QUARTA-FEIRA, 10 DE MAIO DE 2000 C79
Haight Street Fair - Fotografia de Rui Gonçalves

Segunda-feira, 1 de Maio de 2000

Acordei com o despertador da Rita. Apesar de eu só ir trabalhar mais tarde, resolvemos (eu e o Tiago) acordar cedo, para aproveitarmos esse facto e irmos os dois passear pela cidade.

Levantamo-nos depois de toda a gente ter saído, para ir trabalhar. Tomámos o pequeno-almoço, arrumámos as mochilas e fomos passear.

Resolvi levar o Tiago a ver a zona que mais visitei desde que estou em São Francisco. O fim de Haight St. ou Haight com Ashburry, a zona dos hippies.

Apanhámos o autocarro em Van Ness, mudámos na Market e em meia hora estávamos no centro das tatuagens, piercings, roupa usada, incenso e comidas vegetarianas e de caracteres esquisitos. O mundo hippie... Mas como verdadeiros hippies, dormem até tarde e aquela hora só estavam abertas as lojas maiores.

Andámos mesmo até ao fim de Haight, e fomos à Amoeba, só para que ele visse como é possível meter tanto CD e Vinil no mesmo sítio... Depois voltámos para trás, a ver as montras, uma vez que ainda estava tudo fechado.

Entrámos na Crossroads Trading Co., a loja de roupa usada que eu mais gosto e onde a Cláudia vendeu uma saia velha da Mango (que aqui é luxo) e onde eu tinha um cheque em compras para levantar. O Tiago também queria comprar uma T-Shirt porque a roupa que tinha trazido do México estava a chegar ao fim e ele ainda tinha umas horas de viagem de volta.

A loja estava deserta. O que é bom, uma vez que se pode vasculhar a roupa à vontade. Ali ficámos a experimentar T-Shirts, sweatshirts e afins durante um bom bocado. O Tiago já estava comigo, se gastasse dinheiro em roupa era ali que se vestia... Acabou por comprar três T-Shirts de manga comprida e eu uma T-Shirt cor de vinho com um boneco na frente muito gira...

Depois de pagarmos, despimos a T-Shirt que traziamos e vestimos as novas... A empregada nem ligou, já devia de ser normal.

Chegou a hora de me despedir e fomos para a paragem... Até que reparei que podia ir com ele até Market e aí apanhar o autocarro directo para o escritório em vez de andar a mudar na Golden Gate. Ele tinha combinado ir almoçar com a Mónica ao emprego dela, que fica na 3rd St. mesmo no centro.

Quando chegámos à Market, despedimo-nos a correr com até Agosto e eu segui para a paragem da minha camioneta e ela para o escritório da Mónica.

De volta ao mundo do trabalho. Quando entrei no escritório tinha um bilhete do Ian (chefe da equipa do VisConcept) para o contactar assim que chegasse. Nem tomei café e fui falar com ele... Pelos vistos o Ken tinha deixado ordens para adiar o envio do software e eu tinha que provar que aquilo não podia ir para a frente.

Ok! Simples, levei-o e mostrei-lhe a apresentação que o Ken fez e mostrei que a mudança de cor dos materiais não funcionavam, ou funcionavam mal. Ele já sabia! Mostrei-lhe que a mudança de cenas tinha problemas. Era erro do Ken, mas de qualquer maneira podia ter uma janela de aviso! Mostrei-lhe que a conjunção de dois movimentos, do mesmo objecto, em eixos diferentes dava uma reacção esquisita. Ele disse que era um problema de arquitectura e que não iam mudar aquilo, agora! Mostrei-lhe que dois movimentos seguidos aplicados aomesmo objecto provocavam efeitos esquisitos. Mesma desculpa! Ok! Ele é que sabe, fiz o meu papel... Mas isto nem me parecia verdade. Acho que o tipo é calmo demais...

Voltei às minhas funções de teste. Entreguei uma lista de testes de persistência de propriedades com alguns problemas. Deram-me uma nova versão para testar em que alguns desses bugs já estavam corrigidos... Mesmo assim, ainda apanhei alguns e entreguei a nova lista de persistência e uma lista de bugs.

