QUARTA-FEIRA, 14 DE JUNHO DE 2000 C99
Gomez Way One Way - Fotografia de Rui Gonçalves

Domingo, 4 de Junho de 2000

Acordei por volta das 9h, arrumei tudo e fui para Corte Madera, sem ver viva alma em casa da RM&P. Não sei o que me deu, mas sinceramente acho que só perdi tempo a ir a São Francisco dormir... Gostei da companhia, mas tinha tanta coisa para fazer e ainda estava em stress por causa da semana que se avizinhava.

Cheguei a casa tomei o pequeno almoço e o café, enquanto preparava as coisas para ir trabalhar para a varanda. Sentei-me na varanda com os pés num banco e refastelado no cadeirão, com o portátil ao colo e com uma músiquinha de fundo. Comecei a escrever umas crónicas para desanuviar antes de meter mãos ao trabalho temático que tenho que realizar para o ICEP, que é sobre o Turismo Ecológico. O tema foi escolhido por nós, os membros do meu grupo temático e, como é um tipo de turismo que estou especializado em praticar, até me interessa. Mas não estava com pachorra, para estar a escrever quais os benefícios provenientes e os investimentos necessários realizar, nesse tipo de turismo.

Na varanda do outro lado do complexo de apartamentos onde vivo, realizava-se uma festa em casa de uns brasileiros. Eles não sabiam que havia ali quem os percebia e falavam alto. Não diziam nada de especial, mas de vez em quando lá saltava uma asneira da grossa... E eu ria-me sozinho...

No entretanto o Singh tentava pôr o seu portátil a ligar à Internet. Eu não sei que tipo de PC é aquele e qual o hardware que ele tem, mas acho que instalar o Win98 sem saber muito bem o que se está a fazer pode trazer efeitos nefastos paralelos, como o de não se conseguir ligar à Internet. Eu bem que tentei fazer alguma coisa, mas as drives do modem não existiam e como ele nunca sabe o que faz ao software depois de instalado, tornava as coisas ainda mais difíceis... A verdade é que era melhor ver o James Bond que estava a passar na televisão e ele desligou o portátil e foi para o quarto.

Eu almocei e fiquei a tarde toda na varanda a responder ao correio electrónico que tinha pendente, escrever umas crónicas e a actualizar o meu Curriculum Vitae, com as últimas competências adquiridas em terras de Uncle Sam... Se alguém estiver interessado num trabalhador experiente e dedicado é favor pedir uma cópia para ruigo@zerozeronet.com. Estou disponível para receber propostas de trabalho.

Segunda-feira, 5 de Junho de 2000

Cheguei cedo ao escritório pois queria agarrar o touro pelos cornos o mais cedo possível. Também, tinha uma conferência telefónica marcada para as 9h da manhã e assim que cheguei fui direito ao gabinete do Ken... Que ainda não tinha chegado. Depois sou eu que chego tarde...

Fui tomar o café e pousar as minhas coisas no meu gabinete, e de repente aparece o Ken a correr para ir para a conferência... Ok! Estava à tua espera!

Uns israelitas, um americano, o chefe do Ken no quartel-general da EAI e nós os dois ali em Mill Valley. Conversa da treta!!! A verdade é que estava tudo acertado e os próprios israelitas não sabiam bem qual a definição do sistema que iam mostrar... Fiquei mais descansado, afinal não estávamos tão atrasados como pensava... Havia quem estivesse pior e tinha mais interesse na exibição do que a EAI.

Fui para a sala de exibição, onde está a melhor máquina do escritório - a Vegas - um sistema Onyx2 da Silicon Graphics com 4 processadores e uma quantidade de memória que eu nem consigo imaginar e que está ligada a um sistema de visualização composto por três monitores planos com 1mx1,5m cada, o que dá um écran com 1mx4,5m e um sistema composto por 12 detectores de presença que por enquadramento consegue determinar a presença e os movimentos do espectador e que se chama Flock of birds... Mas eu só estava ali para utilizar a máquina e para poder estar afastado da confusão, para conseguir fazer alguma coisa rapidamente.

Comecei por tentar abrir a apresentação que eu e o Ken começámos a fazer na sexta. Nada! Deva erro... Ok! Começar do zero?  Fui perguntar ao Ken, como é que era possível ter feito aquilo na sexta e na segunda já não funcionava. Segundo o Mike, a versão do VisConcept tinha mudado... Tudo estava mal em Queluz Ocidental, diria o nosso amigo Lello Marmelo!

