Vamos com calma...
Segunda-feira, 26 de Junho de 2000
De volta ao trabalho depois de um fim-de-semana
de festa e alguma actividade, custa sempre um bocado. Mas, a verdade é que
se aproximava um fim-de-semana de descanso. O quatro de Julho,
dia da independência, é feriado e é um feriado
que não é móvel. Ou seja, ao contrário
da maioria dos feriados que são às segundas-feiras,
o quatro de Julho celebra-se mesmo no quatro de Julho. E, este
ano calhou a uma terça-feira, pelo que houve ponte na segunda.
Pelo menos para mim.
Alguns dos sillies (o pessoal que está no
Silicon Valley) estavam a combinar ir para San Diego. Eu como estava
com pouca vontade de ir e além disso ainda sou capaz de
lá ir no verão com a Cláudia, convidei os
restantes para virem passar o fim-de-semana comigo a Corte Madera.
Um fim-de-semana calmo com uns banhos na piscina, se o tempo ajudar,
umas idas à praia, uns barbecues no parque e umas caminhadas
(leves) na montanha Tamalpais.
A Joana foi a primeira a aceitar e o Tiago logo
a seguir.
Do dia de trabalho não há muito a
assinalar. Não vos vou maçar com pormenores sórdidos
da construção de demos de software de 3D e computação
gráfica.
Terça-feira, 27 de Junho de 2000
O dia seguiu o normal curso de um dia de trabalho...
Normal!
Só há que assinalar o facto de não
pegar na Vaynessa para ir trabalhar ou para dar uma volta há semanas.
Estou mesmo a ficar preguiçoso.
Ao fim da tarde, à saída do trabalho,
resolvi dar uma volta de carro por Tiburon e Belvedere.
Tiburon é uma das zonas mais caras de Marin
County, em termos de habitação. E, não admira,
pois é uma das zonas habitacionais mais bonitas da região
toda da baía de São Francisco. Imaginem uma pequena
extensão de terra que entra na baía em forma de uma
barbatana de tubarão (daí o nome) e com casas fabulosas
nas encostas até quase a tocar na água. Quase todas
as casas têm um cais de atracagem de barcos e raras são
as que não têm um veleiro ou um barco a motor parado
em frente. Suponho mesmo que há lá casas onde não
se deve entrar sem ser por mar, mas deve ser difícil, porque
não estou a ver um americano que não queira parar
o carro na sala de estar da casa dele.
Belvedere é uma outra extensão de
terra, também em forma de barbatana de tubarão, mas
muito mais pequena e que fica paralela a Tiburon. Belvedere é mais
barata porque não tem a vista fantástica sobre São
Francisco. Entre Belvedere e Tiburon existe um vale com pequenos
lagos onde estão casas habitacionais...
Vocês não devem estar a imaginar o
paraíso que é. Aliás a estrada que atravessa
Tiburon chama-se Paradise Drive. E foi essa a estrada que eu tomei
para lá, e, fui parando conforme as belezas naturais e construídas
pelo homem me fascinavam por demais para poder continuar.
Ainda me perdi umas duas vezes em Belvedere, pois
como aquilo é muito pequeno as estradas não têm
saída e tive que voltar para trás. Parei, junto à baía
do outro lado dos escritórios da minha empresa para tirar
umas fotografias e de repente vejo um carro da polícia a
parar mesmo perto do bólide. Fiquei preocupado, pois como
tem um farolim partido a polícia podia implicar. Mas, afinal
apenas estava ali para falar com alguém das casas ali ao
lado.
Segui para Tiburon. Passei na zona dos pequenos
lagos com casas e cheguei ao centro da vila. O verde da relva e
os arranjos citadinos são extraordinários... Pena é que
o nevoeiro cerrado não permitisse ver a cidade de São
Francisco, do outro lado da baía.
Segui a Paradise Dr. do lado este da baía
que vai dar a Corte Madera, sempre junto à água.
As casas nas encostas até assustam... Como é que é possível
construir assim tão alto e em cima de estacas de madeira
numa zona sísmica como esta. Um dia destes há um
terramoto e os tipos estão a navegar na baía, dentro
de casa.
A estrada serpenteia contornando as depressões
daquela pequena península e ao longe vê-se a ponte
de San Rafael, que com a sua forma esquisita, a sua longa extensão
e ao pôr do sol dá uma imagem do que é realmente
a baía.
De repente o céu começou a ficar negro
e o vento a aumentar. As árvores abanavam a toda a força
e a ponte começou a desaparecer. O bólide abanava
com o vento. Ainda há pouco estava um pôr-do-sol laranja
e bonito e de repente estava no meio de uma tempestade. Caíram
umas pingas. Na primeira hipótese virei para a auto-estrada
e fui para casa.
Um quilómetro à frente a tempestade
já não era perceptível. Era apenas uma pequena
nuvem de tempestade. Mas, não houve um relâmpago sequer.
Depois perguntei ao Ken, e ele realmente confirmou que era muito
difícil ver relâmpagos aqui na zona. E, eu não
me lembro de alguma vez ter visto algum, nem no inverno.
Quarta-feira, 28 de Junho de 2000
Um dia triste para toda a nação lusa.
