Sábado, 19 de Fevereiro de 2000
Acordar cedo depois de uma noite de alguns copos,
passada a ouvir o ressonar do gajo que está a dormir ao
lado e com a luz do sol a bater nas persianas logo pelas primeiras
horas da manha, é sempre doloroso. Mas apesar da pequena
dor de cabeça que se manifestava sempre que se fazia alguns
movimentos mais bruscos e ao levantar, acordar custou menos que
durante a semana quando tenho que ir trabalhar. Não sei
por quê?
Saí, com os Tiagos (Sanches e Sacchetti),
a Joana e o Nuno Moura, para ir tomar o pequeno almoço,
dar um salto a Chinatown antes de apanhar o ferry para Sausalito,
onde combinámos estar à 1h da tarde para ir andar
no barco do Ken.
Fui com o Nuno ao MacDonalds e os outros foram ao
Starbuck. Não consigo começar a manhã com
um bolo doce. Prefiro o bacon e ovos do Mac. O Mac de Powell é o
Mac mais surrealista que já vi. Come-se ao som de música
clássica e a ver quadros do Monet na parede, mas no entanto
a clientela é do mais rasca possível e imaginário,
aliás no domingo tivemos que fugir quando um homeless entrou
e se apoderou dos restos da comida de um casal que comia numa mesa
perto da nossa. Não que ele fosse perigoso, mas porque o
alemão contorsionista e mal cheiroso ao pé dele parecia
um campo de rosas.
Dali fomos a Chinatown, porque a Joana e o Tiago
Sanches queriam comprar uma máquina fotográfica digital.
Chegámos cedo, porque aqui as lojas só abrem às
10h, mas entramos na primeira loja de Chinatown, que por sinal é gerida
por mexicanos e de chinesa não tem nada. Já sabíamos
o que queríamos e o preço da máquina no mercado,
que é o que se deve fazer quando se vai a estes sítios.
O preço começou por $300, por uma Fuji MX-1200...
E com maus modos. Mas acabou nos $250 e com um sorriso quando viu
o dinheiro. Depois percebemos mais ou menos o que o fez ser antipático... É que
o tipo falava um bocado de "portunhol". Era o que dizia na montra "Se
fala portunhoul". Só acho que ele nos enganou nas memórias...
Dirigimo-nos ao Embarcadero, para apanhar o Ferry.
Os bilhetes custavam $4.80, ao contrário do autocarro que
custava $2.25, que chulice. Então resolvemos comprar uma
caderneta de bilhetes de autocarro que permite andar no ferry por
$2.25 - 20%, mas que diz explicitamente que não dá para
grupos. A tipa da bilheteira percebeu a jogada e chamou-me para
chamar a atenção para isso.
Fomos tirar uma fotos e eu fui falar novamente com
a mulher da bilheteira. Perguntei-lhe qual era a lógica
de eu pagar $1.80 com senhas pré-compradas, $2.25 no autocarro
da mesma companhia e $4.80 no ferry... Resposta dela "Life Sucks
doesn't it?" e riu-se... e diz-me a seguir para "eles" não
me verem a passar as senhas pré-compradas, de uns para os
outros. Eu ri-me e perguntei-lhe quem eram "eles", ao que ela responde
que não sabe de nada e nunca me tinha dito nada. Rimo-nos
e pagamos $1.80 quando a viagem custava $4.80... Isto em Portugal
nunca existiria. Processos tão falíveis e tão
facilmente de serem aldrabados em Portugal eram decerto alterados.
Estava um belo dia de sol e a viagem de ferry é magnifica.
Fomo-nos afastando da cidade e ela a ficar cada vez mais bonita.
Passamos junto a Alcatraz e as suas ruínas e aproximamo-nos
de Sausalito que com aquela luz se tornava ainda mais bonita. O
Tiago Sacchetti babava-se com tanta água.
Percorremos a marginal à procura de um sítio
para comer alguma coisa e comprar água para levar, para
o caso de alguém enjoar. Entramos num café com vista
sobre a baía e com o melhor café que já tomei
em terra de Uncle Sam. Em chávena de cerâmica e tudo...
Por 300$00.
Chagamos ao barco do Ken à hora certa, mas
tivemos que esperar pelo Mark, que eu não conhecia, e que
vinha navegar connosco. O Ken foi conhecendo o pessoal e apresentando-se.
O Mark chegou e saímos da marina por volta da 1h30m.
O barco do Ken é um Hunter
40.5, qualquer coisa como 12 metros de barco. Não
sei quanto custou, mas vimos na marina um Hunter 45 por 3200
contos... E o Ken diz que é possível arranjar bons
barcos até por 1000 contos. Até dá dó ser
teso.
Saímos da baía de Sausalito em direcção
a Golden Gate, que apesar de ser o nome pelo qual se conhece a
ponte é o nome da garganta de entrada da baía. Subimos
as velas e desligamos os motores. O vento encheu as velas, mas
foi por pouco tempo. Ficámos parados debaixo da GG bridge à espera
que o vento soprasse, mas a maré levava-nos para o mar sem
vento e decidiu-se ir para a baía a motor. Despejamos todas
as fotografias possíveis e imaginárias enquanto estavámos
debaixo da ponte. Logo mando-vos algumas.
