Segunda-feira, 27 de Março de 2000
Parece que não, mas os fins-de-semana na
Califórnia não matam mas moem. E as segundas são
dias difíceis, principalmente as primeiras horas da manhã.
Quando cheguei ao escritório decidi pôr
a máquina de café a funcionar. Não aquela
treta que faz o que se chama no Porto de café de saco, mas
a verdadeira máquina de Cimbalino, ou Bica, ou mesmo Expresso
como se chama aqui e em Itália.
Uma das coisas que mais me agrada em San Francisco
para além de não se puder fumar nos bares, discotecas
ou concertos (que me desculpem os fumadores, mas sair de um bar
ou discoteca e puder viver com a roupa que tenho vestido, é de
facto bom), é o facto de se conseguir beber bom café.
Das coisas que sempre me surpreendeu é como é que
os nuestros hermanos espanhóis conseguem beber aquela mistela
e no entanto estão tão perto de nós... E como
nós só os italianos, em termos de café.
Mas os tipos lá da empresa têm uma
máquina (Krups) de café e eu decidi tomar um verdadeiro
café. Limpei a máquina, que segundo o Jesse nunca
funcionou, e usei uma mistura de café French Roast que serve
normalmente para a outra máquina (a do café de saco).
Por aqui ninguém gosta dessa mistura, pelo que podia desperdiçar.
E assim foi... Mas a mistura estava muito grossa e o café saiu
um bocado aguado demais, mas para primeira vez...
O Ken disse ao Jesse para comprar um moinho de café,
tal foi o sucesso da coisa.
Ao fim da tarde quando voltei a casa o Singh estava
a brincar com as novas colunas que comprou para o PC do quarto.
Pelos vistos arranjou uns saldos e comprou uma Zip Drive 250M por
$100 e umas colunas com subwoofer por $40.
Pela surpresa do pessoal que cá vem a casa,
tenho notado que toda a gente imagina o Singh como um jovem indiano
que anda a estudar e que tem três empregos para ter dinheiro
para estudar... Pois bem, em parte é verdade, ele anda a
estudar e é Sikh, uma etnia do norte da Índia, do
Punjab. Mas, daí até ser um jovem que trabalha para
estudar vai uma grande distância. O Singh tem cerca de 40
anos e tem três empregos porque as suas qualificações
e capacidades não são muitas e tem que ganhar dinheiro,
não para estudar, mas para viver. Ele anda a estudar para
ver se consegue se candidatar a empregos melhores e puder ter um
negócio próprio, mas a idade não perdoa e
ele já não tem as faculdades de um jovem. Estudar
para ele é difícil e além disso não
se dedica muito à coisa. Mas gasta o dinheiro que ganha...
Mas, finalmente viu-o sorrir e perguntou-me se me
tinha divertido no FDS com os meus amigos cá em casa. Eu
disse-lhe que toda a gente se babou no sábado à noite
quando chegámos e ele estava a cozinhar um caril de galinha.
Sem esperar, estava a comer o caril de galinha feito pelo Singh
e depois vai-me ensinar como é que se faz.
O Caril como ele faz é diferente de todos
que já comi. Ele faz mesmo com as especiarias todas e não
usa aquele caril de supermercado (óbvio). Uma coisa que
me surpreendeu foi usar batata no caril. Mas digo-vos que estava
uma maravilha. Aliás enquanto vos escrevo isto ele está a
aquecer um bocado para ele e até me ofereceu, e ei pelo
cheiro estou a ver que fiz mal em não ter aceite... Mas
pronto, tenho a minha carne com massa que eu fiz ontem e que ainda
não congelei.
Terça-feira, 28 de Março de 2000
A saga da máquina de café e o expresso
começou mal cheguei ao escritório. O Jesse deu pela
minha entrada e foi-me buscar ao meu gabinete porque tinha trazido
um moinho de casa e queria que eu lhe fizesse um expresso.
A primeira moagem correu mal e moí o café demais.
Em vez de granulado o café ficou tipo pó. Resultado,
a água não saia. Mas a segunda tentativa foi um verdadeiro
sucesso, pela cara do Jesse. E nem sequer havia chávenas
de jeito e foi numas almoçadeiras pequenas que foi servido.
Eu também bebi um.