A derrota frente à França nas meias finais do Euro
2000, vai ser outro momento que os portugueses não vão
poder esquecer tão cedo. Mais uma derrota frente à França
nas meias finas do europeu e isto começa a parecer um mau
olhado ou uma sina difícil de carregar.
Falou-se muito da injustiça do resultado
e da marcação do pénalti que nos levou à derrota.
Foi triste é verdade! Se calhar até foi injusta a
forma como o juiz de linha marcou a falta e como estava a beneficiar
os franceses, mas a verdade é que os franceses marcaram
um golo por eles e jogaram para ganhar até ao fim.
Mas, isso não nos vai tirar a raiva de termos
voltado a perder frente à França nas meias finais
do europeu, depois de termos estado a ganhar. E, não nos
vai tirar a raiva de vermos os nossos jogadores a darem o que podem
no jogo e serem derrotados por uma falta que não seria marcada
se o infractor fosse francês.
Mas resta-nos a vingança em território
nacional em 2004. Quero ver a selecção a jogar assim
em casa e não ganhar o europeu. Acho que os árbitros
se fizerem uma daquelas em Portugal, vão ficar sem calções
e são enviados para casa com um banho de alcatrão
e penas, como no Lucky Luke... Isto porque não me permito
dizer pior nestas crónicas.
Mas, a verdade é que a selecção
portuguesa foi considerada a maior revelação do Euro
2000 e possivelmente fizeram mais pela imagem de Portugal no exterior,
do que mil programas de divulgação do nosso património
e da nossa história.
Eu ouvi o jogo todo via TSF online. Festejei o golo
de Portugal e sofri o golo da França, sozinho aqui no meu
escritório. E, fiquei com um nó no estômago
aquando do pénalti... Mas, a vida continua, o que temos é que
aprender com estes erros e olhar a próxima hipótese
como uma em que estaremos mais bem preparados. A equipa portuguesa
não perdeu. Esteve muito acima do que se esperava dela.
No fim do dia trouxe para casa uma mesa de secretária
para casa, para o meu quarto. A empresa aqui do lado mudou de escritório
e deixou alguns móveis atrás, que o senhorio ia deitar
fora. Claro, que o pessoal aqui do escritório amanhou-se
com o que pode. Eu levei uma grande mesa de secretária em
curva e arrumei um armário para levar, quando o Jesse puder
ajudar com a carrinha dele.
Em casa, à noite estive a compilar as crónicas
e a fazer mais umas páginas para o web site. A meio estive
na conversa com a Joana sobre o fim-de-semana e sobre coisas da
vida.
Quinta-feira, 29 de Junho de 2000
Do dia de trabalho, já nem me lembro o que
vos hei-de dizer. Foi um dia normal, como quase todos os que assim
são.
No fim do dia na ida para casa resolvi ir até San
Rafael ver a ponte ao pôr-do-sol e tirar umas fotos. Claro
que tentei chegar o mais perto possível sem ter que a atravessar,
porque para além dela ter cerca de dois ou três quilómetros,
não me apetecia ter que pagar portagem.
Consegui parar o carro, numa entrada de um clube
já bem perto da ponte e fui tirar umas fotos. Estava ali
a apreciar a paisagem composta pela ponte em curva, comprida e
com uns pilares estranhíssimos, as luzes de Pt. Richmond
do outro lado e a água da baía azul mas com uma matiz
de laranjas reflectindo o pôr-do-sol. No pontão do
clube estava um grupo de gaivotas que brincavam entre si, voando
em círculos e fazendo o normal barulho estridente, próprio
das gaivota.
A dada altura notei que andava um tipo muito observador
no clube e como no sítio onde estava o carro dizia que não
era permitido estacionar, resolvi voltar. Também as cores
já se estavam a perder, a luz era pouca e o vento estava
a ficar frio.
Entrei no carro e fiz inversão de marcha.
Quando estava a sair do acesso, aparece um reboque. Até fiquei
verde. O tipo pede-me para parar e pergunta-me se eu conheço
o dono do carro que estava estacionado atrás do meu, na
zona proibida e de acesso a bombeiros. Mais calmo disse-lhe que
só parei para tirar umas fotos, que não era dali
e que não conhecia ninguém por ali. Ele agradeceu,
disse que não lhe apetecia estar a rebocar o carro e que
ia tentar encontrar o dono.
Eu fui-me embora e mais à frente o reboque
passou por mim, mas sem o carro.
Quando cheguei a casa, agarrei na Vaynessa e fui
para o parque de Corte Madera. Não estava com vontade de
estar em casa e queria experimentar algumas coisas na minha câmara
fotográfica. Sentia-me inspirado.
Apontei a máquina ao Tamalpais e esperei
pelo lusco-fusco para tirar uma fotografia. Estava ali deitado
na relva, agasalhado e confortável à espera do momento
exacto para a foto. O sono e a fome começavam a apertar
e a vontade de adormecer era muita. De repente, às nove
horas, os dispositivos de rega de um relvado atrás de mim
dispararam e começaram a largar água. Bem! Eu estava
ali mesmo em cima da relva e se a seguir era este o relvado a ser
regado? Onde é que estavam os tais dispositivos que iriam
disparar a seguir? Olhei em volta e tinha um a cerca de vinte centímetros
da minha cara.
Tirei a foto e fui-me embora, antes que tomasse
um banho não muito desejável e desagradável. |