Desisti e fui para casa. Pedi boleia ao Jesse, mas ele saia muito cedo e fui com o Ben.

Eu, a Mónica, Rita e o Ben tínhamos combinado ir ver uma banda de DJs na quarta (Smith & Mighty) e o Ben como tinha um encontro essa noite em São Francisco, ficou de comprar os bilhetes.

Jantei, respondi a uns mails e fui dormir. Espero que o vosso feriado tenha sido melhor que o meu dia de trabalho. Frustante!!!

Terça-Feira, 2 de Maio de 2000

Cheguei ao escritório cedo, para compensar um bocado a falha do dia anterior e para compensar o facto de querer sair mais cedo para ir a São Francisco. Queria ir ver "As Bodas de Deus" do João de César Monteiro que passava no Festival Internacional de Cinema de São Francisco.

O Ben não tinha sequer tentado comprar os bilhetes para o tal concerto do dia seguinte. Ou seja, resolvi sair ainda mais cedo, para ir comprar os bilhetes. Já falhei dois concertos, desde que aqui estou, porque não comprei bilhetes mais cedo, e além disso no próprio dia eram mais uns dólares, que não me apetecia gastar.

Saí às 5h da tarde e fui apanhar a camioneta a Marin City, que perdi... Fui dar uma volta e quando voltei, vi a segunda camioneta a sair... Apanhei outra que vinha logo a seguir, mas que ia para outra zona. Mas depois dentro da cidade safava-me.

Pois! Estive UMA hora à espera de um autocarro do Muni que me levasse do Presidio, na zona da Lombard, para Haight. Se eu soubesse mais cedo, onde se vendiam os bilhetes tinha os comprado na segunda, quando lá fui com o Tiago.

Quando cheguei a Haight já a loja estava fechada. A loja que vendia os bilhetes chama-se "Behind the Post Office", lindo nome para uma loja de criadores de roupa de mulher. Resolvi ir tentar o outro ponto de venda, e que eu já conhecia. É uma loja de CDs e vinil usados em Divisadero chamada "Open Minded Music" e que sabia estar aberta até às 9h da noite.

Apanhei um autocarro. Quando lá cheguei, disseram-me que não tinham bilhetes, mas que também era normal não terem, porque os tipos que organizam o concerto às vezes mandam, outras não. Resolvi ir até ao "Justice League", o sítio onde iria decorrer o concerto, e que ficava apenas a uns dois quarteirões dali.

Cartazes, nada. Gente à porta, nada. Campainha, nada. Desisti! Já estava atrasado.

Tinha combinado às 8h30m estar à porta do cinema, porque o filme estava esgotado, mas existem sempre uns bilhetes de última hora e tinha que se estar na fila uns 45 minutos antes à espera, para garantir que arranjávamos bilhete.

Era no AMC. Mas eu pensava que era no AMC em Van Ness, perto de casa da RM&P, e resolvi ir lá deixar a mochila. Trazia o saco-cama e roupa, porque ia dormir lá.

Saí em Market, porque estava muito trânsito. Subi a Van Ness a pé e cheguei ao AMC, à hora combinada, ainda com a mochila... E apercebi-me que era no AMC do Japan Center... A palavra Kabuki (nome do AMC do Japan Center) apareceu-me de repente do subconsciente, como se eu soubesse desde sempre que era lá que tinha combinado...

Perdido por cem, perdido por mil. Fui pousar a mochila a casa da RM&P, a correr. A campainha não estava ocupada, porreiro. Subi, pousei a mochila e desci no mesmo elevador. A Rita ainda quis que eu comesse alguma coisa, mas eu tinha combinado uma hora e detesto chegar atrasado.

Fui apanhar o autocarro 38, na Geary, para andar 4 quarteirões até ao Japan Center, só numa de tentar a sorte. Ainda estava a usar o mesmo bilhete que me deram no primeiro Muni que tinha apanhado, quase 2h30m antes. Os bilhetes do Muni podem ser usados mais que uma vez até à hora que esta marcada no bilhete e como quem marca o bilhete é o condutor ao rasgar o bilhete às vezes o bilhete pode durar durante quase 4h. Porém pode ser recolhido na segunda viagem, coisa que nunca vi acontecer... Era suposto as pessoas não mudarem de autocarro mais que duas vezes, mas não me venham com tretas...

