Segunda-feira, 19 de Junho de 2000
Depois de um fim-de-semana de trabalho e em qualquer
segunda-feira, acordar cedo custa e como filho de alentejano que
sou, acordei cansado.
Não tive coragem de pegar na Vaynessa e fui
para o escritório no bólide, que como de costume
anda na reserva... Ainda não aprendi com a história
de ficar sem gasolina na Golden Gate Bridge.
Quando cheguei ao escritório, tinha no meu
mail todas as partes do tal trabalho temático, menos duas.
A história do trabalho é a seguinte: Eu, que estou
nos Estados Unidos, estou num grupo de trabalho que é composto
pelo António, que está na Hungria, a Sofia, que está no
Luxemburgo, a Filipa Pato, que está na Argentina e a Filipa
Aguiar, que está na Inglaterra. Este grupo propôs
como título para o trabalho temático, qualquer coisa
como Turismo Ecológico e o Desenvolvimento Sustentável
e cada um era responsável por fazer uma parte do trabalho
e escrever sobre o que se faz acerca do turismo ecológico,
no país onde está.
Acontece que alguns tiveram dificuldades em perceber
o tema e outros tiveram problemas de tempo e de ligação,
pelo que chegada a hora de entrega do trabalho, que era nesta segunda-feira,
não estava acabado. Mas, com a ajuda e colaboração
de quase todos os do grupo conseguiu-se avançar bem depressa
para a resolução de todos os problemas.
Terça-feira, 20 de Junho de 2000
Novamente, continuou a discussão em volta
do trabalho temático. O que inserir, cortar e que imagens
colocar.
E ao mesmo tempo, ter que fazer o trabalho normal...
Quarta-feira, 21 de Junho de 2000
Ao fim da tarde consegui receber a última
das partes e acabar e enviar o trabalho temático. Já estava
a ficar farto de ver Turismo Ecológico.
Aliás num dos dias em que escrevia sobre
o Turismo Ecológico em Portugal e estava a falar do Parque
Natural da Serra do Alvão, comecei a pensar na Cabana em
Lamas D'Olo e nas trutas, alheiras, paio e afins que por lá se
come. Estava a sonhar com isso e com a ideia de lá ir no
próximo fim-de-semana e visitar a minha sobrinha e os meus
cunhados... Quando ouvi uma voz falar inglês ao fundo do
corredor e me apercebi que estava a milhares de quilómetros
de distância desse paraíso. Acordei!
Sai do escritório com outra disposição,
pois já podia apreciar as vistas e não tinha que
ir a correr para casa para acabar o trabalho temático. Há uns
dias que não se vê São Francisco do meu escritório,
tal é o nevoeiro que cobre a entrada da baía e a
cidade. Aqui, o nevoeiro afasta-se para o mar com os primeiros
raios de sol, e só volta ao fim da tarde, enquanto que por
lá e por ser uma zona baixa, o nevoeiro nunca sai. Quando
o nevoeiro começa de novo a aproximar-se, ao fim da tarde
e começa a passar por entre os cumes dos montes e a descer
encosta abaixo, para o vale, parece como se a montanha estivesse
a escorrer espuma, como quando o leite ferve e começa a
subir a cafeteira devagar e entorna como se estivesse em câmara
lenta. Dá vontade de ficar parado e apreciar aquilo... Não
dá para tirar fotografias, porque o movimento não
fica na foto, mas eu depois tento qualquer coisa.
Decide ir dar uma volta e ver se a Ponte da Golden
Gate estava à maneira para descarregar mais umas fotos,
mas o nevoeiro estava tão denso que nem se via a ponte e
decidi ir passear para Marin Headlands.
Marin Headlands é a zona do parque da Golden
Gate que fica mais próximo de São Francisco e é uma área
preservada de nidificação de aves.
Segui a estrada que liga a ponte ao farol de Point
Bonita. De repente umas estruturas em cimento chamaram-me à atenção
e parei. Eram edifícios militares que em tempos sustentaram
canhões que defendiam a entrada da baía das forças
invasoras. A maioria das estruturas eram do tempo da Segunda Guerra
Mundial, mas foram desmanteladas ou nunca foram usadas porque os
japoneses nunca se aventuraram por estes lados. Haviam dois grandes
buracos no monte onde num existiu um canhão de defesa descomunal
e no outro nunca existiu nada, porque quando o canhão chegou
já a guerra estava quase no fim. Parecia uma história à portuguesa.