Dez minutos depois, já estava eu de novo
a trabalhar, chegou o Ben de bicicleta e perguntou-me se já havia
café. Disse-lhe que sim. Ele foi tomar banho e quando voltou
fui ajudá-lo e ensiná-lo a tirar um bom expresso,
pois no entretanto o Jesse tinha-lhe gabado o primeiro que bebeu.
Cada pessoa que passava perguntava se estávamos
a fazer um Latte, um género Cappucino mas com leite, cá para
nós, é um galão com espuma. E lá lhes
expliquei que essa era fase seguinte, quando soubesse como funcionava
o bico de vapor da máquina.
Fui chamar o Ken, que foi quem impulsionou a existência
do moinho de café e bebeu um expresso também. Toda
a gente goza, mas querem todos beber.
Eu acho piada é àqueles americanos
de gema que dizem que não vale a pena o trabalho, quando
ali ao lado vendem bom expresso. Pois mas se eu beber dois expressos
por dia a $1.20 cada um, isso dá $55 ao fim do mês...
São quase 12 contos para café por mês, até dói.
Quando lhes disse que o café em Portugal custava entre $0.25
e $0.35, eles pensaram que eu estava a gozar. Mas, para além
do dinheiro, será que estes tipos são tão
preguiçosos que não conseguem tirar prazer do que
fazem e preferem ir comprar já feito? Cromos!!!!
Às onze e meia da manhã fomos para
a varanda tirar um retrato de grupo para oferecer ao Director como
prenda de despedida. É verdade, um dos sócios fundadores
da Sense8 e agora director dos escritórios da EAI em Mill
Valley, resolveu deixar a menina dos olhos dele e ir abraçar
um cargo de chefia noutra empresa. Ele até que era um tipo
fixe, apesar de nunca ter falado muito com ele, mas até andava
de meias e tudo no escritório e jogava matrecos com o pessoal.
Já viram um director assim? Onde é que isso seria
possível em Portugal? Estou a imaginar o Samuel Fernandes
da Vouga a andar descalço e a jogar matrecos com os empregados...
Acho que fugia toda a gente.
Durante a tarde continuei a minha saga de encontrar
bugs. Já vão 52.
À noite fiz uma massa com carne maravilhosa,
bebi uma cervejinha e respondi a alguns mails.
Quarta-feira, 29 de Março de 2000
O dia começou com um belo dum expresso à maneira.
Juro que é mesmo bom. Aquela mistura French Roast não é má,
não senhora... Ou será que na falta de comparação,
ou comparando com aquela água tingida que costumo beber
qualquer coisa é melhor?
Troquei umas impressões sobre música
com o Ben e trocámos CDs. Eu emprestei-lhe uns de MP3 e
passei alguns dos dele para MP3. Já tenho mais uns dois
CDs de MP3 para queimar...
Ao fim da tarde, apareceu no meu gabinete o Ian.
Esteve a testar os meus relatórios de bugs e deu-me os parabéns
pelo trabalho feito, que continue e encontre o máximo de
bugs possíveis, pois os que eu encontrar a General Motors
não encontra. Estivemos a falar sobre trabalho e disse-lhe
que o meu trabalho é o trabalho mais porco possível,
visto do ponto de vista de quem programa, mas que alguém
tem que o fazer. É porco, porque quando eu estava a programar
também não gostava muito do gajo que lá chegava
e dizia que tinha um bug aqui ou ali. Acho que ele compreendeu
que a tirada do Ben na sexta não tinha nada a ver comigo.
Vim para casa ainda de dia. Surpreendente como os
dias estão cada vez mais compridos e mais quentes.
Cheguei a casa e pus o portátil na varanda,
de onde vos estou a escrever isto, já à luz das estrelas
e ao som de uma música meia espanholada que o Singh pôs
a pensar que eu ia gostar. Não lhe fiz a desfeita...
Está aqui comigo uma cerveja Miller Genuine
Draft e está a ficar frio, porque senão dormia aqui.
O que eu vou gozar esta varanda, com vista sobre a piscina, no
verão. Já sabem que podem vir gozá-la comigo.
Amanhã à tarde não se trabalha
e vai tudo para um BBQ (barbecue) de despedida do Tom (é assim
que o director se chama). O BBQ começa às 3h da tarde
no parque de Larkspur... Depois conto-vos os pormenores, assim
como vos mando as fotos.
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