Este é o fim de semana das comemorações
do Orgulho Gay em São Francisco. Mas aqui como todos têm
direitos iguais, a parada de domingo chama-se Gay, Lesbian, Bi
and Trans Pride Parade. Ainda bem que não existe o dia das
comunidades residentes nos Estados Unidos, porque senão
iria ser uma confusão. E já agora, porque é que
os Gays estão primeiro que as Lésbicas? E estas antes
dos bissexuais, que por sua vez estão antes dos transexuais?
Será que é por ordem de número de filiados
na associação? Realmente vêem-se mais gays,
mas e daí?... As lésbicas também têm
os mesmos direitos e os transexuais, que foram a Paris e vieram
homens diferentes, não têm os mesmos direitos que
os outros? Ahm? Isto já parece a história do leite
que se chama meio-gordo e devia de se chamar meio-magro...
Mas isso não interessa, a verdade é que é o
fim-de-semana mais colorido da cidade e para comemorar isso e o
facto de termos entregue o trabalho do ICEP, esta semana, e que
nos privou da convivência mútua durante algumas semanas,
iremos ter uma festa em casa do João e do Jorge. Se ainda
se lembram a última festa foi um sucesso e esta promete,
pois temos que ir vestidos a condizer com a época Disco
ou do verão do amor... Ou seja, as épocas mais kitch
e coloridas da nossa história recente. Pelo entusiasmo que
tenho visto vai ser um sucesso.
Fiquem atentos às próximas crónicas
e fotografias.
Mas no entretanto vou-vos contar como é que
foram os primeiros dias em Los Angeles, mais propriamente em Anaheim,
Orange County.
Segunda-feira, 12 de Junho de 2000
Depois de ter dormido apenas umas horitas de sábado
para domingo e de me ter deitado um bocado tarde na noite anterior,
acordei às 7h da manhã pois o meu voo era muito cedo.
O Pedro levou-me ao aeroporto depois de deixar a
Júlia em South San Francisco. Obrigado Júlia e Pedro
por tudo.
Quando entrei no aeroporto faltavam cerca de 40
minutos para o meu voo e a fila no check-in da American Airlines,
a companhia pela qual eu ia viajar, assustava o mais calmo dos
calmos. Digamos que pelo andar da carruagem eu iria apanhar o voo...
no ar.
Andava ali aos papéis a ver o que havia de
fazer e um tipo que estava a pedir, ali ao lado, no guichet reservado
a instituições de caridade e sem fins lucrativos,
que existe em vários sítios no aeroporto, chamou-me.
A minha primeira reacção foi de dizer que não
e ir na direcção contrária, porque estava
cheio de pressa, mas ele insistiu e disse que me podia ajudar.
Lá fui ouvir o que ele tinha para dizer. Ele lá me
explicou que andava a pedir para uma casa que ajudava órfãos
e meninos de rua e que ele próprio tinha sido criado naquela
instituição. E eu lá lhe expliquei que o meu
ordenado era muito baixo e que não podia colaborar com ele,
porque aliás só tinha notas de $20 e não lhe
ia dar dois dias do meu trabalho. Ele compreendeu e disse-me baixinho
que havia um check-in na parte de fora do aeroporto e que ninguém
o usava porque ninguém sabia... E pelos vistos, a maioria,
iam continuar sem saber.
Fiz o check-in em dois minutos, pois à minha
frente estava apenas uma senhora. No fim do check-in e como não
dei gorjeta ao tipo ainda ouvi um obrigado com maus modos. Só me
apeteceu lhe dizer que com aqueles modos não levava gorjeta,
mas não me quis chatear.
Entrei no avião 10 minutos antes dele partir.
Nos Estados Unidos os aviões são mais ou menos como
os nossos comboios. As pessoas viajam tanto de avião que
existem tantos voos como comboios e a horários fixos. Aliás
pode-se comprar bilhete na hora, sem reservas, e na maioria das
vezes sem problemas. E se não se apanhar um avião,
provavelmente tem-se outro nesse mesmo dia e para o mesmo destino.
