Sábado, 1 de Julho de 2000
Fiz café na máquina de saco do Singh.
Obviamente tive que lavar aquilo porque a quantidade de experiências
biológicas levadas a cabo pelo meu colega de apartamento
na jarra de vidro, fizeram com que fosse difícil ver se
o café estava a sair bem. Foi só por isso, porque
ele continua a usar a jarra do café desde aí sem
a lavar e ainda está vivo.
Recebi um mail do Tiago enviado à hora que
eram suposto chegar a minha casa, e a dizer que iam chegar atrasados.
Novidades têm?
Por volta do meio dia chegou o Tiago, a Joana, a
Rita, a Mónica e a Cristina, uma outra estagiária
do Contacto, que está em Detroit no Michigan e de quem ainda
vão ouvir falar, pelo menos nas próximas crónicas.
Mal chegaram, decidimos ir para a piscina. Ou para
perto dela. Enquanto esperávamos que mais alguém
aparecesse... Só o Ben tinha dado a certeza de aparecer.
O André e a Kathelene só apareciam no dia seguinte.
A Cristina nem esperou que estivéssemos prontos,
porque mal ouviu falar em piscina e sol já estava de fato
banho e pronta a descer. A Rita e a Mónica, obviamente não
tinham fato de banho, porque para além de nunca pensarem
nisso, iam-se embora nesse dia para São Francisco, porque
a Mónica trabalhava no domingo e a Rita tinha que ir dar
de comer aos gatos que o Carlos está a tomar conta.
Complicado? Passo a explicar: O Carlos arranjou
uma velha qualquer que lhe cedeu a casa e se calhar ainda lhe paga
uns cobres para ele tomar conta dos gatos dela e da casa enquanto
ela está de férias. Mas, o Carlos tinha ido para
San Diego com mais pessoal e deixou o carro à Rita e à Mónica,
e elas ficaram de ir dar de comer aos gatos.
Acho que foi a primeira vez que desfrutei da piscina
do meu condomínio. Só tinha lá tomado banho
uma vez e na altura ainda estava algo fria. Mas, naquele dia...
Entrar custava um bocado, mas depois de se estar lá dentro
nem apetecia sair... Porque aliás estava um ventinho algo
frio cá fora.
Mas assim foi passando o tempo até que apareceu
o Ben, com uma soneira e ressaca tamanha que não conseguia
falar muito alto, e mal abria os olhos.
Nessa altura resolvemos ir almoçar qualquer
coisa ao centro comercial do outro lado da rua e reagir, ou seja,
dar um salto até qualquer lado.
Eu e o Tiago comprámos o menu especial para
duas pessoas no mexicano dos burritos lá da esquina e que
se saldou num frango inteiro, feijões, arroz, massa de pão
esticada que nem sei o nome e umas latinhas de salada. Um luxo!
Sentámo-nos na esplanada, cada um com seu
prato e desfrutámos o sol enquanto comíamos e depois
enquanto tamávamos o café. Sempre sem pressas!
Resolvemos então reagir e fomos até Muir
Beach, porque Stinson Beach já todos conheciam, exceptuando
a Cristina, e aquela praia, só eu é que conhecia.
Quando lá chegámos o estacionamento
estava completamente cheio, não porque se estivesse muito
bem na praia, mas porque havia um enorme barbecue na zona abrigada
junto ao riacho que dá à praia. Mas, nós como
jovens destemidos fomos para a praia. Aliás, já ninguém
conseguia segurar a Cristina, pois em Detroit, junto aos grandes
lagos as praias são poucas e água salgada não
existe.
Pois bem, as saudades do mar eram tantas que a Cristina
conseguiu tomar banho na água gelada do pacífico
em Muir Beach. Eu só de me aproximar da linha de água
já imaginava o gelo que devia de ser, e além disso
não estava com tantas saudades.
O pessoal pôs-se a jogar ao disco. E, eu fui
com a Cristina até ao cimo do morro por cima da praia. Acho
que já vos contei isto, mas Muir Beach é tipo as
praias do Alentejo. É um pequeno areal entre duas encostas
escarpadas fruto da erosão do tal riacho, de seu nome Muir
Creek. A escarpa a norte da praia está toda ocupada com
habitações sumptuosas e com grandes janelas viradas
para o mar. Um luxo! E a encosta sul, à direita da praia
quem olha o Oceano Pacífico, pois aqui as praias têm
a mesma orientação que na costa ocidental portuguesa
o que faz com que não se estranhe muito... Mas estava a
falar da encosta sul está completamente inabitada e protegida
ambientalmente, mas tem um trilho que segue até à próxima
praia, que é em Tenessee Valley e que já vos falei,
pois era onde eu ia passear de bicicleta a partir do escritório.
Essa praia também é fruto da erosão de um
riacho de seu nome Tenessee.
Mas, eu e a Cristina subimos à encosta sul.
A Cristina de chinelos abusou um bocado da sorte, mas quando chegámos
lá acima a vista sobre o recorte da costa e as ondas a baterem
contra a rocha fez-me lembrar o Sítio na Nazaré.