Passámos por focas e patos. Explicámos
ao Ken e ao Mark, porque é que estávamos sempre a
dizer 'Mãe da foca' e que não era asneira, era português.
Andámos a motor para aí uma hora. Fomos ver os clubes
de vela que têm barcos no America's Cup na Nova Zelândia
e que são dois daqui de S. Francisco, mais propriamente
em Tiburon. Eu estive deslumbrado, sentado na proa do barco ao
aproximarmo-nos dos desfiladeiros de Tiburon, onde vivem os ricos
cá do sítio e onde uma casa pode facilmente atingir
os 400 mil contos. O Ken disse que se trabalhar a vida toda pode
ser que ainda consiga vir a limpar os vidros daquelas casas. Nós,
tesos, nem isso. Mas a paz de estar ali na proa do barco compensava...
Quando chegámos à marina eram 4h e às
4h30m fomos apanhar o ferry de volta para SF, para ir ver o Desfile
do Ano Novo Chinês, que começava às 17h30m.
Despedimo-nos do Mark e do Ken e fomos avisados que desta vez passávamos
que para a próxima tínhamos que trazer umas cervejitas...
Ele percebeu que nos estávamos um bocado ressacados... E
que não sabíamos muito bem do costume.
Encontramo-nos com o resto do pessoal em SF e fomos
ver o desfile, que de chinês tem muito pouco. Começou
com a organização nos seus descapotáveis a
passearem e a atirarem rebuçados para a assistência,
depois vieram os bombeiros, depois a polícia, depois a guarda
de não sei o que, e depois os escuteiros e por fim o primeiro
dragão. Ao fim de 2h ainda o desfile ia a meio. Desfila
toda a gente da cidade, desde a banda filarmónica dos Gays
e Lésbicas até aos estudantes da escola de circo,
ou coisa parecida, que foi o melhor momento do desfile. Quando
já nos vínhamos embora para casa e nos perdemos todos
uns dos outros, eu fiquei sozinho com a Mónica. A um dado
momento, os tipos pararam em frente ao sítio em que estávamos
e começaram a tocar. Espectacular, um ritmo de tambores
quase africano e os saxofones em uníssono.
Cheguei a casa da RM&P quase às 20h,
quando o concerto dos Gomez começava às 21h. Comi
qualquer coisa, troquei de t-shirt e corremos para o The Fillmore.
Eu, o Tiago Sacchetti e o Diogo.
Perdido por cem, perdido por mil. Decidimos ir jantar
qualquer coisa já que estávamos atrasados. Por sorte
aqui os tipos quando marcam a hora é da primeira parte.
Entrámos e fomos carimbados, com um "Over
21" na mão para que pudéssemos beber álcool.
Os Sumack que faziam a primeira parte estavam a actuar, mas nós
estávamos mais interessados numa cervejita e em apreciar
a sala e o ambiente. Nunca vi um ambiente tão porreiro como
aquele, desde que cá estou. Chineses eram para aí dois,
mexicanos só o que me carimbou a mão e finalmente
algumas raparigas interessantes que alegrem a vista do pessoal.
Os Gomez entraram 'as 10h30m, a sala já estava
composta e o público estava a curtir. A teoria de que não
se pode fumar em bares e recintos fechados na Califórnia,
deve só ser aplicada a tabaco, porque o cheiro a erva era
por todo o lado. Os tipos fumam de cachimbo e nunca deixam a chama
acender, pelo que não se nota quem é que está a
fumar, mas só quem é otário é que não
vê.
O concerto durou 1h50m, e acabou com uma versão á-lá Stone
Roses do "78 Stone Wobble", fabulosa... Que pôs o resto do
pessoal aos saltos. A sala é pequena pelo que eu no fim
estava a três filas do palco, muito facilmente. O concerto
estava a ser gravado para a Virgin Records, pelo que até pode
ser editado em vídeo. Aliás na entrada havia um papel
que dizia que o facto de entrarmos ali estávamos a dar autorização à Virgin
de usar a nossa imagem para lucro próprio.
Mas os melhores momentos do concerto, foi a primeira
música do primeiro encore - Tijuana Lady - e a última
do concerto - Whippin' Piccadilly - que foram cantadas pelo público.
Eles tocaram duas faixas novas, uma delas meia espanholada.
Saímos quase à 1h da manha e como
o autocarro nunca mais vinha fomos a pé. Quando chegámos
a casa tínhamos um bilhete a dizer que o resto do pessoal
tinha ido a uma festa particular... Mas como não sabíamos
a que horas nem quando acabava, e como por aqui 1h30m já é tarde,
decidimos não ir.
Adormeci com o baloiçar do barco na cabeça...
E cansadíssimo, depois de um dia em cheio e a correr...
Até que fui acordado às 4h e às 4h30m quando
o resto do pessoal chegou da tal festa particular.
Pelos vistos tinha sido porreira, tal era o estado
de alguns... E se no dia anterior éramos muitos, neste éramos
mais e, menos ordenados espalhados pela sala, corredor e até no
hall dormiu gente.
|