O autocarro não vinha e resolvi ir andando de paragem em paragem, na direcção do Japan Center. Quando cheguei ao AMC, eram 8h45m e não tinha passado nenhum autocarro. E digo-vos que para chegar da Van Ness até ao Japan Center, têm que se subir o Cathedral Hill... Que sem jantar é uma maravilha.

A Mafalda e a Helena Franco já tinham bilhete, a Helena Brito comprou um a uma pessoa que lá apareceu, que tinha bilhete mas não podia ir. A Gilda (a secretária do ICEP em São Francisco) e o seu marido Russo, também já tinham bilhete... Ou seja, só eu e a Mariana é que não tínhamos, e também éramos os únicos que não tinham jantado.

Eu consegui que a Helena Brito tomasse o meu lugar enquanto ia comer, e a Mariana pediu à Mafalda o mesmo. Faltavam 15m para o começo do filme. Comprámos umas fatias de pizza que levámos para dentro do cinema... Porque quando voltámos, já havia bilhetes para todos. O meu até foi de borla, porque apareceu lá um tipo que não podia ir e que ofereceu o bilhete à Helena Brito, para mim. Obrigado Helena.

Ficámos todos espalhados pela sala e em sítios esquisitos. Eu fiquei na quarta ou quinta fila, do lado esquerdo do écran, a comer a minha fatia de pizza, antes que o filme começasse. Não gosto que os outros comam, quando estou a ver um filme, e portanto não ia fazer o mesmo. O tipo ao meu lado ficou com fome, ao ver-me comer, e perguntou-me se aquelas fatias se vendiam no cinema, porque como caixa era tão pequena adaptava-se perfeitamente ao local. Desculpas!!!

Depois de uma pequena introdução à obra do João César Monteiro, feita, oralmente, por um tipo, que tinha ar de crítico e jornalista de cinema, com a típica mala a tiracolo, o filme começou.

Duas horas e meia de um verdadeiro filme português à velha moda do cinema europeu. Eu imagino o que pensarão os americanos dos portugueses depois de verem um filme em que o protagonista colecciona pelos púbicos, serve-se abundantemente de comida e nunca come, é um verdadeiro esqueleto andante e só diz disparates e canta músicas ordinárias. Lindo!!!!

Mas até me babei quando vi entrar em cena um magnífico cozido à portuguesa... E ainda fiquei pior quando o João de Deus pergunta à freira, ao servi-la "Farinheira?", ao que ela responde "Chouriço de Sangue."... O momento mais marcante de todo o filme. Para vocês parece gozo, mas a verdade é que não sei o que é nada disso há quase 4 meses.

Acerca do filme. Passados uns dias sobre isso, penso que é um filme português e que me orgulho de sabermos fazer cinema assim. Não é cinema entretenimento e longe de ser o tipo de cinema preferido dos portugueses, mas acho que me deixou muitas coisas marcadas no subconsciente e que me fez pensar bastante. Mas tem cenas que acho tristes, e que podiam não estar lá.

O filme acabou à meia-noite. O marido da Gilda estava completamente eufórico com o filme. Para ele o filme era no mínimo esquisito... Mas não era para ser assim? Aliás houve mesmo quem achasse que o filme era demasiado esquisito e abandonasse a sala logo no início do mesmo. Pronto, este cinema não é para todos, nem para todos os dias.

Depois de uma pequena conversa. Eu e as Helenas, apanhámos boleia da Mafalda, no seu fantástico mini-carro à americana com cintos de segurança voadores... Sim! Quando ela liga o carro, os cintos andam sozinhos e prendem as pessoas ao banco, automaticamente. Parece um filme de terror. Só mesmo na América.

Quando cheguei a casa da RM&P, ainda havia gente acordada a trabalhar para o ICEP. Conversei um bocadinho, comi qualquer coisa e fui dormir.



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