17 de Setembro de 2004 O Vespertino de Reading CRÓNICA 23
Batman em buckingham - Fotografia da MSNBC

Batman e as Raposas

Neste país é-se vigiado 24/7 (para quem não sabe é assim que se diz `sempre' ou seja 24h, 7 dias por semana). Na minha rua (West St.), aqui, há várias câmaras, supostamente para manter a segurança dos transeuntes, há mesmo uma daquelas rotativas que muda cada vez que os semáforos mudam. Entra-se num qualquer prédio, loja ou café e a sigla CCTV (Closed Circuit Television) está em todas as paredes. Sirenes é uma constante. E embora não se veja muita polícia, há-os por todo o lado, à paisana.

Porém é num país ameaçado por várias fontes de terrorismo (Islão e Irlanda) e com um sistema de vigilância sempre activo que acontecem as maiores falhas de segurança dignas de um país, como se costuma dizer, de terceiro mundo. Na mesma semana um homem vestido de Batman consegue entrar no palácio de Buckingham e um grupo de jovens consegue entrar na Câmara dos Comuns e semear a desordem. Duas instituições cruciais do sistema regente britânico.

O Batman Gay (segundo foi noticiado) conseguiu inclusive ficar várias horas na fachada do edifício dando publicidade a uma causa (Fathers 4 Justice) que pretende dar mais importância aos pais na educação dos seus filhos (em casais separados). O Robin foi preso antes de conseguir entrar, mas conseguiu ajudar o Batman a fazê-lo. E o mais ridículo é que a polícia demorou horas a persuadi-lo a descer, dando- lhe sumos de fruta para ele se aguentar e não cair. Isto depois de ter deixado passar pelo sistema de segurança do Palácio de Buckingham, onde vive a família real, um homem vestido de Batman. Como se um tipo vestido de Batman fosse a coisa mais normal no palácio de Buckingham numa segunda-feira [13 de Setembro de 2004] à tarde, quando no sábado [11 de Setembro de 2004] anterior um homem vestido de Homem-Aranha fez a mesma coisa no London Eye (aquela roda gigante feita para a passagem do milénio).

O caso dos oito jovens (entre eles o filho do cantor Bryan Ferry e dois amigos do Príncipe de Gales) que entraram na Câmara dos Comuns reveste-se ainda de pormenores se calhar ainda mais graves, porque, leva a crer que, foram ajudados pela própria segurança. Isto em protesto contra a suposta abolição, por parte do governo, da tradicional caça à raposa com recurso a cães.

Ou seja, ou os seguranças já se sentam à sombra da bananeira, porque acham que está tudo sobre controlo ou afinal nada está, mesmo, sobre controlo. O país mais vigiado do mundo (Sim! Ainda mais que os EUA) está a saque. Já se fala em rever completamente os sistemas de segurança, como se falou do mesmo nos Estados Unidos após o 11 de Setembro. Se bem conheço os ingleses isso vai demorar alguns e largos anos a fazer um estudo e a pô-lo em prática.

Mas mudando de assunto, mas continuando na segurança, esta segunda- feira também, aqui em Reading um homem foi morto à pancada e ainda não se encontraram os responsáveis. Acho que já prenderam uns dois ou três homens, mas a polícia continua à procura de testemunhas. Aparentemente o homem foi encontrado inconsciente numa caixa multibanco mas, já no hospital, não resistiu aos ferimentos, sofridos na cabeça. Tudo, aparentemente, por causa de uma discussão à porta de um bar. Típico inglês, mas desta feita com um final trágico.

Mas na verdade ainda não senti nenhum problema desde que cá estou, apesar de achar que certas zonas de Reading não são muito aconselháveis, como em qualquer cidade com cerca de 150 mil habitantes, rodeada de outras cidades quase tão grandes e todas satélites de uma cidade, como Londres, com alguns 7 milhões de habitantes.

Reading é assim o meio termo entre a grande cidade e o campo. Há esquilos em pleno centro da cidade, a par com prédios. E dá para ver bem o campo cada vez que se sai da cidade e se mergulha nas redondezas. Como esta quarta-feira [15 de Setembro de 2004] que fui de novo andar de bicicleta e de novo para Whitchurch-On-Thames, que é uma típica aldeia inglesa junto ao Tamisa a menos de 10 minutos do centro de Reading.

A volta nem foi nada de especial. Os dias começam a ficar mais curtos e os caminhos já começam a ter lama (ou não estivéssemos em Inglaterra), pelo que já se acaba de noite e molhados, o que torna tudo mais desagradável. Mas foi bom! Desta vez já tinha os meus calções almofadados, capacete, luvas e as sapatilhas (SPD), tudo trazido pela Cláudia, que chegou na terça [14 de Setembro de 2004], e o capacete que foi gentilmente cedido pelo Freddy. A bicicleta e os pedais automáticos continuam a ser propriedade do Phil Baker.

Começámos junto a um pub, perto de Cray's Pond (A Poça do Cray), de seu nome Red Lion, no topo do monte mais alto que fizemos na semana passada. Assim, começámos a descer... O que implica acabar a subir, o que eu acho que não é muito aconselhável, depois de 30 quilómetros. Aqui os caminhos alternam entre floresta cerrada e campo aberto, pelo que o choque de luz é enorme, passando instantaneamente do breu ao sol contra, já a pôr-se no horizonte. Os caminhos são na maioria de pé-posto e bem preservados, porque há muita gente a usá-los quer a pé, quer de bicicleta ou para fazer deslocar o gado. Em Portugal, os presidentes da junta de freguesia já tinham na certa alargado a maioria dos caminhos e alcatroado, por causa das eleições autárquicas.

Mas a volta desta semana ficou marcada pelo voo descontrolado, sobre a barra de guiador, da Julie Teasdale. Não contente com as emoções de uma descida em mato cerrado, resolveu não levar muito a sério os conselhos do Phil e entrou num caminho com regos fundos longitudinais mais rápido que devia. Ninguém viu o tombo, mas quando ela chegou junto de nós foi fácil ver os estragos sofridos. Um dos joelhos estava mesmo mal tratado, mas com um bocado de água a coisa ficou melhor. Nada de grave. Porém isso fez com que não fizéssemos parte do caminho e voltássemos por estrada, o que é sempre mais seca. Como alguém disse "Depends how you feel, Baker" (Phil Baker, perceberam?).

No fim como de costume, uma pint no pub. Desta vez o Alex Greenhalgh não foi, porque estava de férias, mas na sua vez foi o Zoltan Finta, um húngaro, que ainda pode tornar-se num bom anfitrião em Budapeste, onde tem uma casa.

Quando cheguei a casa estava quase na hora de ir buscar a Cláudia, que foi à aula de Iyengar Yoga da Mary Niker. O sorriso dela e a vontade de fazer mais, à saída da aula, pôs-me com inveja. Eu queria mesmo era dormir. Estava estoirado e ela estava entusiasmada. Acho que para a semana que vem vou preferir ir à aula de Yoga. Se na semana passada disse que uma volta de bicicleta é melhor que meia- hora de meditação (levei um raspanete da minha Guru), esta semana fiquei com a sensação que uma hora e meia de Yoga é melhor que duas de bicicleta. Se virmos bem, ambas estão correctas, porque se uma volta de bicicleta equivale a meia-hora de meditação, uma hora e meia de yoga deve equivaler a três voltas de bicicleta. Eh! Ambas são boas...



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