
ir à noite para Sausalito, de onde esperávamos ver
o magnífico fogo de artifício, comemorativo do dia
da independência dos Estados Unidos. Só esperávamos
que o nevoeiro deixasse ver alguma coisa.
Pelo caminho combinámos os procedimentos
para, que enquanto um tomava banho, os outros faziam o jantar.
Quando entrámos no Safeway para comprar a carne picada,
que supostamente ia ser o nosso jantar, encontrámos a Joana,
a Rita, a Mónica, a Cristina e o Tiago. Eles tinham vindo
ver o tal aclamado fogo de artifício de São Francisco,
a partir de Sausalito.
Quando cheguei a casa, estavam à minha espera,
o André, a Kathelene e a Wenke. O André e a Kathelene,
pelos vistos, tinham lá estado também na noite de
domingo, mas eu já devia de estar a dormir e não
o ouvi a bater. E, assim eles tiveram que se ir embora. Azar! Foi
mesmo azar...
O pessoal sentou-se na sala a ver televisão
e a comer fruta, enquanto eu tomava banho. O Pedro e o Rafael fizeram
o jantar, uma carne à bolonhesa maravilhosa, acompanhada
com uma cervejinha.
E, estava quase na hora do fogo. Partimos para Sausalito
e como seria de esperar a confusão era tal que nos perdemos
uns dos outros. Assim que vimos os primeiros foguetes, o Pedro,
estacionou o seu Golf cabrio emprestado e fomos a correr até à borda
de água.
Os foguetes do fogo de Sausalito arrebentavam quase
em cima das nossas cabeças, mas nós queríamos
era ver o fantástico fogo de São Francisco e corríamos
para a zona da beira baía. A cada foguete que rebentava
ali, eu gritava alto e era ver quantos berros e gritos se ouvia
entre os espectadores. É engraçado ver como estas
coisas provocam as pessoas, e principalmente os americanos. Houve
uma parte que consegui pôr o pessoal todo a berrar de alegria
e a bater palmas a uns foguetes brancos sem efeitos nenhuns.
Quando chegámos à borda da baía
via-se muito ao longe São Francisco e dois pontos com duas
bolas de fogo coloridas, mas nem se ouvia o barulho das explosões.
Coloquei a máquina em cima de uma caixa de
venda de jornais e no momento que disparo para uma exposição
de 20 segundos, um tipo num veleiro mesmo à frente de mim
solta uma salva de alarme vermelha, que passa mesmo em frente à área
a fotografar.
Segunda tentativa. Foco a coisa de maneira a que
não apanhe o veleiro. Quando vou a disparar reparei que
não havia fogo, apesar de o de Sausalito continuar. Esperámos
um bocado e nada. O pessoal começa a dispersar e eu, pronto,
aceitei o facto de que realmente o fantástico, magnífico
e surpreendente fogo de artifício de São Francisco
tinha acabado. Aquela treta de fogo de artifício, que foi
feita por uma empresa chamada De Souza e que é de um bisneto
de um açoreano, como seria de esperar, não passou
disso. Uma treta! O fogo de Sausalito tinha sido muito melhor.
Mas, não estava tudo perdido. Já que
estava ali e não havia nevoeiro podia tentar tirar uma foto
nocturna a São Francisco. Foquei a cidade e disparei uma
exposição de 30 segundos, pois agora não havia
tanta luz. E, não é que há um filho da mãe
de um gajo que está na borda da água, ao meu lado
que decidi acender um foguete e este fica mesmo por debaixo da área
a fotografar. A claridade queimou a foto.
Estava mesmo com azar. Não valia a pena tentar
mais nenhuma foto.
Fomos beber uma cerveja, os três. Eu, o Pedro
e o Rafael.
O Rafael pagou o jantar com uma cerveja e ficámos
ali no cais na conversa sobre aquilo que mais temos falado nos últimos
nove meses - diferenças culturais entre os povos. O Rafael é brasileiro,
o Pedro esteve em ERASMUS na Suécia e eu, estou nos Estados
Unidos como eles... Estive na Alemanha e na Holanda no ano passado,
em Espanha já por diferentes vezes e em Paris (de França)
uma semana há uns quatro anos.
E, assim passámos ali uma hora sentados na
borda da baía, sem vontade nenhuma de voltar para casa e
encarar o facto de que no dia seguinte se trabalhava. Mas teve
de ser... Eles deixaram-me em casa e seguiram para sul. Foram por
Richmond do lado Este da baía para não terem que
atravessar São Francisco e o caos que devia de ser depois
do magnífico fogo de artifício da treta.
Estes americanos deviam de ter ido à EXPO
98. Ah! Orgulho nacional! |