Arranjou-se a versão anterior e voltei a tentar abrir a tal apresentação e consegui... Mas a do Ken donde era suposto eu copiar algumas coisas é que nem por isso... Novamente chatear a equipa de desenvolvimento e arranjaram-me outra versão...

Com estas e com outras tinha perdido toda a manhã e já tinha passado a hora do almoço. Fui comer qualquer coisa e tomar outro café, porque estava a adormecer em frente ao monitor.

Passei o resto da tarde a gravar as pequenas mudanças que fazia na apresentação com diferentes nomes e a sair e entrar na aplicação, porque cada vez que simulava uma apresentação perdia a composição da mesma e só a conseguia recuperar se saísse e voltasse a entrar, a velha técnica dos engenheiros de software. Se imaginarem que o VisConcept demora cerca de 2 minutos a abrir, a minha apresentação mais 2 minutos a carregar e a apresentação do Ken cerca de 5 minutos, podem ver o tempo que eu realmente trabalhei... A taxa de produtividade rondava os 40%...

Devem imaginar o meu estado de nervos às 7h da tarde quando decidi que não conseguia mais olhar aquele monitor e ir para casa...

Ainda falei com a Mary-Ann porque tinha lhe dito que fazia uns testes no World Up, mas com aqueles contratempos todos ia ser difícil. Ela ficou triste e preocupada, porque o produto era suposto ser enviado aos clientes esta semana e sem os testes de utilização, podia significar um insucesso... Bem, na verdade havia outra tipa contratada para fazer testes, mas se eu não fiz testes porque não tinha tempo, ela não os fez porque não fazia nada para além de navegar na Internet e falar ao telemóvel.

Eu não sei o nome dela, mas sei que era amiga da Christina e que foi contratada por uma semana para fazer os tais testes de utilização ao World Up. Mas, antes de ir falar com a Mary-Ann, entrei no gabinete onde ela estava e decidi ver os apontamentos que ela tinha tomado acerca dos testes e vi que ela tinha feito ainda menos do que eu. Eu apesar de estar a fazer duas coisas ao mesmo tempo, tinha percorrido o tutorial 1 e 2, onde era ensinado a usar a ferramenta para construir um modelo 3D de um carro de uma maneira tão simples, que eu fiz aquilo em duas horas de almoço... E ela só tinha feito o tutorial 1, coisa que uma criança conseguia fazer numa tarde e ela já lá estava há três dias.

Claro que fiquei pior que podre... Eu trabalho de borla e a EAI sempre me recusou qualquer ajuda e contrata uma tipa durante uma semana, se calhar a ganhar mais do que o ICEP me paga e a tipa navega na Internet... Enquanto eu me esfolo para cumprir o que me é pedido. Há pessoas sem qualquer noção de responsabilidade e há-os muitos por aqui. É só facilidades, e falta de interesses... Ou será também falta de capacidades?

Fui para casa, bebi duas cervejinhas ao jantar, liguei a televisão e vi o Star Treck e os Simpsons antes de ir dormir.

Terça-feira, 6 de Junho de 2000

Não há muito para contar acerca da Terça-feira, porque passei o dia a construir cenas para a apresentação, gravar cada mudança com diferentes nomes e a sair e entrar na aplicação... Um verdadeiro massacre cerebral, apenas compensado pelo facto de que sob stress a aprendizagem sobre a aplicação era muito superior e ao fim da tarde estava-me a sentir um verdadeiro mestre a construir comportamentos sobre modelos 3D de toda a espécie.

A meio da tarde ainda parei para dar uma de conversa com o Srikumar acerca da língua espanhola e para apertar a folga no movimento pedaleiro da bicicleta do Jesse... Esse também estava a entrar em stress... Ele está a trabalhar para o World Up e esta semana era decisiva para o sucesso do produto. Aliás, a dada altura mandou-me passear com maus modos, mas eu já nem ligo... E ele veio-me pedir desculpa.

Voltei a sair tarde. Mas não me importo de o fazer, porque não tenho nada mais para fazer e quando o trabalho é um desafio eu não me deixo derrotar facilmente. Têm a certeza que não precisam de um empregado?

Quarta-feira, 7 de Junho de 2000

Voltei a ir para o escritório no bólide e a Vaynessa nem me viu desde o início da semana... Coitada! Eu compenso-a quando o volume de trabalho diminuir e como o tempo começa a aquecer, até é mais agradável ir na minha montada para o trabalho à beira baía.

No fim do dia voltei para casa mais cedo do que tem sido normal, porque queria lavar roupa e como pensava dar um salto a São Francisco antes do fim-de-semana, receava não ter tempo para o fazer antes de ir para Los Angeles e não tinha roupa para levar.

