SEXTA-FEIRA, 17 DE MARÇO DE 2000 C49
Eu ao Leme - Fotografia de Ken Pimentel

Sexta-feira, 17 de Março de 2000 (Cont.)

Não podia deixar de vos contar as minhas aventuras, enquanto elas ainda estão frescas e bem visíveis na minha memória. É engraçado, como olhando para as crónicas todas que vos escrevi parece que já passou tanto tempo desde que eu cheguei aos Estados Unidos da América. No entanto, ao mesmo tempo parece que cheguei apenas ontem e que ainda falta tanto tempo. Surpreendente a quantidade de coisas que eu hoje não me lembraria de vos contar, se voltasse a tentar escrever as crónicas dos primeiros dias... A vida era dura naquela altura. Melhorou, mas ainda não é fácil... Apesar de parecer.

Pois bem. Às 15h30m fui ver se o Ken estava pronto para irmos velejar, como tinha ficado combinado. Mas, ele estava ocupado com o Dave Hinkle. Eu não sei se já falei no Dave Hinkle, mas é a personagem mais nonsense naquela empresa. Imaginem alguém que foi deixando crescer o cabelo conforme ia ficando mais careca e com cabelos brancos. Tem um cabelo branco e volumoso pelos ombros e que nasce a partir da nuca... A testa dele vai mais ou menos até à parte de trás da cabeça. Para melhorar a imagem, tem um nariz digno de um verdadeiro judeu e tem um sotaque do Texas, ou coisa que pareça... Parece que está a mascar tabaco. Além disso é dos poucos que fuma, trabalha e tem cultura naquela empresa, apesar de ser um bocado mal educado e bruto. Eu não se estão a ver a caricatura do Albert Einstein, pois é ele, mas mais magro e de calças de ganga.

Uma hora mais tarde, o Ken, entra pelo meu gabinete a perguntar o que é que estávamos ali ainda a fazer. Ele teve a semana toda em Detroit e estava com saudades do mar.

Metemos a minha bicicleta no jipe, passámos pelo correio (ele tem um cacifo lá) e fomos comprar o jantar a um supermercado ali em Sausalito, com muito bom aspecto...

Entramos no barco às 17h e às 17h15m estávamos a sair da marina. A velocidade com que se desmontaram as cobertas e se largou de terra, esteve próxima da do recorde estabelecido com uma tripulação de 6 pessoas.

Andámos a motor e içámos as velas quando nos aproximámos da Golden Gate. Estávamos a velejar a sul direitos a San Francisco, com o vento a vir de Norte-Noroeste. Virámos à ponte, quando nos aproximámos da costa e fomos direitos ao sol que se punha no horizonte.

Eu estava ao leme e estava fixo no sol, para manter a rota... Pensei ser o Lucky Luke a cantar "I am a poor lonsome cowboy, I am a long way from home..." no fim da história...

A tarde estava fresca, mas a cerveja aqueceu um bocado. A luz laranja que inundava o céu e a baía foi apagando e a lua cheia foi impondo a sua luz. O reflexo da lua na água e as luzes da cidade à distância faziam com que este momento se tornasse único e inesquecível.

Fizemos duas voltas em frente ao Golden Gate e demos meia volta em direcção a Sausalito. O Golden Gate estava muito congestionado com barcos de mercadorias e estava a ficar tarde para quem está habituado a jantar cedo.

Parámos na marina, eram cerca das 8h da noite. Depois de arrumar tudo, deitei-me na coberta, encostado aos cabos a apreciar a lua e os reflexos na água que iam e vinham com as poucas ondas que se viam. No horizonte por detrás dos montes ainda havia claridade do sol e nos montes começavam a se ver as luzes das casas a acender com as pessoas a regressarem do trabalho. Apreciei isto com uma outra cerveja na mão e a pensar que estes tipos têm uma sorte danada...

No entretanto o Ken preparava o jantar... Eu insisti para ajudar, mas ele insistiu que não queria ajuda e ele é que é o boss.

Comemos umas costeletas de carneiro grelhadas no grelhador a gás que ele tem pendurado na borda falsa do veleiro, acompanhadas por um género de couve esquisita típica da Califórnia. A couve parece um ananás pequeno, mas verde... Sei lá, parece o fruto de um cacto. É cozido em água e depois comece o caule das folhas com maionese. A maionese é para disfarçar o sabor de certeza... Mas não é mau!!!

Ficámos ali na conversa durante quase uma hora. Ele diz que gostava de aprender português porque gosta do som "sh" e que nós o usamos muito. Estive a ver Júpiter e os seus satélites com uns binóculos potentes que ele tem e ensinei-lhe a ver como é que se encontrava a estrela do norte. É impressionante como alguém que navega, não sabe porque é que se chama bombordo e estibordo aos bordos do barco e não sabe ver onde é a estrela do norte.

Finalmente fiquei a saber que ele não é divorciado... Pior! Está a divorciar-se!!! E pelos vistos as coisas não estão a correr pelo melhor...

Ele levou-me a casa cerca das 9h30m e eu estive a ver televisão e a compilar parte das crónicas no Word... Eu escrevi quilómetros de texto!



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