DOMINGO,
4 DE JUNHO DE 2000 |
|
M1 |
|
|
A Primeira Semana na Terra das Oportunidades
ou
como viver no "melting pot"
|
Com esta crónica pretendo mostrar como foram
os primeiros dias da minha estadia no centro tecnológico
mundial. São Francisco e a zona da baía é uma
amostra do que são os Estados Unidos e do que
serão daqui a uns anos. Aqui juntam-se todas
as culturas que criaram este grande país e todas
as novas culturas que aqui vêem à procura
de uma oportunidade que não encontraram no seu
país natal.
O meu nome é Rui Gonçalves, sou Licenciado
em Engenharia Electrónica e Telecomunicações
pela Universidade de Aveiro e estou a estagiar numa
empresa de Computação Gráfica
na zona da baía de São Francisco, aqui
ao lado de Silicon Valley.
Quando o avião aterrou no aeroporto de São
Francisco a 11 de Janeiro deste ano, chovia e estava
um nevoeiro que não deixava sequer ver a baía,
pela qual a zona é conhecida. Bem vindo à a
Califórnia solarenga.
Um oficial dos serviços de emigração
de origem oriental e que nunca estaria ali se não tivessem deixado entrar no país os pais dele, do
|
|
|
mesmo modo que ele não deixa entrar
ninguém sem uma boa razão, carimbou-me o passaporte
com uma autorização de permanência em
território norte-americano até Dezembro, depois
de eu ter explicado muito bem e repetidamente quais as minhas
intenções.
|
|
Quando saí do aeroporto, apanhei uma camioneta,
conduzida por um emigrante de origem hispânica
e que mal falava inglês, para os escritórios
da empresa onde estou a estagiar. Quando ali cheguei,
por volta das 7h da tarde, encontrei apenas um mexicano
que me abriu a porta do edifício e um empregado
que me deixou depositar a mala com 38kg nas instalações.
Aqui começa-se a trabalhar muito cedo e nunca
se sai muito tarde.
Já não dormia há cerca de 24
horas e dormi num Motel, em frente à empresa,
gerido por uma senhora de origem indiana e cuja recepção
cheirava a caril. Por cerca de 10
|
|
contos dormi num dos piores albergues de que tenho memória.
|
Na segunda noite fui para a pousada
da juventude no centro da cidade de São Francisco.
No meu quarto estava um coreano que mal falava inglês,
mas, que estava a estudar em Los Angeles. Chamava-se
Yo Kun Chin mas como ninguém consegue repetir
o nome dele, diz, por aqui, que se chama John. Depois
chegou um americano da costa leste, perto de Washington
D.C. que estava ali para estudar poesia... Segundo
ele descendente do Rei João IV de Portugal e
que indirectamente é ainda membro da Casa de
Bragança e conhece o D. Duarte. Mas até tinha
alguma cultura geral e falámos de Moçambique,
da Renamo e de Portugal, de Bacalhau e dos Islandeses.
Mas o quarto
|
|
|
tinha quatro camas e na outra cama estava
um alemão que usava um alfinete-de-ama espetado na face direita, que não
falava, tinha problemas de flatulência e não
tomou banho uma vez que fosse, até ser expulso da
pousada quase uma semana depois.
|
|
No terceiro dia apanhei o ferry que
atravessa a baía partindo de Norte em direcção
a São Francisco, uma vez que o meu escritório
fica a Norte da baía. A viagem é extraordinária,
a primeira imagem turística da zona. Ao fundo
vê-se SF iluminado pelas luzes das ruas e dos
prédios. Passa-se à esquerda de Alcatraz
e à direita da Golden Gate Bridge. No ferry,
tive os primeiros contactos com os famosos gordos americanos.
O condutor era bastante gordo, e eu nem sei como é que
ele cabia na cabina do barco e um dos marinheiros,
era também do género largo baixinho e
rosnava qualquer coisa que eu não percebia,
entre duas mascadas de tabaco. Nesse ferry haviam
só mais
|
|
dois passageiros, que se faziam deslocar de bicicleta, o segundo meio de transporte
mais usado na região, mas muito atrás do carro.
|
Nessa noite falei a primeira vez com
o resto dos contacteantes que estavam na pousada e
saí pela primeira vez à noite
Bem
até tarde, porque a noite aqui acaba cedo, às
2h da manhã não se vendem mais bebidas
alcoólicas e é proibido fumar dentro
de qualquer estabelecimento.
No dia seguinte comecei a reparar nas
pessoas que andam na rua, entre a pousada e a paragem
de autocarro. Em pleno centro da cidade andava um homem
de origem oriental rua a cima, rua a baixo com um placar
a dizer "Impeach Clinton - 12 galáxias
unidas pelos interesses de um universo" ou coisa
parecida. E mais abaixo estavam dois homens brancos,
com placares à frente e trás a dizer
que "a rainha da babilónia introduziu as
orgias de drogas e álcool, junta-te a nós
na luta contra o pecado".
Ao quarto dia fui ao Wells Fargo tratar
de abrir a minha conta bancária. Foi uma senhora
de origem indiana que me atendeu e imaginem que me
mostrou uma série de cheques personalizados,
e até pude escolher o
|
|
|
desenho de fundo dos cheques.
Tudo é personalizado nesta terra, o que na maioria
das vezes torna as coisas muito difíceis de
serem escolhidas. Num café normal existem 50 tipos diferentes
de cafés e são servidos em três quantidades
distintas.
|
|
Durante o fim-de-semana, andei às
voltas pela cidade e sem me aperceber estava no bairro
homossexual da cidade. As esquinas mais homossexuais
do mundo como eles próprios gostam de apelidar,
ao cruzamento de Castro St. com a 18th St. É uma
das zonas mais agradáveis de estar e das zonas
mais limpas da cidade. Tem bastantes lojas interessantes
e está cheia de esplanadas, povoadas de gays e dykes. É uma
das coisas que uma pessoa tem que se habituar em São
Francisco, qualquer mulher é lésbica
e qualquer homem é homossexual, sem preconceitos
nem atitudes provocatórias.
Fui também a Haight St. É a
zona hippie da cidade e durante os anos 60 foi
o centro da história. Quem quiser ter um Piercing ou
fazer uma Tattoo é aqui que encontra a
maioria das lojas. Existem imensas lojas de roupa alternativa
e usada e a rua está povoada de seres que ainda
vivem o flower power.
Nesse mesmo fim-de-semana arranjei uma
casa que compartilho com um emigrante de origem indiana
e que tem três empregos. Raramente o
|
|
vejo, mas a regra número em casa é que
ninguém entra da cozinha para dentro, com os sapatos
calçados. Ele acredita que a maioria das doenças
transmitem-se pelos sapatos e eu não vou contrariá-lo.
|
No entretanto, e devido à burocracia
necessária para alugar casa, ainda estive mais
uma semana na pousada, mudei três vezes de quarto
e tive como companheiros, para além do coreano,
o americano e o alemão iniciais, dois brasileiros,
dois americanos, um japonês, o contacteante Diogo
e um ermita com quem nunca cheguei a falar. Ainda convivi
com dois franceses, um neozelandês, dois dinamarqueses,
um japonês e umas chilenas. Isto sem falar nos
americanos que lá trabalhavam.
|
|
|
Crónicas
da Califórnia: Página
I1 Col. 1
Última
Página: Página
U Col. 1
|
|