Sábado, 1 de Abril de 2000
Apesar do acordar violento a meio da noite e da
luz da manhã, acordei muito bem disposto. Estava um dia
magnífico e não havia um minuto a perder.
Saí cedo, porque queria aproveitar o dia
para fazer algumas compras para a casa. Nada de especial, mas queria
comprar um cobertor ou coisa parecida, para ver se devolvia os
sacos-cama que ando a usar como cobertores, ao Singh.
Tomei o pequeno-almoço no Mac de Powell,
e rumei à Macy's. Não vi nada de especial, ainda
por cima eram feios e caríssimos. Desisti de procurar e
fui-me embora dali...
Telefonei à Cláudia para saber novidades
de casa e ela estava a acabar de ver o Benfica-Porto, que acho
que foi uma vergonha de um jogo de futebol, mas que deu a vitória
ao Benfica, ficando assim o caminho mais aberto para que o Sporting
seja CAMPEÃO. Não acredito que o meu Sporting vai
ser campeão ao fim de 17 anos e eu estou aqui... Eu nem vejo
futebol, mas estava capaz de ir a Alvalade ver o último
jogo.
Resolvi ir ver umas lojas de Banda Desenhada que
ficam perto da Ocean Beach, ali para os lados de Noriega com a
25ª. Digamos que é do outro lado da cidade junto ao
Pacífico. Apanhei o 71 em Market e depois de quase 40 minutos
de viagem turística pela cidade, vi o mar ao fundo da rua.
Estava uma tarde de verão. A temperatura
rondava os 30 graus centígrados, convém dizer que
estávamos nos 90 graus fahrenheit. Quando vi o mar, nem
pensei mais em banda desenhada, nem em mais nada... Saí na última
paragem antes do mar...
Entrei na praia. Estava mais fresco e havia um nevoeiro
pouco denso no ar, mas estava-se bem... Não fosse a praia
estar um bocado suja, aliás havia óleo na areia e
acho que tinha dormido um bocadinho ali deitado. Em vez disso,
meti os pés na água... Porra!!! Que a água é gelada!
Mal meti os pés na água, parecia que me comiam os
pés e não eram tubarões.
Passeei junto à água durante alguns
minutos. E veio-me bater nos pés uma concha esquisita, com
uma forma parecida com a folha de marijuana nas costas. Não
sei que seria, mas também haviam bastantes alforrecas, ou
coisas parecidas e também gelatinosas, na areia da praia.
Haviam também outros seres, também
gelatinosos, que jogavam futebol na praia e que falavam português
do brasil... Estive mesmo para dizer "Boa Tarde" quando um deles
passou a dizer asneiras alto, a pensar que ninguém o percebia.
O género de coisa que nós também fazemos,
por isso não disse nada.
Mas tive que me ir embora, porque o bilhete do autocarro
só durava mais meia hora e eu tinha combinado me encontrar
com a RM&P e a Ana em Castro para irmos beber um copo numa
esplanada.
Quando cheguei a Castro já estava a suar.
Depois de estar habituado ao fresco da praia, o calor da cidade
parecia ter aumentado um bocado.
A fauna estava no seu auge. Os meninos andavam todos
de tronco nu, a mostrarem as suas lindas tatuagens e os músculos.
Quase nenhum tem pelos! A loja de depilação a laser
lá da esquina deve facturar largo...
Tínhamos combinado à porta do teatro
de Castro, que é um dos monumentos da cidade. Tens uns azulejos
parecidos com muitos que nós em Portugal usamos nas casas
de banho antigas, com vasos e padrões geométricos.
Mas gostei de ver azulejos, porque já não via nada
assim há cerca de três meses.
É verdade esqueci-me de vos dizer que fazia
nesse dia uma semana que tinham passado dois meses desde que fui
viver com o Singh. Confusos? Peguem numa folha e numa caneta e
tentem decifrar... Se conseguirem, avisem.
Mas estar em Castro num dia de calor parado à porta
do teatro mais de 10 minutos, é engate de certeza... Todos
os meninos que passavam olhavam-me de cima a baixo e eu comecei
a ficar nervoso. Aproveitei para dar uma volta e fui comer qualquer
coisa, que não tinha almoçado e eram quase 3h da
tarde.
É impressionante ver tanto gay junto. Também
existem algumas lésbicas, mas a proporção é de
1 para 20. E a proporção de heterossexuais é de
1 para 50 homossexuais. Eu já disse que aquilo é como
ir ao jardim zoológico, mas aí existem redes e os
animais não nos atacam, nem cobiçam... Em Castro... Qualquer
macho se deve sentir comido com os olhos.
Quando voltei, já elas tinham chegado e estavam
a ficar tão nervosas como eu. A Mónica abraçou-me
como que a dar entender que nós aqui somos hetero... E fomos
ver as esquinas mais homossexuais do mundo... Castro com a 18ª... Onde
decorria a eleição do rei do Lesbians, Gay e bissexuals
Pride Parade, o maior acontecimento de rua na cidade e que acho
que é em Maio ou Junho...
Mas a vontade de fugir dali era maior que a curiosidade
e fomos para uma esplanada beber uma bebida refrescante. Castro
apesar do aparato gay é uma zona calma e é a melhor
zona de esplanadas da cidade. As esplanadas servem para os meninos
se mostrarem e para verem quem passa. Então é curioso
ver um grupo só de homens numa esplanada num primeiro andar
a ver quem passa. É que nem sequer estão bem numa
esplanada a conversar, porque estão simplesmente virados
para a rua.
Mas isso já não nos afectava... Estávamos
nós na conversa numa esplanada fresquinha a beber chá e
café gelado, onde ficámos quase o resto da tarde
toda. É tão bom não fazer nada...
A Mónica e a Ana foram-se, porque se tinham
que arranjar para ir a uma festa de russos (A Ana é meia
russa...), a Patrícia também foi à vida dela
e eu e a Rita demos mais uma voltita por ali, antes de irmos para
casa.
Quando voltávamos, o trólei à frente
do nosso avariou em plena Market e nós aproveitámos
para ir ver umas coisas numas lojas ali perto. Ela comprou uma
bola de Volley e eu um cobertor em forro polar...
Quando chegámos a casa ainda a Mónica
e a Ana lá estavam, mas por pouco tempo, porque os amigos
russos vieram-nas buscar logo a seguir.
Nós jantámos umas pizzas e as Helenas
apareceram por lá. O meu colega Ben telefonou a convidar
para aparecermos num bar em Haight com Fillmore, mas... A luz da
zona da casa delas falhou e nós estávamos no 11º andar... Ficámos
assim até cerca das 11h, na conversa à luz das velas.
Rimo-nos das histórias que nos aconteceram desde que nos
conhecemos e das primeiras impressões que tivemos daqueles
que agora convivem diariamente connosco, aqui em San Francisco.
Quando veio a luz, já era tarde (aqui) para
ir a algum lado longe, pelo que fomos tomar uma cervejinha ao bar
da rua, que já é conhecido pelo bar do Diogo, uma
vez que é ao lado de casa dele e porque é a segunda
casa dele.
Mas o sono veio depressa e fomo-nos deitar...
A Mónica chegou tarde e novamente resolveu
acordar-me só porque tinha aturado uns russos a falarem
russo a noite toda e porque nós jantámos pizza e
ela não. Invejosa. Àquela hora já o dia dos
enganos tinha acabado...
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