Falava eu em o tempo aquecer? Pois bem, começou a chover quando cheguei a casa e levantou-se um cheirinho a terra molhada que me trouxe umas saudades enormes de Foz Côa. É um cheiro reconfortante e traz uma calma que só em sítios como o interior de Portugal se pode apreciar verdadeiramente o seu significado... Mas não tive muito tempo para o apreciar, porque entre duas máquinas de roupa e secar tudo, levou cerca de 2h30m... E depois veio o jantar e cama.

Quinta-feira, 8 de Junho de 2000

Acordei às 6h30m, uma hora mais cedo do que é normal, levantei-me tomei banho, fiz a barba e vesti-me. Saí de casa e estava a choviscar... Eu estava de sandálias... Mas o que é que isso interessava? Estava nos Estados Unidos e podia calçar o que eu quisesse que ninguém ia reparar nem dizer nada e além disso dentro do escritório não chove. Senti-me um verdadeiro americano de sandálias e a chover...

Cheguei ao escritório antes das 8h30m. Acho que nunca tinha chegado tão cedo.

Meti-me na sala de demonstrações numa luta desenfreada com a Vegas e o VisConcept. Consegui acabar quase tudo cerca das 5h... Só faltava uma cena que tinha receio se tornasse uma coisa difícil de fazer e fui pedir ajuda ao Ken...

Pois bem, o Ken começou a construir a cena que consistia em fazer mudar as jantes de um BMW 325i Cabriolet, de modo a poder-se visualizar o carro com diferentes opções de jantes... Tudo bem! O Ken foi-se embora cerca das 6h e eu fiquei ali a acabar a cena...

Gravei, sai e voltei a entrar na aplicação e o BMW tinha perdido um pneu... Sim! Vocês não estão a imaginar o que é um modelo 3D de um BMW ser gravado e ficar sem um PNEU! Um PNEU! Uma porra de um PNEU... 

Como a aplicação é muito flexível as únicas hipóteses eram: voltar a construir a cena toda ou voltar a inserir um pneu e colocá-lo no sítio do mesmo tamanho e tudo e rezar para que a aplicação não crashasse. Optei pela segunda hipótese... E a aplicação crashou... E não abria a última gravação que tinha feito da apresentação. O que vale é que haviam 312345 outras anteriores... E lá consegui começar a construir a cena de novo.

Às 10h da noite o Ben veio-me pedir boleia para casa. Ele tinha vindo de bicicleta, mas como estava muito escuro, ele não tinha luzes e estava muito cansado, pediu-me para o levar no bólide. Ok! Uma boa razão para deixar o trabalho que estava a correr mal. Muitas vezes é melhor recomeçá-lo no dia seguinte do que estar a massacrar o cérebro com o mesmo problema durante horas. Além disso, não tinha almoçado, mal tinha lanchado e já tinha passado a minha hora de jantar há algum tempo... A minha e a dos americanos, o que tornava difícil arranjar alguma coisa, barata, aberta.

Meti gasolina e fomos para San Rafael, onde mora o Ben. Fomos na conversa acerca da tal tipa que não fez nenhum e que nesse dia tinha passado o dia no gabinete do Ben e não o deixou fazer nada também, porque estava sempre a distraí-lo... Além disso a tipa não sabia o que era um desodorizante o que tornava a sobrevivência, no pequeno gabinete dele, quase insuportável. Disse-lhe o que pensava do facto e gozámos com o facto de alguém ter andado a pôr ambientador no gabinete do Ben...

Como temia, quando chegámos a San Rafael já estava quase tudo fechado e acabámos por ir ao mesmo sítio que tinha ido com ele, quando fomos a Napa ver a Diesel MTB World Cup. Chama-se The Broken Drum e aquela hora estava com um andamento apreciável... A música alto e um DJ a misturar umas coisas interessantes, as pessoas espalhavam-se pelo pequeno espaço entre a esplanada coberta e o interior da cervejaria, género americano... Em tons de amarelo. Não tem nada de especial, mas o ambiente estava porreiro, malta jovem na conversa e boa música. Nem parecia que estava nos Estados Unidos. Mas assim que chegou a comida caí na realidade, estava mesmo cá... Que nojo! Como é que é possível comer-se comida americana. Antes o MacDonalds...

Fui deixar o Ben a casa e ainda tive tempo de fazer inversão de marcha numa rua de sentido único... O que vale é que reparei a tempo e consegui corrigir a coisa antes de aparecer alguém... Mas quem é que anda na rua àquela hora?



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