Mas às vezes existem alguns tipos mais apressados e é normal
ouvir-se nos aeroportos a pedirem para disponibilizar lugares em
certos voos e a oferecer dinheiro e outros bilhetes por eles. Mas
no meu voo não houve esse problema, porque até ia
meio vazio, o que me permitiu ir à janela do lado virado
a terra, às praias e às montanhas.
A vista era demais. Levantámos voo em direcção
a norte e o avião virou a Sul sobre o mar a Oeste de São
Francisco. Via-se a cidade e Silicon Valley... Aquilo é mesmo
plano e, do ar, parece que tem uma textura uniforme, com as ruas
todas paralelas e perpendiculares. Depois foi seguir a costa até Santa
Bárbara em que deixei de ver o mar porque sobrevoamos terra
e porque apareceram umas nuvens, que só desapareceram já muito
próximo de Los Angeles. É impressionante ver as montanhas
do ar. Já tinha visto, mas nunca tinha lhe dado tanta importância.
Parece um bocado de papel que foi amarrotado e os caminhos pelos
picos só me faziam lembrar a Lousã e a minha Vaynessa,
coitada, que estava fechada nos arrumos da cave.
Apesar de o voo estar meio vazio eu tinha uma companheira
de viagem de meia idade e que lia uma pilha de papéis sobre
umas patentes a ver com redes LAN e WAN. Assim que começamos
a chegar ela parou de ler e começou a conversar. Aparentemente
era advogada de Boston e estava em Los Angeles por causa de umas
reuniões de negócios, depois de ter passado o fim
de semana em São Francisco em casa de uma amiga. Perguntou-me
se eu era italiano, por causa do sotaque, porque o marido era italiano
e tinha o mesmo sotaque. Foi a primeira vez que me confundiram
com italianos nessa semana.
Los Angeles estava coberto com um nevoeiro meio
poluído ou de uma poluição meio nevoeiro,
como queiram. Não vi muito da cidade. Ainda tentei ver se
via o monte onde está escrito Hollywood, mas nada. Só casas
e mais casas e ruas e autoestradas até perder de vista.
A praia parecia calminha e de cima parecia agradável porque
aliás estava sol. Mas... Haviam poços de extracção
de petróleo na baía. Poça! Com tantas séries
e filmes sobre Los Angeles, como é que nunca tinha reparado
naquilo. Bem, se calhar sempre esconderam, mas não eram
um ou dois, eram para aí uns sete ou oito, que eu visse.
Uma hora e 20 minutos depois de ter partido de São
Francisco, aterrei no aeroporto John Wayne e à saída
lá estava uma estátua do actor/cowboy mais conhecido
do mundo. Apanhei uma camioneta, daquelas que vai até aos
hotéis todos deixar as pessoas e fui directo para o meu
hotel. Bem, era mais um Inn, que é a categoria abaixo, mas
não faz mal. Ainda parámos no Disneyland Hotel e
mais num a deixar uns passageiros, mas por volta das 2h estava
a fazer o check-in no Hotel.
Cheguei ao balcão e a tipa perguntou-me o último
nome, uma vez que já tinha reserva. Eu disse que o meu nome
era Gonçalves, mas que devia de estar como Goncalves. Ela
ficou surpresa e perguntou-me de onde era com esse nome. Ela era
brasileira e o resto do check-in foi feito em português,
e já tinha todas as facilidades à minha disposição.
Maravilha, país irmão! Os brasileiros aqui é mais
ou menos como os portugueses em França, Suiça e Luxemburgo,
fazem os trabalhos de limpeza, cozinha e recepção
e aqueles que os americanos não querem fazer e não
deixam os mexicanos fazer.
