Segunda-feira, 1 de Maio de 2000
Acordei com o despertador da Rita. Apesar de eu
só ir trabalhar mais tarde, resolvemos (eu e o Tiago) acordar
cedo, para aproveitarmos esse facto e irmos os dois passear pela
cidade.
Levantamo-nos depois de toda a gente ter saído,
para ir trabalhar. Tomámos o pequeno-almoço, arrumámos
as mochilas e fomos passear.
Resolvi levar o Tiago a ver a zona que mais visitei
desde que estou em São Francisco. O fim de Haight St. ou
Haight com Ashburry, a zona dos hippies.
Apanhámos o autocarro em Van Ness, mudámos
na Market e em meia hora estávamos no centro das tatuagens,
piercings, roupa usada, incenso e comidas vegetarianas e de caracteres
esquisitos. O mundo hippie... Mas como verdadeiros hippies, dormem
até tarde e aquela hora só estavam abertas as lojas
maiores.
Andámos mesmo até ao fim de Haight,
e fomos à Amoeba, só para que ele visse como é possível
meter tanto CD e Vinil no mesmo sítio... Depois voltámos
para trás, a ver as montras, uma vez que ainda estava tudo
fechado.
Entrámos na Crossroads Trading Co., a loja
de roupa usada que eu mais gosto e onde a Cláudia vendeu
uma saia velha da Mango (que aqui é luxo) e onde eu tinha
um cheque em compras para levantar. O Tiago também queria
comprar uma T-Shirt porque a roupa que tinha trazido do México
estava a chegar ao fim e ele ainda tinha umas horas de viagem de
volta.
A loja estava deserta. O que é bom, uma vez
que se pode vasculhar a roupa à vontade. Ali ficámos
a experimentar T-Shirts, sweatshirts e afins durante um bom bocado.
O Tiago já estava comigo, se gastasse dinheiro em roupa
era ali que se vestia... Acabou por comprar três T-Shirts
de manga comprida e eu uma T-Shirt cor de vinho com um boneco na
frente muito gira...
Depois de pagarmos, despimos a T-Shirt que traziamos
e vestimos as novas... A empregada nem ligou, já devia de
ser normal.
Chegou a hora de me despedir e fomos para a paragem...
Até que reparei que podia ir com ele até Market e
aí apanhar o autocarro directo para o escritório
em vez de andar a mudar na Golden Gate. Ele tinha combinado ir
almoçar com a Mónica ao emprego dela, que fica na
3rd St. mesmo no centro.
Quando chegámos à Market, despedimo-nos
a correr com até Agosto e eu segui para a paragem da minha
camioneta e ela para o escritório da Mónica.
De volta ao mundo do trabalho. Quando entrei no
escritório tinha um bilhete do Ian (chefe da equipa do VisConcept)
para o contactar assim que chegasse. Nem tomei café e fui
falar com ele... Pelos vistos o Ken tinha deixado ordens para adiar
o envio do software e eu tinha que provar que aquilo não
podia ir para a frente.
Ok! Simples, levei-o e mostrei-lhe a apresentação
que o Ken fez e mostrei que a mudança de cor dos materiais
não funcionavam, ou funcionavam mal. Ele já sabia!
Mostrei-lhe que a mudança de cenas tinha problemas. Era
erro do Ken, mas de qualquer maneira podia ter uma janela de aviso!
Mostrei-lhe que a conjunção de dois movimentos, do
mesmo objecto, em eixos diferentes dava uma reacção
esquisita. Ele disse que era um problema de arquitectura e que
não iam mudar aquilo, agora! Mostrei-lhe que dois movimentos
seguidos aplicados aomesmo objecto provocavam efeitos esquisitos.
Mesma desculpa! Ok! Ele é que sabe, fiz o meu papel... Mas
isto nem me parecia verdade. Acho que o tipo é calmo demais...
Voltei às minhas funções de
teste. Entreguei uma lista de testes de persistência de propriedades
com alguns problemas. Deram-me uma nova versão para testar
em que alguns desses bugs já estavam corrigidos... Mesmo
assim, ainda apanhei alguns e entreguei a nova lista de persistência
e uma lista de bugs.