Haviam vários postos de vigia, a maioria
destruídos e cheios de ferrugem. Estes tipos que tanto se
preocupam com o ambiente depois deixam aquelas estruturas de ferro
e às vezes com chumbo, assim à chuva e ao ambiente
corrosivo do mar numa zona de nidificação de aves.
Para além dos buracos dos canhões, existe uma base
de mísseis terra-mar (julgo), também desactivada,
mas onde ainda se vê os radares e os mísseis... Pequenos
por sinal. E uma estrutura de suporte de morteiros...
Agora imaginem andar a passear por esta zona de
manga curta e sandálias. Sim porque em minha casa e no escritório
estava calor, mas ali e com aquele nevoeiro denso e quase a chover
e sem ver viva alma. A qualquer esquina podia aparecer um fantasma
de um qualquer soldado que por amores se suicidou naqueles desfiladeiros
e tentar assustar-me... Mas não, o mais que me aconteceu
foi ter frio.
Quando finalmente cheguei a Point Bonitas o acesso
ao farol estava vedado e um sinal dizia para ir até um ponto
mais a oeste e ver de lá o farol. Bem, a treta não
era a mesma, mas a vista era espectacular. Era um miradouro virado
ao pacífico numa encosta uns 50 ou mais metros do nível
da água. Em frente uma ilha de pedra castanha, mas que as
centenas de pelicanos que a habitam resolveram dar uma cor mais
clara e pintá-la de branco, a cor dos seus excrementos. À esquerda
as escarpas contínuas da costa com o farol a esconder-se
por detrás do nevoeiro e suspenso na ponta mais longe da
costa. À direita a lagoa de Marin Headlands e as casas da
colónia de férias e do Ranger, na praia que também
desaparecia com o nevoeiro e que contrastava com o colorido das
flores que cobriam o monte.
Um sinal avisava para os perigos de quem atravessasse
para o outro lado da vedação e se quisesse aproximar
da Birds Island, para além de avisar do incómodo
que isso poderia representar para as aves. Bem, mas acham que eu
na minha pequenez ia alguma vez incomodar uma colónia de
centenas de pelicanos quase tão grandes como eu e além
disso o caminho até lá estava bem visível
e aparentemente não representava perigo. Fui até lá...
Não fosse o frio e tinha ficado ali sentado
a apreciar a calma do mar a bater contra as rochas. Não
haviam as normais chatas das gaivotas, talvez afugentadas pelos
pelicanos e o facto de estar frio também deve ter afugentado
os humanos, que mais inteligentes que eu, souberam não ir
para ali. Ou talvez não... Não fossem tão
inteligentes, porque aquele lugar é espectacular. Tenho
que voltar sem nevoeiro, para ver se não foi ele que deu
um ar nostálgico ao lugar.
Desci a Marin Headlands e até à praia.
O centro de recepção do parque é uma antiga
igreja, daquelas que se vê em todos os filmes de cowboys
com uma torre em forma de lança muito esguia e comprida.
Uma igreja dos puritanos, os que povoaram os Estados Unidos.
Junto à praia a lagoa desagua na praia e
há aves por todo lado. Mas estava a ficar demasiado frio
e o rolo de fotografias acabou.
Decidi voltar para casa, pois estava a escurecer.
A estrada que vai dali para Sausalito passa por um túnel
com cerca de um quilómetro, que só permite a passagem
de carros num sentido de cada vez e que em cada lado tem um semáforo,
que indica que só muda de 5 em 5 minutos. Eu fiz o túnel
a descer e fiquei com vontade de lá voltar de bicicleta
e com a máquina fotográfica com rolo e um tripé...
Quando cheguei a casa e depois de jantar, resolvi
rapar a barba. Sim! Acabei com a pêra que usava há quase
dois anos. Fartei-me! Mas, quando a rapava deixei o bigode para
o fim e arrependi-me de não rapar aquilo só na sexta,
porque podia ir à festa do Jorge e João de bigode.
Ficava muito mais condizente com o tema da festa, Disco e Flower
Power... Mas, agora, tinha que andar dois dias só de bigode
para ir à festa e eu detesto bigodes... Rapei tudo!
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