Bem, mas nem todas as facilidades foram concedidas,
porque só tinha o quarto pago até sábado,
ou seja, como tinha voo de volta no domingo, tinha que arranjar
um sítio para ficar no sábado à noite. Mas
porque é que eu disse que queria voltar no domigo? Se calhar
eles pensavam que como era escolha minha voltar no domingo, não
tinham nada que me pagar essa noite extra, uma vez que a exibição
acabava no sábado à tarde. E aquele hotel, decididamente,
não era o mais indicado, porque o meu quarto custava $96,
no sábado à noite.
Deixei a mala no quarto e fui para o Convention
Center, que ficava a cerca de um quilómetro e meio do hotel.
Estava um tal calor, que depois de andar cem metros já estava
a suar. Mas, agradou-me o facto de haver mais hotéis naquela
rua que em Aveiro inteiro, mas também do outro lado da rua
dos hotéis era a Disneyland, imaginem vocês. Lá estava
uma montanha russa com o Mickey, uma montanha artificial em forma
de lobo e o mono-carril, e miúdos por todo o lado. A média
de idades na zona devia rondar os 13 anos, isto porque muitos dos
miúdos viajavam com os avós que contrabalançavam
a coisa.
Almocei um Burrito e Taco Combo, numa tasca mexicana
que ficava num pequeno centro comercial de comida rápida,
mesmo a meio caminho entre o hotel e o Convention Center, que passou
a ser um dos pontos mais visitados durante a minha estadia em Anaheim.
Cheguei ao stand da ComView quase às 4h da
tarde, depois de me ter registado como expositor na recepção
do Convention Center. A ComView é a empresa com quem a EAI
tem um acordo de colaboração, porque eles fazem uns écrans
e monitores gigantes que são o ideal para a visualização
das apresentações realizadas com o VisConcept. Era
a empresa com quem eu iria trabalhar na semana seguinte.
A ComView é uma empresa israelita e como
seria de esperar a maioria dos empregados são israelitas,
exceptuando os empregados dos escritórios no Estados Unidos.
Quando cheguei ao stand tive uma primeira visão do que seria
o resto da semana. Cerca de quinze israelitas, todos a falar hebreu
entre eles e preocupados em montar e sintonizar os seus sistemas
de projecção. Apenas um, o Michael, foi capaz
de ter a simpatia de se preocupar com a minha presença e
pôr-me à vontade.
O Michael, mostrou-me o que aparentava ser o futuro
stand, onde estava o sistema da Silicon Graphics que eu iria usar
e onde estava a água fresca, porque se estava calor na rua,
ali dentro do pavilhão de exposições com o
ar condicionado desligado e com as portas abertas, a deixar entrar
o calor, estava uma brasa que não se podia sobreviver.
O tipo da Silicon Graphics ainda não tinha
aparecido e eu como não queria estar a mexer na máquina
deles, sentei-me a um canto com o meu portátil a escrever-vos
umas crónicas e a preparar o trabalho temático para
o ICEP.
Um dos israelitas usava um daqueles panos na nuca
próprios da religião judaica, mas entre eles era
o único. Todos eles andavam às voltas com a sintonização
de cores nos sistemas e com o acerto dos monitores.
Haviam quatro sistemas de projecção
montados. O do lado esquerdo do stand era um sistema de projecção
frontal com seis projectores Sony, que projectavam uma imagem com
cerca de 6x8 metros, num enorme écran curvo tipo cinema
e que tinha uma qualidade impressionante. Mas o mais impressionante
era ver como não se notava a transição das
imagens projectadas pelos projectores adjacentes, e como uma imagem
dividida em seis partes e projectada por seis projectores diferentes
parecia tão perfeita. Principalmente a imagem de Machu Pichu,
a cidade Inca.