Desisti e fui para casa. Pedi boleia ao Jesse, mas
ele saia muito cedo e fui com o Ben.
Eu, a Mónica, Rita e o Ben tínhamos
combinado ir ver uma banda de DJs na quarta (Smith & Mighty)
e o Ben como tinha um encontro essa noite em São Francisco,
ficou de comprar os bilhetes.
Jantei, respondi a uns mails e fui dormir. Espero
que o vosso feriado tenha sido melhor que o meu dia de trabalho.
Frustante!!!
Terça-Feira, 2 de Maio de 2000
Cheguei ao escritório cedo, para compensar
um bocado a falha do dia anterior e para compensar o facto de querer
sair mais cedo para ir a São Francisco. Queria ir ver "As
Bodas de Deus" do João de César Monteiro que passava
no Festival Internacional de Cinema de São Francisco.
O Ben não tinha sequer tentado comprar os
bilhetes para o tal concerto do dia seguinte. Ou seja, resolvi
sair ainda mais cedo, para ir comprar os bilhetes. Já falhei
dois concertos, desde que aqui estou, porque não comprei
bilhetes mais cedo, e além disso no próprio dia eram
mais uns dólares, que não me apetecia gastar.
Saí às 5h da tarde e fui apanhar a
camioneta a Marin City, que perdi... Fui dar uma volta e quando
voltei, vi a segunda camioneta a sair... Apanhei outra que vinha
logo a seguir, mas que ia para outra zona. Mas depois dentro da
cidade safava-me.
Pois! Estive UMA hora à espera de um autocarro
do Muni que me levasse do Presidio, na zona da Lombard, para Haight.
Se eu soubesse mais cedo, onde se vendiam os bilhetes tinha os
comprado na segunda, quando lá fui com o Tiago.
Quando cheguei a Haight já a loja estava
fechada. A loja que vendia os bilhetes chama-se "Behind the Post
Office", lindo nome para uma loja de criadores de roupa de mulher.
Resolvi ir tentar o outro ponto de venda, e que eu já conhecia. É uma
loja de CDs e vinil usados em Divisadero chamada "Open Minded Music" e
que sabia estar aberta até às 9h da noite.
Apanhei um autocarro. Quando lá cheguei,
disseram-me que não tinham bilhetes, mas que também
era normal não terem, porque os tipos que organizam o concerto às
vezes mandam, outras não. Resolvi ir até ao "Justice
League", o sítio onde iria decorrer o concerto, e que ficava
apenas a uns dois quarteirões dali.
Cartazes, nada. Gente à porta, nada. Campainha,
nada. Desisti! Já estava atrasado.
Tinha combinado às 8h30m estar à porta
do cinema, porque o filme estava esgotado, mas existem sempre uns
bilhetes de última hora e tinha que se estar na fila uns
45 minutos antes à espera, para garantir que arranjávamos
bilhete.
Era no AMC. Mas eu pensava que era no AMC em Van
Ness, perto de casa da RM&P, e resolvi ir lá deixar
a mochila. Trazia o saco-cama e roupa, porque ia dormir lá.
Saí em Market, porque estava muito trânsito.
Subi a Van Ness a pé e cheguei ao AMC, à hora combinada,
ainda com a mochila... E apercebi-me que era no AMC do Japan Center...
A palavra Kabuki (nome do AMC do Japan Center) apareceu-me de repente
do subconsciente, como se eu soubesse desde sempre que era lá que
tinha combinado...
Perdido por cem, perdido por mil. Fui pousar a mochila
a casa da RM&P, a correr. A campainha não estava ocupada,
porreiro. Subi, pousei a mochila e desci no mesmo elevador. A Rita
ainda quis que eu comesse alguma coisa, mas eu tinha combinado
uma hora e detesto chegar atrasado.
Fui apanhar o autocarro 38, na Geary, para andar
4 quarteirões até ao Japan Center, só numa
de tentar a sorte. Ainda estava a usar o mesmo bilhete que me deram
no primeiro Muni que tinha apanhado, quase 2h30m antes. Os bilhetes
do Muni podem ser usados mais que uma vez até à hora
que esta marcada no bilhete e como quem marca o bilhete é o
condutor ao rasgar o bilhete às vezes o bilhete pode durar
durante quase 4h. Porém pode ser recolhido na segunda viagem,
coisa que nunca vi acontecer... Era suposto as pessoas não
mudarem de autocarro mais que duas vezes, mas não me venham
com tretas...
