Segunda-feira, 29 de Maio de 2000
Memorial Day. O primeiro feriado verdadeiro que
celebro desde que estou nos Estados Unidos. Na terra onde quase
metade da população lutou numa guerra, o dia em que
se celebra à memória dos bravos combatentes mortos
em acção é um dia de comemorações
nacionais. Para mim, foi uma manhã em que dormi mais um
bocadinho e acordei com o Jesse a trazer-me o café à tenda.
Ele tinha proposto que alguém o fizesse e
tirámos à sorte quem seria o felizardo. E, nestas
coisas, eu não costumo perder e costuma perder quem sugere...
Calhou-lhe a ele.
Bem vindo à América dos produtos embalados
prontos a serem misturados com água e comidos. O café era
mesmo desses, ao que o Jesse misturou half & half, que é uma
espécie de leite com natas com sabor a baunilha e com açúcar.
Depois ainda lhe acrescentou mais açúcar... Estão
a imaginar o que tive de beber logo pela manhã.
Depois passámos à Oatmeal, que é como
quem diz papas de aveia. Antes fossem. Aquecer água na mesma
panela em que se fez o raviolli do dia anterior e que foi lavada
só com água, já impressionava muita gente,
mas pelos vistos não ao Jesse e ao Derren. Depois, misturar
umas papas de aveia com diferentes sabores e comer, é que
poderia dar a volta ao estômago de muitos... Mas eu já que
estava num fim-de-semana à americana tinha que embarcar
nas mesmas opções dos outros, principalmente porque
não tinha trazido nada para comer.
Desmontámos o acampamento e fomo-nos embora
do parque. Apanhámos a estrada secundária em direcção
a Norte... Pensavam eles, mas estávamos a ir para Sul. Queriam
encontrar um sítio em que houvesse pouca ou mesmo nenhuma
gente a fazer barulho e onde pudessem dar uns mergulhos. Mas para
Sul estávamos a ir para a nascente do rio o que queria dizer
menos profundidade.
Mas, a estrada era espectacular. As sequóias
eram descomunalmente grandes. Estávamos na estrada que por
ali chamam de Avenue of the Giants e realmente era... Paguei eu
para ir a Muir Woods e ali as sequóias eram muito maiores...
Mas também estavam bem mais longe de Corte Madera.
A dada altura e depois de alguma discussão,
lá consegui provar que estávamos a ir para Sul e
que tínhamos decidido ir para Norte até à junção
com o verdadeiro Eel River. Demos meia volta e parámos junto
a uma Sequóia que estava caída junto à estrada.
Por aqui, quando uma árvore cai, apenas se corta a parte
da árvore que realmente incomoda a mobilidade das pessoas,
o resto é deixado como se a natureza não tivesse
sido alterada. E esta árvore que deve ter bloqueado a estrada
quando caiu, era mais alta que o Jeep Cherokee de um tipo que me
pediu para lhe tirar uma foto... Imaginem onde? Dentro do tronco...
O tronco da árvore estava oco junto da raiz (por isso ela
deve ter caído) e cabia lá uma pessoa de pé...
Aliás podia-se dormir lá dentro. Depois eu mando
as fotos, quando revelar...
Seguimos para Norte, mas com a condição,
que se não encontrássemos um sítio bom a menos
de 5 milhas da junção do South Fork com o Eel River,
que voltávamos para trás. E assim aconteceu... Apanhámos
a 101 e fomos para Sul, depois de umas voltas perto do rio, mas
sem sucesso.
O Jesse dizia conhecer um sítio porreiro
para darem uns mergulhos e fomos para lá. Era num outro
parque que não me lembra o nome, mas estes tipos têm
mais parques naturais do que zonas habitacionais... Não
vejo mal nenhum, mas não dá para decorar tudo.
Chegámos à porta do parque e como é costumo
há que pagar, mas o Jesse armado em delinquente disse que
se tinha enganado e que ia dar a volta. Entrámos, claro
que não demos nenhuma volta e fomos para o rio. E o carro
ficou estacionado num local proibido. O Jesse estava a abusar,
mas eu não tinha nada a ver com isso.
Quando estávamos a fazer o barbecue e a nadar
no rio, apareceu um ranger a perguntar de quem era um camião
verde que estava estacionado na estrada... E lá foi o Jesse
tirar o trambolho para o parque de estacionamento, mas ninguém
disse nada acerca de não termos pago a entrada.
Esta é outra das coisas que não percebo
nos americanos. As pessoas têm que pagar, mas ninguém
se importa muito se não pagarem... E as maneiras de não
pagar são mais que muitas, para quem tem uma mentalidade
de fuga ao pagamento, de seja o que for, como os portugueses. Eu
desconfio que os mexicanos aqui não pagam nada...
O Jesse e o Darren lá andaram a mergulhar
lá de um penhasco e eu a tirar fotos. Para apanhar o rio
e as sequóias tive que usar a máquina na vertical
porque senão as árvores ficavam cortadas.
Ao fim de algum tempo, voltou a brisa e decidimos
pormo-nos a caminho de casa.
Ainda parámos a meio do caminho para meter
gasolina e comer um gelado. E fomos comer um gelado a uma verdadeira
geladaria saída de um road movie americano. Eu não
sei explicar que tipo de estabelecimento comercial é que
era... Chamei-lhe geladaria, porque vendia gelados, mas... Também
podia ser uma biblioteca, porque tinha uma secção
de livros usados disponíveis para leitura e até tinha
uma mesa para as pessoas se sentarem a fazê-lo... Mas, também
podia ser uma mercearia, porque vendia os ingredientes mínimos
para cozinhar... Mas, porque também tinha uma mesa de bilhar,
podia ser um bar e pelo facto de vender artesanato, podia ser uma
loja de artesanato? Isto tudo no mesmo estabelecimento, em madeira
na berma da estrada e onde se podia ouvir os Grateful Dead e ser
atendido por uma senhora de idade que de certeza esteve em Woodstock
e que ainda hoje sofre alguns dos efeitos retardados do que fumou
por lá. A América profunda.
Depois continuamos na 101 para sul. Passámos
em Laytonville, que pelo nome deve ser a terra dos leitões
cá do sítio, mas não vi nenhum Pedro dos Leitões,
ou coisa parecida. Mas passámos por várias tabuletas
que indicavam reservas índias, mas nenhum dos meus companheiros
se mostrou muito interessado em ir visitar esses últimos
redutos dos povos americanos oprimidos. Vejam lá vocês,
que os únicos sítios na Califórnia onde é possível
haver jogo é nas reservas índias... Uma compensação
pelo facto de os terem fechado em áreas onde não
podem desenvolver o seu orgulho guerreiro. E depois ainda dizem
que os índios são selvagens.
Ainda vi pelo caminho uma estrutura que parecia
uma cápsula de um foguetão, mas que bem podia ser
uma versão de uma tenda de índios, porque não
consegui reparar bem. Mas, não acredito que depositassem
uma cápsula de entrada na atmosfera, junto a um rio e abandonada.
Mas aqui tudo é possível como na ilha do Ghalighan.
Chegámos a Petaluma cerca das 6h da tarde.
O Darren fugiu logo, pois a namorada estava à espera e o
Jesse foi dar um beijinho ao filho... Eu voltei sozinho para Corte
Madera.
Ainda parei numa loja de material de montanha, aqui
perto, que estava em saldos... E quem é que encontro lá?
O Darren com a namorada... Pelos vistos o jovem ficou com vontade
de voltar a acampar.
Fui para casa, tomei banho, fiz o jantar e deitei-me...
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