Uma vez numas férias há uns anos, eu a Cláudia
e uns amigos fomos até à ponta do Sítio, onde
está o farol. O mar estava de tal maneira bravo, que a ondulação
contra as rochas nos fascinaram durante uns momentos. Tenho uma
foto de todos parados a olhar a água a bater nas rochas
como se fosse uma das mais belas pinturas vivas da história
da arte.
Quando cheguei lá em cima, lembrei-me desse
momento. Além disso, as marcas da civilização
naquele ponto eram quase imperceptíveis o que faz desta área
uma beleza natural tão acessível. O verde da montanha,
o castanho das rochas, o branco da espuma, o azul do céu
e o verde azulado do mar são muito bonitos.
Tirámos umas fotos um ao outro, falámos
da costa vicentina e voltámos à praia, onde o pessoal
e o vento frio nos esperava. O resto do pessoal farto de levar
com areia e com frio, queria se ir embora e decidimos ir comer
umas ostras a Point Reyes.
Quando estávamos a sair da praia, voltámos
a passar pelo tal barbecue/festa e o número de pessoas envolvidas
tinha aumentado e aliás, acabava de chegar o nosso colega
Jorge. Uma coincidência. Dois minutos antes ou depois e nem
nos tínhamos encontrado. Pelos vistos uma colega de trabalho
convidou-o para o tal barbecue e ele ali estava. Ela é que
aparentemente não estava... Esperámos um bocado para
ele confirmar se ela estava ou não e quando ele desistiu
veio atrás de nós na sua mota até ao Point
Reyes National Seashore, o parque natural na placa tectónica
do pacífico.
Eu fui com a Rita e a Mónica no carro do
Ben e ia sempre com atenção porque o Jorge estava
a ficar sem gasolina. A Mónica vinha agarrada ao assento
como se a vida dela dependesse disso... Estava enjoada!
Parámos o carro junto ao Earthquake Trail
e fomos passear até à falha de S. André e à cerca
que se deslocou três metros no terramoto de 1906. Estávamos
no epicentro do terramoto, como indicava o café pelo qual
tínhamos passado há minutos na estrada. Acho que
em Portugal em algumas vilas deviam de haver cafés chamados "O
Incendiário".
O Earthquake trail é como diz o nome... O
Trilho do terramoto. Sim! Ao longo do trilho existem uma série
de placares que explicam o fenómeno geofísico que
faz com que a terra trema e o movimento das placas tectónicas.
Naquele momento estávamos na placa do pacífico, mas
ali a cerca de uma dezena de metros estava a placa continental
americana que se deslocava para Norte. O trilho tem cerca de 750
metros e asfaltado para permitir que os deficientes também
possam usufruir do contacto com a natureza e a informação
sobre os terramotos.
Eu quando vi a primeira vez a tal cerca que se tinha
deslocado três metros achei aquilo uma treta. Mas aqui há uns
dias a ver um site na Internet sobre o terramoto aparece uma fotografia
de 1906 da mesma cerca e fiquei completamente crente. A cerca na
altura separava dois campos e havia uma quinta ali ao lado. A quinta é hoje
o centro de recepção do parque natural de Point Reyes
e os campos estão povoados de árvores. A cerca foi
mantida para que a população local tenha consciência
do barril de pólvora onde vivem e para saberem que procedimentos
tomar no caso de sofrerem um terramoto. O terramoto de 1989, o último
grave na zona, (porque terramotos são diários e nalgumas
zonas mais frequentes, eu é que não senti nenhum)
não teve grandes efeitos nesta zona a norte de São
Francisco, ficando os efeitos pela cidade e a zona a sul e este
dela. Mas, os peritos dizem haver 70% de hipóteses de haver
um terramoto quase da dimensão do de 1906, podendo atingir
a magnitude de 6.7, nos próximos 30 anos. Pode ser já amanhã...
Esperemos que não!
Mas saímos dali com uma fome e já só pensávamos
nas ostras. Parámos os carros, assim que entrámos
na vila de Point Reyes e sentámo-nos numa esplanada a beber
uma cervejinha e a comer ostras com molho de alho e cruas, ao pôr-do-sol.
Mas há lá coisa melhor na vida do
que comer e beber uns copos com os amigos?... De repente lembro-me
de umas poucas, mas não vêm ao caso! Lembrei-me das
lapas em Porto Santo e da Cláudia que adora estas coisas.
Depois volto só com ela lá...
Ficámos ali na esplanada, até o nevoeiro
que se aproximava do lado do mar, nos expulsar com o seu amigo,
vento frio. Seguimos para minha casa. O Jorge que vinha ansioso
por acelerar e fazer umas curvas na sua mota, teve o azar de deparar
com a polícia numa zona de escolas... Nós tentámos
parar mas a polícia mandou-nos seguir senão também éramos
multados. O Jorge vai a tribunal, o que é bom, porque por
aqui apelar vale a pena.
Chegámos a casa cansados e sujos. Tomámos
banho (um de cada vez) e fizemos carne picada com caril para o
jantar. A Rita e a Mónica foram-se embora para São
Francisco e os restantes deitámo-nos cedo... |