O autocarro não vinha e resolvi ir andando
de paragem em paragem, na direcção do Japan Center.
Quando cheguei ao AMC, eram 8h45m e não tinha passado nenhum
autocarro. E digo-vos que para chegar da Van Ness até ao
Japan Center, têm que se subir o Cathedral Hill... Que sem
jantar é uma maravilha.
A Mafalda e a Helena Franco já tinham bilhete,
a Helena Brito comprou um a uma pessoa que lá apareceu,
que tinha bilhete mas não podia ir. A Gilda (a secretária
do ICEP em São Francisco) e o seu marido Russo, também
já tinham bilhete... Ou seja, só eu e a Mariana é que
não tínhamos, e também éramos os únicos
que não tinham jantado.
Eu consegui que a Helena Brito tomasse o meu lugar
enquanto ia comer, e a Mariana pediu à Mafalda o mesmo.
Faltavam 15m para o começo do filme. Comprámos umas
fatias de pizza que levámos para dentro do cinema... Porque
quando voltámos, já havia bilhetes para todos. O
meu até foi de borla, porque apareceu lá um tipo
que não podia ir e que ofereceu o bilhete à Helena
Brito, para mim. Obrigado Helena.
Ficámos todos espalhados pela sala e em sítios
esquisitos. Eu fiquei na quarta ou quinta fila, do lado esquerdo
do écran, a comer a minha fatia de pizza, antes que o filme
começasse. Não gosto que os outros comam, quando
estou a ver um filme, e portanto não ia fazer o mesmo. O
tipo ao meu lado ficou com fome, ao ver-me comer, e perguntou-me
se aquelas fatias se vendiam no cinema, porque como caixa era tão
pequena adaptava-se perfeitamente ao local. Desculpas!!!
Depois de uma pequena introdução à obra
do João César Monteiro, feita, oralmente, por um
tipo, que tinha ar de crítico e jornalista de cinema, com
a típica mala a tiracolo, o filme começou.
Duas horas e meia de um verdadeiro filme português à velha
moda do cinema europeu. Eu imagino o que pensarão os americanos
dos portugueses depois de verem um filme em que o protagonista
colecciona pelos púbicos, serve-se abundantemente de comida
e nunca come, é um verdadeiro esqueleto andante e só diz
disparates e canta músicas ordinárias. Lindo!!!!
Mas até me babei quando vi entrar em cena
um magnífico cozido à portuguesa... E ainda fiquei
pior quando o João de Deus pergunta à freira, ao
servi-la "Farinheira?", ao que ela responde "Chouriço de
Sangue."... O momento mais marcante de todo o filme. Para vocês
parece gozo, mas a verdade é que não sei o que é nada
disso há quase 4 meses.
Acerca do filme. Passados uns dias sobre isso, penso
que é um filme português e que me orgulho de sabermos
fazer cinema assim. Não é cinema entretenimento e
longe de ser o tipo de cinema preferido dos portugueses, mas acho
que me deixou muitas coisas marcadas no subconsciente e que me
fez pensar bastante. Mas tem cenas que acho tristes, e que podiam
não estar lá.
O filme acabou à meia-noite. O marido da
Gilda estava completamente eufórico com o filme. Para ele
o filme era no mínimo esquisito... Mas não era para
ser assim? Aliás houve mesmo quem achasse que o filme era
demasiado esquisito e abandonasse a sala logo no início
do mesmo. Pronto, este cinema não é para todos, nem
para todos os dias.
Depois de uma pequena conversa. Eu e as Helenas,
apanhámos boleia da Mafalda, no seu fantástico mini-carro à americana
com cintos de segurança voadores... Sim! Quando ela liga
o carro, os cintos andam sozinhos e prendem as pessoas ao banco,
automaticamente. Parece um filme de terror. Só mesmo na
América.
Quando cheguei a casa da RM&P, ainda havia gente
acordada a trabalhar para o ICEP. Conversei um bocadinho, comi
qualquer coisa e fui dormir.
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