Depois havia o sistema onde eu ia projectar o VisConcept
que era formado por 12 écrans (quatro colunas e três
linhas) de retroprojecção contíguos e que
não tinham qualquer tipo de espaço entre eles o que
dava a impressão de ser um écran enorme com 4x6 metros
e com qualidade VGA. A qualidade não era nada de especial,
mas a enormidade do sistema e o preço faziam da coisa uma
coisa bastante boa.
Depois havia um sistema em fase de projecto que
consiste em três monitores lado a lado, com uma pequena curvatura,
principalmente para uso por projectistas e arquitectos, que dá uma
imagem ampla e larga dos projectos.
E por último um sistema igual ao que eu ia
usar, mas com apenas 6 monitores e com qualidade XGA, mas que também
estava em fase de projecto, mas que dava um efeito fantástico
com a transmissão dos resultados dos Lakers... Embora atrasados!
No entretanto chegou o tipo da Silicon Graphics
(SGI). O tipo suava como se fosse uma fonte e segundo ele tinha
demorado uma hora e meia desde o escritório até ali,
sem trânsito, porque o escritório ficava do outro
lado da cidade. Sim! Los Angeles deve ter uma frente de costa de
cerca de 60 e tal quilómetros ou mais, e eu que estava no
perímetro da cidade estava a cerca de uma hora do centro,
pela autoestrada.
Não conheci muitos mais israelitas naquela
tarde, pois passei o tempo quase todo a tentar configurar o sistema
com o tipo da SGI, que percebia tanto daquilo como eu... Bem, um
bocadinho mais, mas tive a ver os manuais com ele e tudo... Estes
tipos não sabem o que é desenrascar. É impressionante!
Mas os israelitas sabem, como eu fiquei a saber e em muitas coisas
fizeram-me lembrar o bom sangue de quem é da zona mediterrânica
e quem programa pouco e se desenrasca em situações
difíceis. Os americanos têm muita dificuldade em sair
de situações difíceis... Não têm
instruções explicitas e perdem-se.
Ao fim da tarde e quando o tipo da SGI se foi embora,
eu fui para hotel. Estava estirado e deitei-me na cama a descansar
um bocado. Estava a pensar ir dar um mergulho à piscina,
mas só acordei com o telefonema do Michael a dizer-me que
podia ir passear de manhã porque o tipo da SGI não
ia aparecer.
No entretanto como a SGI tinha mudado a máquina
que supostamente iria enviar e como o número da máquina
era diferente, tive que pedir uma nova licença para o VisConcept.
Mas a minha ligação à Internet do hotel não
estava a funcionar. O modem simplesmente não respondia ao
sinal dado pelo modem do outro lado da linha e tive que ligar para
o meu número em São Francisco. Era trabalho e quem
pagava era a empresa, por isso... Mas os meus amiguinhos em São
Francisco resolveram tirar a tarde para mandar mails e tinha a
caixa cheia. Acho que demorei um bocado mais do que previa a fazer
o download do meu mail.
Resolvi ir jantar, mas nas redondezas e para além
do tal centro comercial de comida a cerca de 800 metros, e que
aquela hora era muito longe, só tinha o MacDonalds e afins.
Acabei por ir jantar a um restaurante, afinal quem pagava não
era eu. Mais um daqueles restaurantes americanos com comidas e
molhos que ninguém para além dos americanos se lembraria
de fazer.
Mas antes disso, ainda tive tempo de presenciar
o magnifico fogo de artifício da Disneyland, que pelos vistos
se repete todas as noites por volta das 9h. Quem esteve no dia
do encerramento da EXPO'98, sabe que aquilo ali é uma pequena
demonstração de fogo de artifício... Mesmo
na EXPO nos dias normais se via melhor, mas pelo menos vi algo
que já não via há algum tempo e que é raro
nos Estados Unidos, com as paranóias que eles têm
com o fogo.
Depois de jantar, voltei para o quarto e deitei-me,
mas como tinha dormido à tarde e como estava muito calor,
custou a adormecer.
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